O relatório da Medida Provisória (MP) 927 apresentado pelo deputado Celso Maldaner (MDB/SC), que altera pontos da legislação trabalhista, foi repudiado por diversas entidades representativas dos trabalhadores.
De acordo com as entidades, o texto, que poderá ser votado na próxima semana, tenta ressuscitar ataques aos direitos trabalhistas já rejeitados inclusive pelo poder Legislativo em outras matérias.
O texto reaproveita elementos da caduca MP 905 (da carteira verde e amarela) que perdeu validade, como a redução da multa paga pelas empresas em caso de demissão sem justa causa de 40% para 20% sobre o saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
A presidente da Associação Nacional do Magistrados do Trabalho (ANAMATRA), Noemia Porto, afirmou que a tentativa de “reaproveitar” elementos vencidos em outras matérias é inconstitucional.
“A Constituição Federal veda a edição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia, bem como o STF já se posicionou pela inconstitucionalidade de emenda parlamentar em projeto de conversão de MP em lei, por conteúdo temático distinto daquele originário”, afirma Noemia.
Além disso, a Anamatra aponta que as alterações feitas na MP 927/2020 pelo relator vão “na contramão de medidas protetivas do emprego e da renda que vêm sendo adotadas pelos principais países atingidos pela pandemia, afeta a subsistência dos trabalhadores, das trabalhadoras e de suas famílias, assim como atinge a sobrevivência de micro, pequenas e médias empresas, com gravíssimas repercussões para a economia e impactos no tecido social”.
Entre as mudanças de caráter permanente, o relator propôs que o repouso remunerado aos domingos, hoje regra, seja apenas preferencial e amplia essa possibilidade para todos os setores, sem ressalvas. A Consolidação da Leis Trabalhistas (CLT) prevê que o repouso deve ser sempre aos domingos, “salvo motivo de conveniência pública ou necessidade imperiosa do serviço”.
O relatório também flexibiliza a fiscalização trabalhista e restringe o reconhecimento de acidente de trabalho durante o trajeto do serviço. Aumenta, por exemplo, as situações em que deverá ocorrer a dupla visita dos auditores antes da autuação e também o intervalo entre elas.
Outro ponto questionado na matéria é a possibilidade de dispensar o empregador de reembolsar as despesas com aquisição e manutenção de equipamentos tecnológicos e de infraestrutura que viabilizem a realização o chamado home office (trabalho remoto).
O relator cria ainda a possibilidade de a empresa obrigar os trabalhadores para a qualificação sem especificar a forma como estas devam se dar, isenta o pagamento em dobro de férias vencidas não gozadas, cria a prevalência da lei sobre os acordos coletivos de trabalho (ACT), mesmo quando estes são mais favoráveis à categoria.
O novo relatório também tenta flexibilizar as Normas de Saúde e Segurança no Trabalho, dispensando homologação judicial, em caso de violação de normas trabalhistas.
O Fórum Interinstitucional de Defesa do Direito do Trabalho e da Previdência Social (Fids) lembra, em nota, que os limites constitucionalmente impostos à edição de Medidas Provisórias são para momentos de urgência, porém essa matéria trata-se de uma nova tentativa de acelerar a “desregulamentação do Direito do Trabalho, debilita acentuadamente instituições e entidades essenciais à preservação do ideário da Justiça Social, como a Fiscalização do Trabalho, a Justiça do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho e os Sindicatos”.
“Impor a aceitação dessas previsões, sob o argumento de que ficarão todos desempregados, não é condizente com a magnitude que se espera do Estado brasileiro. Os poderes constituídos – Executivo, Legislativo e Judiciário – e a sociedade civil são corresponsáveis pela manutenção da ordem constitucional. Em momentos como o presente é que mais se devem reafirmar as conquistas e salvaguardas sociais e econômicas inscritas, em prol da dignidade da pessoa humana e do trabalhador e da trabalhadora, do desenvolvimento socioeconômico e da paz social”, ressalta a Anamatra em nota técnica.