Ex-dono da franquia denunciou esquema e foi ameaçado de enforcamento por sócio laranja do “01”
As quebras de sigilos bancários dos envolvidos no esquema de lavagem de dinheiro no gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), estão reforçando as suspeitas do Ministério Público de que a loja de chocolates da Kopenhagen do atual senador, localizada num shopping na Barra da Tijuca, Zona Oeste da cidade, era usada para lavar dinheiro público desviado da Alerj.
Os investigadores descobriram que Fernanda Antunes Figueira, mulher de Flávio não aparece oficialmente na sociedade da loja apesar de ter transferido, em 2015, R$ 350 mil de sua conta pessoal para a compra da loja, que custou R$ 1 milhão. Quem aparece como sócio de Flávio é Alexandre Ferreira Dias Santini, que, segundo os investigadores do MP-RJ, não passa de um laranja na sociedade.
Um episódio revelado pelo ex-dono da loja, o empresário Cristiano Correia Souza e Silva, mostra bem que tipo de função era exercida por Santini na “sociedade” com Flávio. Em dezembro 2016, Cristiano, que também é dono de outra loja da Kopenhagen, em outro shopping no mesmo bairro, descobriu que a loja de Flávio estava fraudando notas fiscais. Ele vendia panetones que custavam R$ 100 pelo preço de R$ 80, mas a nota fiscal emitida era no valor de R$ 100.
Cristiano disse que a prática significa uma infração contratual e, por isso, entrou em contato com a matriz, que, segundo ele, fez uma fiscalização e constatou que a operação ocorria com emissão de nota fiscal com o preço cheio, mas o cliente pagava um valor menor.
O empresário contou em seu depoimento que, após fazer a denúncia, ele e a mulher passaram a receber ameaças. O laranja do negócio, Alexandre Ferreira Dias Santini, enviou pelo aplicativo de mensagens uma imagem para a mulher de Cristiano de pessoas sendo enforcadas.
Eles disseram ao Ministério Público que ficaram assustados e registraram uma ocorrência policial. Mas depois o casal não deu andamento ao caso porque ficou com medo.
Cristiano disse ainda que uma consultora da Kopenhagen filmou uma venda com preço menor com o próprio telefone. A Kopenhagen confirmou, em entrevista à Rede Globo, que comprovou a denúncia de uso de preço fora da tabela e informou ainda que a loja de Flávio foi advertida e multada por causa disso.
As informações reforçam a hipótese do MP de que havia uma engrenagem montada para esquentar dinheiro na loja de chocolates. Os promotores já apontaram no inquérito que existe uma forte suspeita de que parte dos recursos desviados da Assembleia Legislativa do Rio tenha sido lavada na loja de chocolates.
FUNCIONÁRIOS FANTASMAS SACARAM R$ 7,2 MILHÕES
Outra descoberta feita com a quebra dos sigilos foi a de que ex-assessores fantasmas do senador Flávio Bolsonaro investigados pelo MP-RJ sacaram, em dinheiro vivo, pelo menos R$ 7,2 milhões. O valor sacado em espécie corresponde a 60% do que os servidores receberam dos cofres públicos fluminenses.
As retiradas dos fantasmas coincidiram com períodos nos quais, segundo o MP do Rio, Flávio pagou despesas usando dinheiro em espécie. O principal caso apontado pelos investigadores é o da compra de dois imóveis em Copacabana, na zona sul do Rio, em dezembro de 2012. O parlamentar teria pagado, ‘por fora’, R$ 638,4 mil ao vendedor, enquanto os registros oficiais da compra mostram o valor de R$ 310 mil – pagos regularmente. O então deputado estadual também usou R$ 86,7 mil em dinheiro na compra de 12 salas comerciais, em 2008.
Os fantasmas do gabinete pertencem a três grupos, conforme a separação da própria Promotoria: 12 são ligados a Queiroz por graus de parentesco ou vizinhança; dez são familiares de Ana Cristina Siqueira Valle, segunda ex-mulher de Jair Bolsonaro; e dois são parentes do miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega, morto em fevereiro numa operação policial na Bahia.
Os assessores do núcleo ligado a Queiroz mantinham com mais frequência outra prática, além dos saques: a de transferir ou depositar diretamente para ele os próprios salários. Nathália Melo de Queiroz, que também trabalhou no gabinete de Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados, repassou ao pai R$ 633 mil dos R$ 774 mil que recebeu da Alerj. Marcia Oliveira de Aguiar depositou na conta do marido R$ 445 mil do R$ 1,2 milhão que recebeu e sacou em dinheiro vivo R$ 423 mil.
Ao pedir a prisão preventiva de Queiroz e Márcia, em junho deste ano, o MP destacou uma página da caderneta mantida pela mulher do ex-assessor. Nela, uma anotação registra R$ 174 mil que o casal teria recebido em dinheiro – de origem não identificada. Com essa quantia, o ex-assessor de Flávio Bolsonaro teria arcado com as despesas do Hospital Albert Einstein, em São Paulo, durante tratamento de um câncer. Foi detectado na época que Queiroz estava ameaçando testemunhas e destruindo provas com a cumplicidade de funcionários da Alerj.