Subsecretário de Segurança Pública do Distrito Federal alegou se tratar de ato “pacífico”
Novo fato reafirma a responsabilidade do ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Anderson Torres, em relação aos fatos ocorridos dia 8 de janeiro, na Praça dos Três Poderes, quando apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tentaram dar golpe de Estado.
Reunião realizada na véspera do 8 de janeiro, entre o diretor-geral da PF (Polícia Federal), Andrei Passos, e o então secretário adjunto de Segurança Pública do Distrito Federal, Fernando de Souza Oliveira, poderia ter evitado a invasão e a depredação das sedes dos Três Poderes.
Nessas alturas, Torres estava se preparando para tirar férias nos Estados Unidos, em Orlando, onde o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) já se encontrava. O ex-presidente viajou dia 30 de dezembro para não participar da cerimônia de posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
RELATÓRIOS COMPROVAVAM TEOR GOLPISTA DOS ATOS
O alto escalão da PF pediu ao GDF (governo do Distrito Federal) para impedir que a manifestação de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro ocorresse na Esplanada dos Ministérios.
Os agentes federais dispunham de relatórios que comprovavam o teor golpista dos atos e a escala que a mobilização tomou nos dias que antecederam o ataque. O apelo, no entanto, acabou recusado pelo secretário Fernando de Souza Oliveira, que alegou se tratar de ato “pacífico”.
Os detalhes do encontro estão descritos num documento enviado pela Direção-Geral da PF à CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) dos Atos Golpistas de 8 de Janeiro, no Congresso Nacional.
O relatório informa que também participaram da audiência na véspera dos atentados golpistas a coronel da Polícia Militar, Cíntia Queiroz, o coordenador de contrainteligência da PF, Thiago Severo, e o então chefe do COT (Comando de Operações Táticas). O ofício que reconstitui a reunião é assinado pelo delegado Luiz Eduardo Navajas, que atua como chefe de gabinete de Andrei Passos.
MOVIMENTO DE CONTESTAÇÃO DA ELEIÇÃO
Na reunião, Andrei Passos manifestou preocupação com “o deslocamento de pessoas para Brasília” para participar de atos no dia seguinte “objetivando ocupar a Esplanada dos Ministérios e contestar o resultado das urnas eleitorais”.
Em outro documento enviado à CPMI, a PRF (Polícia Rodoviária Federal) informou que até o dia 7 de janeiro já haviam chegado 40 ônibus ao QG (Quartel-General) do Exército na capital federal e outros 105 veículos fretados, com 3.951 passageiras, estavam a caminho.
De acordo com a PF, o diretor-geral Andrei Passos “destacou na ocasião, o elevado grau de ameaça à segurança e solicitou providências visando o isolamento da Esplanada dos Ministérios de modo a impedir a aproximação daquelas pessoas que se mostravam, pelas redes sociais, inconformadas com os resultados das eleições presidenciais”.
SINAIS ERAM NÍTIDOS
O diretor-geral também apontou que a organização das manifestações e o teor golpista das manifestações nas redes digitais foram amplamente divulgados nas plataformas. A SSP (Secretaria de Segurança Pública) do DF, por sua vez, disse que estava ciente e que havia “se planejado adequadamente para manter a segurança diante do evento anunciado”.
O documento ainda narra embate de percepções a respeito do que se tratava os atos convocados para o dia 8 de janeiro. A PF argumentou que “aquela movimentação seria, em tese, por si só um ato criminoso, pois atentaria contra o Estado Democrático de Direito, conforme legislação de regência”.
Na ocasião, a Secretaria alegou “que se trataria de uma simples manifestação de cunho pacífico”. Ledo engano ou autoengano.
PF APONTOU “CENÁRIO CRÍTICO”
Sem acordo satisfatório com o governo do DF, Andrei Passou determinou que fosse encaminhado ao ministro da Justiça, Flávio Dino, ofício com o relato do “cenário crítico que se apresentava e dos possíveis acontecimentos que poderiam advir”.
O diretor-geral da PF sugeriu a Dino que fosse realizada nova reunião com a Secretaria de Segurança Pública para que “o trânsito desses veículos seja impedido para evitar maiores incidentes e atos de vandalismo, como os ocorridos em 12/12/2022″, quando vândalos tentaram invadir a sede da PF em Brasília e cometeram diversos atos de terrorismo após a diplomação do presidente Lula pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
“O objetivo dessas pessoas seria reunir na capital federal grande quantidade de manifestantes que, dentre outras ações, teriam a intenção de “tomar o poder”, de “impedir a instalação do comunismo no Brasil”, sem determinarem, especificamente, quais ações adotariam ao chegar a esta capital federal para atingirem o seu intento”, está escrito no documento enviado pelo diretor-geral da PF a Dino.
“Pelas informações coletadas até o momento, o grupo pretende promover ações hostis e danos contra os prédios dos ministérios, do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto, do Supremo Tribunal Federal”, prosseguiu. Dia 7 de janeiro, Dino publicou no Twitter que conversou com o governado do DF, Ibaneis Rocha.
FECHAMENTO DA ESPLANADA
Em outro documento assinado dia 6 de janeiro, a coronel Cíntia Queiroz, da PMDF (Polícia Militar do Distrito Federal), então subsecretaria de Operações Integradas, responsável pelo planejamento da segurança dos atos, afirma que a Esplanada poderia ser fechada “mediante acionamento da SSP”.
Por ação ou omissão, então, tudo convergiu para o desfecho do 8 de janeiro.
Procurada, a SSP-DF (Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal) disse que “todos os fatos relacionados à operação do dia 8 de janeiro de 2023 estão em processo de apuração”. “A SSP informa, ainda, que não comenta investigações em curso”, concluiu.