Nem intervenção no RJ conseguiu disfarçar
Repúdio fez governo não conseguir os votos para destruir aposentadorias
O ataque aos direitos previdenciários do povo brasileiro, tão reincidentemente apregoado por todos os canalhas da República – Temer e sua quadrilha, Meirelles, a miuçalha da miuçalha do Congresso, e, inclusive, Lula e Dilma quando no poder (eles somente são contra a “reforma da Previdência” quando estão fora do poder) – teve, na segunda-feira, um enterro de quinta classe, sem choro nem vela e sem fita amarela.
É verdade, isto não quer dizer que não possa sair da cova – mas essa é a luta do povo brasileiro.
O fato é que a tentativa de Temer foi enterrada.
No entanto, nem por isso seu próprio enterro foi menos canalha.
A intervenção no Rio, três dias antes – ou, melhor, no dia útil anterior – àquele marcado para a votação, na Câmara, da proposta do governo contra a Previdência (que seria na segunda-feira, dia 19), significava, como todos perceberam, que Temer & cia. queriam evitar a derrota, porque não tinham como aprová-la, e mudar de assunto. Ou, como dizem os marketeiros do governo, este queria “mudar de pauta”.
O que significava desconversar e arrumar um factoide.
O que arrumaram foi pior que a derrota no Congresso: um desastre, uma fuga com o calcanhar batendo no traseiro, debaixo de pau, tentando manipular as Forças Armadas numa aventura demagógica e sem futuro, para não resolver problema algum, do Rio de Janeiro e do Brasil – e agravando vários, até mesmo com tentativas hitleristas, como o infame “mandado coletivo de busca, apreensão e captura”.
Como disse o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, da força-tarefa da Operação Lava Jato, “não existem mandados de busca coletivos em endereços genéricos”. Muito menos um mandado de captura sem identificar quem deve ser capturado. Se as leis permitissem isso, seria possível prender uma favela inteira – apesar dos moradores das favelas, em sua maioria, serem trabalhadores, empregados ou desempregados. Ou seria possível a prisão e busca em casas, baseadas em características étnicas – a cor da pele, por exemplo.
O Código de Processo Penal, em seu artigo 243, determina que o mandado de busca deverá designar “o mais precisamente possível, a casa em que será realizada a diligência e o nome do respectivo proprietário ou morador; ou, no caso de busca pessoal, o nome da pessoa que terá de sofrê-la ou os sinais que a identifiquem”.
COMANDANTE
O que, aliás, é óbvio. Com uma razoável dose de ironia, comentou o procurador Carlos Fernando: “É preciso deixar claro ao senhor Presidente da República, conhecido constitucionalista, os limites do estado de direito”.
Porém, segundo o ministro da Defesa de Temer, Raul Jungman, os “mandados coletivos” são necessários porque “na realidade urbanística do Rio, você muitas vezes sai com a busca e apreensão numa casa, numa comunidade, e o bandido se desloca”.
Ou seja, como o bandido não colabora, ficando parado, o ministro acha que o mandado tem de ser estendido ao bairro inteiro. Até hoje, o fato dos bandidos se deslocarem jamais tinha provocado tal necessidade – até porque existe a prisão em flagrante.
Acima, dissemos que o mandado coletivo era uma tentativa hitlerista. Vamos corrigir: trata-se de coisa dos três patetas. Mas revela a mentalidade da quadrilha que está no governo. A intervenção no Rio não revela qualquer preocupação com os problemas de segurança pública, até porque, se eles tivessem tal preocupação, teriam de renunciar e se entregar à polícia e à Justiça, para pagar por seus crimes. O que são Temer, Padilha, Moreira – ou o recolhido Geddel – senão criminosos que esperam punição?
O comandante do Exército, general Eduardo Villas Boas, está inteiramente certo ao dizer que “os desafios enfrentados pelo estado do RJ ultrapassam o escopo da segurança pública, alcançando aspectos financeiros, psicossociais, de gestão e comportamentais”.
É conhecida a posição do general Villas Boas sobre o uso do Exército no papel que deveria ser da polícia: “Não gostamos deste tipo de emprego. Não gostamos”, disse ele, em depoimento no Senado, no ano passado, lembrando a intervenção anterior, também no Rio de Janeiro:
“Eu, periodicamente, ia até lá [na favela da Maré] e acompanhava nosso pessoal, nossas patrulhas na rua. E um dia me dei conta. Os nossos soldados atentos, preocupados – são vielas –, armados. E passando crianças, senhoras, eu pensei: ‘Estamos aqui apontando arma para a população brasileira’. Nós somos uma sociedade doente. E lá ficamos 14 meses. Do dia em que saímos, uma semana depois tudo havia voltado ao que era antes. Então, temos que realmente repensar esse modelo de emprego, porque é desgastante, perigoso e inócuo”.
BURLA
Na sexta-feira, Temer declarou que “quando a reforma da Previdência estiver para ser votada, eu farei cessar a intervenção. No instante que se verifique que há condições para votação, farei cessar a intervenção”.
Trata-se de algo completamente ilegal. Como disse um jurista, trata-se de uma burla à Constituição: “havendo intervenção federal o Congresso fica impossibilitado de continuar tramitações e deliberar sobre Propostas de Emenda à Constituição (…). Quanto ao segundo ponto da declaração [de Temer] que aduz a possibilidade de cessação da Intervenção para votação de PEC, tal conduta é vedada pela própria Constituição Federal. (…) seria uma nítida burla inconstitucional a suspensão ou cessação da Intervenção Federal para a votação de qualquer PEC durante a vigência daquela” (cf. André Luiz Maluf, “Intervenção federal: consequências jurídicas e institucionais”, Jota, 19/02/2018).
Assim, o texto aprovado na madrugada de quinta-feira pela Câmara, por 340 a 72 votos, estabelece como prazo da intervenção no Rio de Janeiro, o dia 31 de dezembro deste ano. Portanto, até lá, estão proibidas, pela Constituição, a tramitação e a votação de emendas constitucionais – tal como era o ataque de Temer à Previdência Social.
O que acontecerá agora?
Segundo diziam esses ladrões, o país iria acabar se não fosse aprovada a sua “reforma da Previdência”.
Nossos leitores – e todo o povo brasileiro – não precisam de que nós os avisemos que o país não vai acabar porque eles não conseguiram aprovar o assalto às aposentadorias e pensões dos trabalhadores.
Afinal, foi, precisamente, devido ao repúdio do povo – que, há muito, jamais esteve tão unido em torno de uma questão – que esse assalto não passou.
Em nossa página 5 desta edição, fizemos uma breve retrospectiva da luta em defesa da Previdência – que, como toda grande luta, teve seus heróis e seus traidores.
Não tenhamos dúvida: essa camarilha de vagabundos, de parasitas que se cevam com os recursos do povo, tentará outra vez – provavelmente, outras vezes – se apropriar do dinheiro que os brasileiros reservam e pagam para garantir, na idade madura, as suas aposentadorias.
Mas isso não diminui a vitória de agora. Significa, apenas, que a luta não terminou – e terá que ser decidida com a escolha de um governo e de um Congresso identificados com o povo e com o Brasil.
CARLOS LOPES