“A ECT não comprovou nos autos que tenha prejuízo, ao contrário, o que aparece são lucros repetidos nos últimos três anos. Mesmo medidas sem custo para a empresa foram rejeitadas. Não havia a menor questão em negociar”, disse Kátia Arruda
A greve dos trabalhadores dos Correios, encerrada na terça-feira (22) durou mais de trinta dias e conseguiu impedir que o governo e a direção da empresa impusessem a perda de todos os direitos obtidos pela categoria nas últimas décadas.
Como disse a ministra Katia Arruda, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), na sessão do dissídio coletivo, ocorrida na segunda-feira (21), ela nunca viu, em quase trinta anos de magistrado “uma atitude tão negativa de uma empresa em relação aos seus trabalhadores”. A ECT se recusou a fazer qualquer negociação. “Uma arrogância extrema”, sentenciou a magistrada.
Após ter obtido em dezembro do ano passado a liminar do ministro Toffoli, que reduziu a vigência do tempo de duração de dois anos para um ano do acordo coletivo assinado em 2019, a ECT pretendia manter os trabalhadores dos Correios sem nenhuma cláusula protetiva de trabalho.
Segundo Katia Arruda, “a categoria foi instigada ao conflito”. “Os trabalhadores viram-se frente à possibilidade de ficar sem nenhum direito e foram à greve”, assinalou a ministra.
Das nove cláusulas que a ECT admitia manter, várias delas não versavam sobre direitos, mas apenas sobre itens secundários, já garantidos por lei, ou cláusulas de tempo vigência, etc. O plano de saúde e o auxílio alimentação permaneciam na pauta, mas sem garantia de que fossem ofertados pela empresa. A formulação era de que a ECT “poderia oferecer”, ou seja, a empresa não dava nenhuma segurança aos trabalhadores de que isso fosse ocorrer.
A decisão do governo e da empresa era de ataque radical e amplo aos direitos dos trabalhadores. A luta dos trabalhadores dos Correios foi hercúlea para se defender. Os sindicatos da categoria estiveram à frente do movimento de resistência.
A interrupção repentina da vigência do acordo, que tinha uma duração de dois anos, deixou os trabalhadores dos Correios sem nenhum item de regulação das relações de trabalho. A empresa não admitia negociar. Nas audiências no TST mantinha-se irredutível. Não restou outra alternativa para os funcionários a não ser a greve.
Com a liminar interrompendo a vigência do acordo, a ECT imediatamente emitiu nota dizendo que a partir da decisão do ministro Dias Toffoli, a empresa só se comprometia “com o que está na CLT”.
O subprocurador do Trabalho, Luiz Flores, criticou, durante a sessão do TST, a decisão de Toffoli sobre a vigência bienal do Acordo Coletivo de Trabalho de 2019. Ele disse que essa decisão de Toffoli foi uma usurpação por parte do STF, porque, segundo ele, este “é assunto processual e não constitucional.”
O pretexto apresentado pela ECT, e aceito por Toffoli, e depois assumido pela maioria do pleno do Supremo Tribunal Federal, para a interrupção da vigência do acordo coletivo, foi de que essa decisão causaria problemas financeiros à empresa.
Como a ECT não está em dificuldades financeiras, o que Toffoli fez foi agradar Bolsonaro, que exigia o arrocho. Com isso o ministro acabou provocando graves prejuízos para mais de cem mil trabalhadores. Segundo o ministro a decisão por dois anos de vigência “contribui para potencializar os efeitos dessa decisão no equilíbrio das contas da requerente bem como em sua gestão administrativa”.
A argumentação da ECT de dificuldades econômicas da empresa foi completamente refutada pela ministra Katia Arruda, já que, segundo ela, “a ECT vem apresentando lucros seguidos nos últimos três anos”.
Os advogados dos trabalhadores também desmontaram a argumentação de que os Correios estavam em dificuldades financeiras. “O resultado financeiro oficial da empresa foi positivo em 614 milhões de reais até o segundo trimestre deste ano”, informou Alexandre Lindoso, advogado da Fentect.
Ele acrescentou que a ECT vem mascarando as informações sobre seus resultados para fazer um ataque frontal aos direitos dos trabalhadores, uma “erosão em larga escala dos direitos”. O defensor dos trabalhadores lembrou também que já em 2019 houve a primeira tentativa de esvaziamento dos direitos.
“O esvaziamento foi tentado em 2019 e não se obteve êxito. Por isso a redução da vigência”, disse ele.
Foram mostrados dados de que, de 2007 a 2013, a ECT repassou 6 bilhões para a União como dividendos de lucros. Ou seja, o Tesouro recebeu recursos dos Correios. Esta transferência de parte dos lucros para o Tesouro é uma determinação dos estatutos da empresa.
Nos últimos três anos os resultados foram lucrativos. Em 2018 foram 161 milhões de lucros, mais 102 milhões de lucros em 2019 e, em 2020, no primeiro semestre o lucro da empresa já chegou a 614 milhões de reais, segundo dados dos balanços oficiais da empresa.
“Mesmo sem ter a obrigação de ser lucrativa, porque as atividades monopolizadas e constitucionalizadas, com finalidade exclusiva, não precisam dar lucro – como os tribunais, as Câmara Legislativas, as delegacias de polícia, etc – a ECT, além de eficiente, é altamente lucrativa”, argumentou o defensor dos sindicatos.
Foi neste sentido que a ministra Katia Arruda apontou na sessão do dia 21. “A ECT não comprovou nos autos que tenha prejuízo, ao contrário, o que aparece são lucros repetidos nos últimos três anos”, disse ela. “Não se pode cortar direitos baseando-se em hipóteses de prejuízos futuros”, argumentou. “Mesmo medidas sem custo para a empresa foram rejeitadas. Não havia a menor questão por parte da empresa em negociar”, denunciou Katia Arruda.
Para a ministra, a representante da ECT, ao insistir em dizer que há dificuldades financeiras na ECT, entrou em contradição com as informações oficiais da própria empresa.
A magistrada citou a informação do site da ECT de que a demanda dos Correios cresceu 25% na pandemia impulsionada pelo E-commerce. Segundo ainda a ministra, houve aumento de 135% no comércio eletrônico com ganhos dos Correios. Ela citou também uma outra notícia, que como as outras, saíram no próprio site da empresa, de que os “Correios alavancaram negócios na pandemia”.
O faturamento da ECT cresceu muito durante pandemia. E os gastos da empresa com a pandemia atingiram apenas 0,077% de seu faturamento, segundo dados oficiais.
Em suma, o resultado da greve é que o TST acabou impondo à ECT a manutenção de várias cláusulas consideradas históricas, e que a empresa e o governo queriam cortar. Esse resultado só foi possível por conta da luta dos trabalhadores.
Se não houvesse a greve não sobraria praticamente nada de todos esses anos de conquistas da categoria.
A própria ministra do TST ficou impressionada com a visão destrutiva e a arrogância da atual direção dos Correios. Segundo ela, “nesses tempos de pandemia, o que se espera são atitudes de solidariedade, mas o que se viu foi uma arrogância que eu nunca vi em todos esses anos de magistério”.
Um dos advogados dos trabalhadores informou que nas audiências de conciliação surgiram as falas de que o interesse do governo é privatizar a ECT. “Para privatizar é necessário retirar direitos dos trabalhadores”, lembrou o advogado.
“Eles mentem sobre prejuízos mas ainda assim, comprovou-se nos autos que o lucro está presente nas atividades dos Correios. Por isso que se quer privatizá-la, querem dar lucro a terceiros”, disse o defensor dos trabalhadores.
A luta heroica dos trabalhadores dos Correios arrancou um reajuste que a ECT não queria dar, de 2,6%. Impediu que greve fosse declarada abusiva e que os trabalhadores tivessem os dias da greve totalmente descontados de seus salários. Mais do que isso, os sindicatos da categoria impediram que todos os direitos fossem cortados como pretendia a empresa. Conseguiram a manutenção de 29 cláusulas decididas pelo TST.
A ECT não queria manter nada.
O ataque do governo, como disseram o subprocurador do Trabalho, Luiz Flores e a própria Kátia Arruda, foi violento. Eles disseram que nunca viram nada parecido em suas vidas. Mas, os trabalhadores dos Correios lutaram como leões contra a sanha do governo Bolsonaro de destruir a força de seu movimento e cortar todos os seus direitos.
Os trabalhadores dos Correios saíram de cabeça erguida dessa batalha. Souberam sair na hora certa e, com isso, estão preparados para a luta mais ampla contra a intenção do governo de atacar a ECT, que é uma empresa pública altamente competente, querida pelo povo, e lucrativa, para entregá-la às empresas estrangeiras.
SÉRGIO CRUZ
Sou funcionário dos Correios a 22 anos, me orgulho muito dessa empresa, mas gostaria de saber porque tanto ódio, da parte do governo federal, contra nós,funcionários dos Correios !
Esse é o país do toma lá da cá,como o que temos é trabalho a oferecer, e não cargo político, a gente é refém.
Sou funcionário há 25 anos, nunca vi um ataque assim tão feroz da Empresa, sobre nós,não dá pra explicar tudo isso, logo nesse tempo de Pandemia, todos nós lutando pra trabalhar, correndo muito risco, a Empresa nos trata assim, já que somos considerados serviço essencial pelo Governo, muita arrogância mesmo….
Parabéns aos guerreiros e guerreiras da nossa ECT, infelizmente brigamos com forças malignas! Brigamos por justiça, mas neste país existe? No Brasil este é o retrato do nosso judiciário, podre e sem escrúpulos, também sem humanidade, e mesmo com o cenário a favor dos funcionários, saímos derrotados! Derrotados mas com cabeça erguida, e orgulhosos por fazer parte desta empresa que veste azul e amarelo !