“O que posso dizer aqui é que confirmei integralmente o conteúdo da entrevista que dei no domingo à Folha de S. Paulo, com outros detalhes, e entregando minhas provas”, afirmou o empresário na saída da audiência
O segundo depoimento do empresário Paulo Marinho foi mais detalhado, segundo declarou o depoente.
O empresário, ex-aliado de Bolsonaro, desta vez prestou depoimento ao Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, na quinta-feira (21).
Aqui teve “riqueza de detalhes maior porque a investigação aqui (no MPF) é mais ampla (do que a da PF)”, disse Paulo Marinho. Ele denunciou, em entrevista à Folha de S. Paulo, que houve um vazamento de um delegado para Flávio Bolsonaro na Operação Furna da Onça, da Polícia Federal.
Marinho falou durante quase 3 horas e deu algumas informações na saída da audiência. “Estive aqui, convocado para depor, repeti meu depoimento de ontem (quarta). Talvez com riqueza de detalhes maior porque a investigação aqui (no MPF) é mais ampla (do que a da PF). Trouxe provas, deixei as provas nas mãos do procurador e ele me recomendou (…) que não declarasse ou divulgasse o teor do meu depoimento aqui. O que posso dizer aqui é que confirmei integralmente o conteúdo da entrevista que dei no domingo à Folha de S. Paulo, com outros detalhes, e entregando minhas provas”, afirmou.
O empresário já havia informado às autoridades que começou a receber ameaças de morte depois que fez as denúncias das atividades ilícitas de Flávio Bolsonaro. Agora ele fala sobre uma devassa que está sofrendo por parte de “pessoas poderosas de Brasília”, o que reforça as suspeitas de que Bolsonaro fez mudanças em órgãos de fiscalização tributária e financeira, assim como tentou fazer na PF, para ter controle da vida alheia, proteger amigos e familiares e perseguir adversários políticos. Marinho se disse surpreso com a informação da devassa e pediu que o caso seja investigado.
“A questão que me deixou mais perplexo foi a notícia que li hoje de manhã num site prestigioso que informa que estão sendo feitas devassas nas minhas contas pessoais por pessoas poderosas de Brasília. Por conta dessa notícia, aproveitei o depoimento que dei agora e solicitei ao procurador que tomasse as medidas devidas em relação a essa notícia e apurasse a veracidade”, informou Paulo Marinho.
O coordenador do Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial do MPF, Eduardo Benones, declarou que o depoimento foi “produtivo” e ainda vai analisar se outras pessoas serão ouvidas. “Vamos aprofundar as investigações. No mínimo, temos razão para crer que os fatos merecem ser investigados”, disse.
O empresário entregou documentos tanto à Polícia Federal quanto ao Ministério Público que, segundo ele, comprovam suas declarações à Folha de S. Paulo no último fim de semana.
HISTÓRICO
Segundo Marinho, o advogado de Flávio, Victor Granado Alves, participou do encontro com o delegado que vazou as informações sigilosas da operação Furna da Onça.
O encontro entre Granado e o delegado aconteceu na porta da Superintendência da PF, no Rio de Janeiro, uma semana depois do primeiro turno da eleição de 2018. Flávio procurou Marinho na época para, segundo o empresário, pedir ajuda. Neste momento, Flávio foi orientado a afastar Queiroz de seu gabinete e sua filha do gabinete do então deputado federal Jair Bolsonaro. Os dois foram exonerados.
Queiroz comandava um esquema de lavagem de dinheiro no gabinete, envolvendo funcionários fantasmas que devolviam parte de seus salários para um caixa do então deputado, sob os cuidados do ex-assessor de Flávio. O Coaf detectou que na conta de Queiroz circulou R$ 1,2 milhão em dois anos e R$ 7 milhões em três anos.
Os investigadores descobriram também que, quando estourou o escândalo no gabinete de Flávio, Queiroz se comunicou com Danielle Nóbrega, ex-esposa do miliciano Adriano da Nóbrega, que, junto com a mãe do miliciano, Raimunda Veras, estava lotada no gabinete do deputado e repassava parte do salário para o gabinete e outra parte para Adriano. O pistoleiro, que chefiava o Escritório do Crime, central de assassinatos da milícia do Rio, foi morto recentemente em uma operação policial na Bahia.
Apesar de Flávio ter desmentido o empresário, o advogado Victor Alves admitiu que participou de uma reunião com Flávio e Paulo Marinho na residência deste, mas alegou que estava ali na condição de advogado e que, por isso, tinha direito ao sigilo profissional. Victor Alves é ligado a Flávio Bolsonaro há muitos anos.
Ele é citado no relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que apontou movimentações suspeitas dele e do gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro. Entre os negócios suspeitos que o advogado é investigado há duas lojas de chocolate que pertencem à mesma franquia do senador. Victor foi advogado da loja de chocolate de Flávio que é investigada por lavagem de dinheiro.
O PSL nacional, a pedido de Flávio Bolsonaro, contratou o escritório de Victor Granado Alves. O contrato durou 13 meses e meio e custou R$ 500 mil, com recursos pagos por meio do fundo partidário. As notas fiscais da prestação de contas do PSL em 2019 apontam que o escritório Granado Advogados Associados, que tem Victor entre os sócios, foi contratado com recursos públicos para atuar na prestação de serviços jurídicos ao escritório da legenda no Rio. O escritório foi pago com recursos do fundo partidário.
Coincidentemente o escritório era comandado por Flávio Bolsonaro. Na quarta-feira (20) a direção nacional do PSL afirmou que o escritório foi contratado para regularizar os diretórios do partido mas não prestou o serviço. A direção do PSL vai pedir que Flávio devolva o dinheiro desviado.
O empresário Paulo Marinho saiu do depoimento e disse que não podia dizer nada sobre o que foi discutido com os investigadores porque o inquérito está em segredo de Justiça e também porque pode atrapalhar as investigações. O depoimento foi acompanhado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro que também investiga possíveis vazamentos que teriam ocorrido na Operação Furna da Onça e também vai ouvir o empresário nesta quinta-feira (21).
As denúncias de Paulo Marinho reforçam as informações que foram dadas pelo ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, de que Jair Bolsonaro tinha planos de interferir politicamente e controlar a Polícia Federal. Ele demitiu o ministro porque queria colocar na direção-geral da PF o delegado Alexandre Ramagem, atual chefe da Abin.
Ramagem já se movimentava nos bastidores da PF como se fosse o diretor-geral. Foi ele quem sondou o delegado Alexandre Saraiva, superintendente da PF no Amazonas, para assumir a direção da PF no Rio, segundo informou Saraiva em seu depoimento. Foi ele também quem convidou o delegado Carlos Henrique Oliveira, que era superintendente da PF no Rio, para assumir a diretoria executiva da PF. O objetivo era trocar a direção da PF no Rio, como queria Bolsonaro.
Alexandre Ramagem conheceu Bolsonaro e seus filhos durante a campanha eleitoral. Assumiu a chefia da segurança do então candidato a presidente. Depois de eleito, Bolsonaro levou Ramagem para uma assessoria no Palácio do Planalto. Nesta época, Carlos Bolsonaro chegou a anunciar, segundo o ex-ministro Gustavo Bebianno, que iria criar uma espécie de Abin paralela porque não confiava no órgão oficial do governo.
Barrado por Bebianno e pelo general Santos Cruz, Carlos Bolsonaro, que disse já ter o nome do delegado que assumiria a “Abin paralela”, foi obrigado a desistir momentaneamente da ideia. Logo depois que Santos Cruz e Babianno foram afastados do governo, Bolsonaro nomeou Ramagem para a direção da Abin.
Ramagem foi o delegado responsável pela Operação Cadeia Velha, que investigou esquema de propinas de deputados estaduais no Rio de Janeiro e antecedeu a Operação Furna da Onça. Durante a Operação Furna da Onça, o Coaf, órgão de inteligência financeira, detectou as operações financeiras suspeitas de Fabrício Queiroz.
Algum delegado que conhecia bem a investigação e sabia da existência do relatório do Coaf vazou a realização da operação Furna da Onça para Flávio Bolsonaro.