Depoimento foi determinado pela Justiça, para que ministro da Educação de Bolsonaro explique o que queria dizer com: “Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF“
O ministro da Justiça, André Mendonça, anunciou na quinta-feira, 28/05, que o governo entrou com habeas corpus preventivo, para impedir que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, seja ouvido pela Polícia Federal (PF).
O depoimento de Weintraub foi determinado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), para que o ministro explique a sua atuação na reunião do Ministério com Bolsonaro, no dia 22 de abril, no Palácio do Planalto.
Nessa reunião, Weintraub, quando o ministro da Casa Civil, Braga Netto, lhe passou a palavra para debater o plano econômico Pró-Brasil, disse o seguinte: “Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF”.
A reunião era para discutir o Programa elaborado pela equipe do ministro Braga Netto, uma proposta de política econômica para enfrentar a gravíssima e desastrosa situação atual – inclusive, levando em conta a pandemia de COVID-19.
Entretanto, disse Weintraub, “[o povo] não tá gritando pra ter mais Estado, pra ter mais projetos, pra ter mais… o povo tá gritando por liberdade, ponto. (…) Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF”.
Weintraub, portanto, propôs que, em nome da liberdade, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), máxima instância do Poder Judiciário e guardião das garantias constitucionais, fossem colocados na cadeia.
Ainda, segundo sua opinião, os 11 ministros do STF são – ou fazem parte de – um bando de “vagabundos”.
Por esta razão, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, relator do Inquérito 4.781, determinou que a Polícia Federal ouvisse Weintraub sobre suas declarações de que “por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF”.
DELINQUÊNCIA
Segundo a decisão do ministro Alexandre de Moraes, “a manifestação do Ministro da Educação revela-se gravíssima, pois, não só atinge a honorabilidade e constituiu ameaça ilegal à segurança dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, como também reveste-se de claro intuito de lesar a independência do Poder Judiciário e a manutenção do Estado de Direito”.
“Há, portanto”, escreveu o ministro Alexandre de Moraes, “indícios da prática dos delitos tipificáveis nos arts. 139 [crime de difamação] e 140 [crime de injúria] do Código Penal, bem como nos arts. 18, 22, 23 e 26 da Lei 7.170/1983”.
Os artigos da Lei 7.170/1983 (que define os crimes contra a Segurança Nacional) citados pelo ministro Alexandre Moraes, dizem respeito a:
– “tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados” (artigo 18; pena: reclusão de 2 a 6 anos).
– “fazer, em público, propaganda: I – de processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social; II – de discriminação racial, de luta pela violência entre as classes sociais, de perseguição religiosa; III – de guerra; IV – de qualquer dos crimes previstos nesta Lei” (art. 22; pena: detenção de 1 a 4 anos).
– “Incitar: I – à subversão da ordem política ou social; II – à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis; III – à luta com violência entre as classes sociais; IV – à prática de qualquer dos crimes previstos nesta Lei” (art. 23; pena: reclusão de 1 a 4 anos).
– “Caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação” (art. 26; pena: reclusão de 1 a 4 anos).
LITURGIA DO CARGO
Porém, segundo escreveu o ministro da Justiça de Bolsonaro – para variar, em uma “rede social” -, anunciando que o governo entrou com pedido de habeas corpus preventivo para proteger Weintraub, as declarações do último “não têm relação com o objeto do inquérito” do qual o ministro Alexandre de Moraes é relator.
Alexandre de Moraes é relator do inquérito que apura as injúrias, difamações e calúnias contra o Supremo Tribunal Federal (STF) através de “fake news”.
Então, vejamos a parte da reunião ministerial com Bolsonaro, em que Weintraub fez as suas considerações dissociativas (colocar o Supremo na cadeia em nome da liberdade, é coisa que não ocorreria a alguém com mais de dois neurônios) sobre a Justiça e o trabalho (“vagabundos”, diz esse produtivíssimo elemento…).
Os leitores que preferirem, podem ver o vídeo desta parte da reunião ministerial, no site do STF.
Mas vamos à transcrição, realizada pelos peritos da Polícia Federal.
MINISTRO BRAGA NETTO: Penúltimo debatedor, ministro Weintraub.
ABRAHAM WEINTRAUB: Obrigado. Tem três anos que eu…
MINISTRO BRAGA NETTO: Fui claro no penúltimo, hein? (Risos).
ABRAHAM WEINTRAUB: Muito obrigado.
ABRAHAM WEINTRAUB: Tem três anos que, através do Onyx [Lorenzoni] , eu conheci o presidente. Nesses três anos eu não pedi uma única conselho (sic), não tentei promover minha carreira. Me ferrei, na física. Ameaça de morte na universidade. E o que me fez, naquele momento, embarcar junto era a luta pela… pela liberdade. Eu não quero ser escravo nesse país. E acabar com essa porcaria que é Brasília. Isso daqui é um cancro de corrupção, de privilégio. Eu tinha uma visão extremamente negativa de Brasília. Brasília é muito pior do que eu podia imaginar. As pessoas aqui perdem a percepção, a empatia, a relação com o povo. Se sentem inexpugnáveis. Eu tive o privilégio de ver a… a mais da metade aqui desse time chegar. Eu fui secretário-executivo do ministro Onyx. Eu acho que a gente tá perdendo um pouco desse espírito. A gente tá perdendo a luta pela liberdade. É isso que o povo tá gritando. Não tá gritando pra ter mais Estado, pra ter mais projetos, pra ter mais… o povo tá gritando por liberdade, ponto. Eu acho que é isso que a gente tá perdendo, tá perdendo mesmo. A ge… o povo tá querendo ver o que me trouxe até aqui.
ABRAHAM WEINTRAUB: Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF. E é isso que me choca. Era só isso presidente, eu… eu… realmente acho que toda essa discussão de “vamos fazer isso”, “vamos fazer aquilo”, ouvi muitos ministros que vi… chegaram, foram embora. Eu percebo que tem muita gente com agenda própria. Eu percebo que tem, assim, tem o jogo que é jogado aqui, mas eu não vim pra jogar o jogo. Eu vim aqui pra lutar. E eu luto e me ferro. Eu tô com um monte de processo aqui no comitê de ética da presidência. Eu sou o único que levou processo aqui. Isso é um absurdo o que tá acontecendo aqui no Brasil. A gente tá conversando com quem a gente tinha que lutar. A gente não tá sendo duro o bastante contra os privilégios, com o tamanho do Estado e é o… eu realmente tô aqui, de peito aberto, como cês sabem disso, levo tiro… odeia … odeio o partido comunista.
ABRAHAM WEINTRAUB: Ele tá querendo transformar a gente numa colônia. Esse país não é… odeio o termo “povos indígenas”, odeio esse termo. Odeio. O “povo cigano”. Só tem um povo nesse país. Quer, quer. Não quer, sai de ré. É povo brasileiro, só tem um povo. Pode ser preto, pode ser branco, pode ser japonês, pode ser descendente de índio, mas tem que ser brasileiro, pô! Acabar com esse negócio de povos e privilégios. Só pode ter um povo, não pode ter ministro que acha que é melhor do que o povo. Do que o cidadão. Isso é um absurdo, a gente chegou até aqui. O senhor levou uma facada na barriga. Fez mais do que eu, levou uma facada. Mas eu também tô levando bordoada e tô correndo risco. E fico escutando esse monte de gente defendendo privilégio, teta. Tendeu? É isso. Negócio. Empréstimos. A gente veio aqui pra acabar com tudo isso, não pra manter essa estrutura. E esse é o meu sentimento extremamente chateado que eu tô vendo essa oportunidade se perder.
ABRAHAM WEINTRAUB: Eu sou, evidentemente, eu tô no grupo dos ministros que tá mais ligado com a militância. Evidente, porque eu era um militante. Eu tava militando de peito aberto, continuo militando. Do ponto de vista de carreira, eu poderia ter quem… tentando me dar bem. Não foi isso que eu fiz. Não foi isso que eu fiz. Sei que isso daqui é um palácio, existem intrigas palacianas – estou sendo muito franco. E a gente pode sim perder a liberdade, perder esse país. Ninguém vai se dar bem se a gente perder esse país. Quem vai se dar bem são poucos, pouquíssimas famílias. Pouquíssimas famílias. Não se iludam. Não se iludam. Era isso.
Weintraub nunca foi militante de coisa alguma – uma vez que, tirar zero na prova (e prova de faculdade), engordar o currículo acadêmico com a publicação duas vezes do mesmo artigo, como se fossem dois artigos diferentes, ou, ainda, despejar rancor, imitando ou puxando o saco de um candidato a Rasputin de bordel, que nem mora no Brasil, não é, e nunca foi, militância.
Difamar os militares, desde o marechal Deodoro (“um traidor”, segundo Weintraub) até os que participavam da reunião com Bolsonaro (“eu… eu… realmente acho que toda essa discussão de ‘vamos fazer isso’, ‘vamos fazer aquilo’, ouvi muitos ministros que vi… chegaram, foram embora. Eu percebo que tem muita gente com agenda própria. Eu percebo que tem, assim, tem o jogo que é jogado aqui, mas eu não vim pra jogar o jogo”), também não é, e nunca foi, militância.
Mas, Bolsonaro, na reunião, apoiou Weintraub. E imediatamente:
JAIR BOLSONARO: Deixa eu complementar aqui. O que o Weintraub tá falando – eu tô com sessenta e cinco anos – a gente vai se aproximando de quem não deve. Eu já tenho que me policiar no tocante a isso daí. São pessoas aqui em Brasília, dos três poderes, que não sabem o que é povo. Eu converso com alguns, não sabe o que é o feijão com arroz, não sabe o que é um supermercado. Esqueceu. Acha que o dinheiro cai do céu. “Eu tô com os meus privilégios garantidos, meus cem mil por mês”, em média, cem mil por mês que essa galera ganha, né? Legalmente. E acha que isso não vai acabar nunca. Como alguns acham que a liberdade a … a … qua .. . “qual é desse cara, tá maluco?”. Eu tô vendo o mais antigo aqui, o General Heleno aqui. Ele sabe o que é meia, o que foi meia quatro. Muitos aqui não sabem. Essa cambada que tentou chegar no poder em meia quatro, se… se tivesse chegado, a gente tava fodido todo mundo aqui. Cortando… ia tá felicíssimo se tivesse cortando cana, ganhando vinte dólar por mês. Não pode esquecer disso. Nós não podemos esquecer o que é esse povo. Eu vou convidar os ministros pra domingo ir passar na Ceilândia e Taguatinga.
JAIR BOLSONARO: É convite, não é … não é missão não. Convite. Pra ver como é que tá o cara na … na … na esquina. Pra vir uns merda pra falar aí, né? Uns merda de sempre. “A, o cara rompeu o isolamento. Tá dando um péssimo exemplo.”. Tá… péssimo exemplo é o cacete, pô! Pior é tá passando fome! Tá na merda, porra! Sentir o cheiro de povo, como eu falei, lá. É uma experiência pra todo político sentir! Ir lá ver como é que tá o negócio. Ou a gente tem que tá, como se fosse, né, ô? Um general na … na retaguarda e deixar a tropa se ferrar na frente. Não! O general tá, tá na frente, o coronel tá na frente, o capitão tá na frente. Nossos heróis da segunda guerra mundial tiveram na frente de campo de batalha. Se precisar que, tenho certeza, nossas forças armadas vão cumprir com seu papel, mas, né? Nós temos que dar exemplo e mostrar que o Brasil não é – eu sou mais educado que o Weintraub, até me poli muito, né? No linguajar que ele usou – mas não é isso que o pessoal pinta por aí. Se reunindo de madrugada, pra lá, pra cá. Sistemas de infomações: o meu funciona.
Bolsonaro não parece ter aprendido qual a função de um general em um campo de batalha. Confunde essa função com a de chefe de gangue ou de milícia (“Um general na … na retaguarda e deixar a tropa se ferrar na frente. Não! O general tá, tá na frente“).
Deve ser por isso que nunca passou de capitão – e talvez tenha sido até demais, para tanta incapacidade militar.
JAIR BOLSONARO: O meu particular funciona. Os ofi… que tem oficialmente, desinforma. E voltando ao … ao tema: prefiro não ter informação do que ser desinformado por sistema de informações que eu tenho. Então, pessoal, muitos vão poder sair do Brasil, mas não quero sair e ver a minha a irmã de Eldorado, outra de Cajati, o coitado do meu irmão capitão do Exército de … de … de … lá de Miracatu se foder, porra! Como é perseguido o tempo todo. Aí a bosta da Folha de São Paulo, diz que meu irmão foi expulso dum açougue em Registro, que tava comprando carne sem máscara. Comprovou no papel, tava em São Paulo esse dia. O dono do … do restaurante do … do pa … de … do açougue falou que ele não tava lá. E fica por isso mesmo. Eu sei que é problema dele, né? Mas é a putaria o tempo todo pra me atingir, mexendo com a minha família. Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmente, e não consegui! E isso acabou. Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira”.
A reunião era para tratar do Programa Pró-Brasil, o plano econômico do ministro Braga Netto.
Tornou-se a prova de que Bolsonaro tentava interferir na PF para acobertar os crimes de filhos e aprochegados.
Agora, o governo, com o pedido de habeas corpus preventivo, tenta acobertar Weintraub.
Mas, com isso, Bolsonaro apenas confirma que ele e Weintraub são a mesma coisa.
Aliás, segundo disse (ver acima), Bolsonaro é um Weintraub mais educado…
CARLOS LOPES