“Isso passa por reindustrialização, por reconversão industrial, por investimento em ciência e tecnologia, sustentabilidade ambiental, e eu diria que, principalmente, pela redução da pobreza e do combate às desigualdades”, afirma Fernando Guimarães, coordenador do Direitos Já!
O coordenador do movimento “Direitos Já! Fórum pela Democracia”, o sociólogo Fernando Guimarães, afirma, em entrevista ao HP, que diante da pandemia da Covid-19, que “danificou as cadeias produtivas no mundo todo, em todos os segmentos econômicos”, é necessário “uma forte ampliação do mercado interno, além do crescimento da nossa participação global, medidas emergenciais de recuperação do emprego, da produção, abrindo inclusive investimentos de mais longo prazo”.
O Direitos Já! reúne lideranças de 17 partidos políticos que defendem a democracia e lançou recentemente um programa com sugestões para a saída da crise econômica agravada pela pandemia da Covid-19. O documento foi elaborado com a participação de vários setores da sociedade e de renomados economistas.
Segundo Fernando Guimarães, em momentos de crise, “a ampliação de investimento é fundamentalmente necessária” e “hoje não existe nenhuma nação desenvolvida que tenha dado um salto econômico com base em poupança externa”.
“Hoje a relação dívida e PIB aqui está na casa do 100%. Nos países desenvolvidos estão levando seus gastos a níveis máximos para enfrentar a crise”, enfatizou, “mas é preciso romper com certas convenções no mundo econômico para isso”.
HORA DO POVO– Neste momento em que o país passa pela maior crise sanitária de sua história e a economia entra em profunda recessão, quais são os principais pontos que você destacaria no programa para a retomada do crescimento econômico, lançado pelo Direitos Já! sob sua coordenação?
FERNANDO GUIMARÃES – Em momentos de crise, o racionalismo individual leva que as empresas promovam demissões para conter custos. Num primeiro momento, isso aparenta ter algum sentido, porém, levado às últimas consequências, por todos os microrganismos econômicos, fará com que as empresas deixem de gerar riquezas, impossibilitando de pagarem as suas dívidas passadas e de aprimorar o desenvolvimento das suas cadeias produtivas. Noutras palavras, contrair crédito e dívida hoje é a condição do pagamento dessas dívidas passadas e acumular riqueza futura. O problema se encontra na dificuldade desse governo conseguir fazer esse raciocínio, minimamente sofisticado, de pensar a macroeconomia. O que é necessário hoje, fundamentalmente, é uma forte ampliação do mercado interno, além do crescimento da nossa participação global, medidas emergenciais de recuperação do emprego, da produção, abrindo inclusive investimentos de mais longo prazo. Isso passa por reindustrialização, por reconversão industrial, por investimento em ciência e tecnologia, sustentabilidade ambiental, e eu diria que, principalmente, pela redução da pobreza e do combate às desigualdades.
HP – O programa apresentado tem como base a ampliação dos investimentos públicos, inclusive como forma de estimular o investimento privado. O governo diz que o Estado está quebrado e não há recursos, que só o capital estrangeiro pode tirar o país da crise. O que você acha dessa polêmica?
FERNANDO – A pandemia, ela danificou as cadeias produtivas no mundo todo, em todos os segmentos econômicos. Onde o capital alemão, americano, japonês irá aportar os seus recursos quando a epidemia passar? Na recuperação de suas respectivas economias ou no Brasil cujo ambiente jurídico, econômico é totalmente insalubre? Não existe nenhuma nação desenvolvida que tenha feito um salto econômico com base em poupança externa. Hoje a relação dívida e PIB aqui está na casa do 100%. Nos países desenvolvidos estão levando seus gastos a níveis máximos para enfrentar a crise. Já há vários instrumentos financeiros para enfrentamento dessa crise utilizando de recursos em fundos não utilizados pela União, utilização de juros, de reservas cambiais, mas é preciso romper com certas convenções no mundo econômico para isso.
HP– Há no governo um debate entre os que defendem a ampliação de investimento públicos, mesmo que tímidos, como no Programa Pró-Brasil, e os que insistem na manutenção do arrocho fiscal e corte de gastos. Qual sua avaliação. Você vê alguma possibilidade de que esse governo venha a adotar as propostas do programa do Direitos Já!?
FERNANDO – A ampliação de investimento público é sempre bem-vinda, principalmente, em momentos de crise, onde ela é fundamentalmente necessária. Agora, o programa Pró-Brasil apresentado por esse governo propõe a gastar R$ 30 bilhões em três anos. Isso dá pouco mais de 1% do nosso PIB por ano. Hoje nós temos cerca de R$ 150 bilhões de obras por ano no Brasil, ou seja, o que está sendo apresentado é algo insignificante. Falta esse governo ter responsabilidade, comprometimento e capacidade. Coragem de fazer aquilo que precisa ser feito, não atender interesses outros.
HP – Como o movimento Direitos Já! pensa em fazer para que os pontos desse programa venham a ser implantado o mais rápido possível?
FERNANDO – O instrumento que eu diria que já constrói, é o de dialogar com a sociedade, dialogar com os partidos políticos. Essa nossa proposta, ela consultou organizações da sociedade civil, ela foi mediada por diversos economistas da sociedade, economistas indicados pelos partidos. O nosso conselho político que reúne lideranças dos mais diversos campos políticos e partidários avalizou por consenso essa construção e agora nós estamos buscando dialogar com o Congresso Nacional, apresentando essa proposta aos senadores, aos deputados. O Congresso Nacional hoje tem um papel fundamental, ele é uma espécie de veículo condutor para esses grandes debates da nação, que é o seu papel, e que torna uma dimensão de mais ampla relevância principalmente pela inépcia do atual Poder Executivo.
ELIANA REIS