O nome da deputada causou muito descontentamento, tanto na base de apoio, quanto na oposição. O nome dela também colide com o STF, que autorizou investigação por participação em atos antidemocráticos e pleitos inconstitucionais. Diante disso, poderá ser trocada, mesmo a contragosto do PSL bolsonarista
Nas negociações e tratativas que guindaram o deputado Arthur Lira (PP-AL) à presidência da Câmara, na última segunda-feira (1º), há vários outros cargos e postos relevantes na Casa a serem ocupados. Depois dos cargos da Mesa Diretora, o órgão deliberativo mais preponderante da Câmara, abaixo do plenário, é a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).
Para esse posto relevante, pois se trata do colegiado temático mais importante da Câmara, o PSL indicou a deputada Bia Kicis (DF) para ocupá-lo. A indicação não lhe garante que se sentará na cadeira de presidente da comissão, porque seu nome ainda precisa ser votado quando o órgão for instalado neste recomeço de atividades legislativas. E há divergência quanto a isso tanto na base governista, quanto na oposição.
Já é sabido que há muitos senões em relação ao nome da deputada para presidir a comissão. Em mensagens no Twitter, o deputado Marcelo Freixo (PSol-RJ) dispara contra a deputada: “O lugar de Bia Kicis não é na CCJ, é no Conselho de Ética, sendo alvo de um processo de cassação por quebra de decoro por usar o cargo de deputada para sabotar o combate à pandemia, pedir intervenção militar e disseminar ‘fake news’”.
Em outra, Freixo faz-lhe pesada crítica: “Bia Kicis na CCJ é uma tragédia e mais um passo na institucionalização do golpe.” Ainda no mesmo tuíte ele diz que a “comissão mais importante da Câmara será presidida por uma disseminadora de ‘fake news’, negacionista, sabotadora do combate à pandemia e apoiadora dos atos pelo fechamento do Congresso e do STF.”
Ao criticar Bia Kicis, também em mensagem no Twitter, a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) não poupou adjetivos: “A tal da @Biakicis é racista, antidemocrática, capacho do planalto e do coroné @jairbolsonaro, contra a democracia, e acha que será presidente da CCJ. Bobinha!!! Já articulamos candidatura avulsa e se ela quiser vir pra briga terá no máximo 10 votos. Beijinho no ombro. Xeque-mate”.
As divergências em relação ao nome de Kicis não estão apenas na oposição. Aliados também não veem com bons olhos o pleito da deputada e a indicação do PSL. Ela é alvo de investigação sobre divulgação de “fake news” e realização de atos antidemocráticos, lembra um governista, em off, quando a fonte fala sem que seja identificada pelo repórter.
INDICAÇÃO OU PLEITO NÃO ESTÁ GARANTIDO
Pelo acordo que garantiu a eleição do deputado Luciano Bivar (PSL-PE) à 1º Secretaria da Câmara, cabe à sigla indicar o presidente da CCJ. Entretanto, o nome de Bia Kicis não é consenso nem em seu partido. Diante da controvérsia, “o partido pode lançar candidatura avulsa para o cargo”, comentou Marcos Queiroz, analista político da consultoria Arko Advice. “Há nomes alternativos no partido [PSL]. Nesse caso, seria um nome de Bivar, que poderia assumir o posto”, completou.
O PSL está rachado. Há dois grupos que disputam o poder no comando da bancada. Um é ligado ao deputado e presidente nacional da sigla, que são chamados de “bivaristas”. O outro é composto pelos bolsonaristas. Fazem parte desse, por exemplo, o deputado Eduardo Bolsonaro (SP), o filho 03 do presidente Bolsonaro.
Nesta quinta-feira (4), o Colégio de Líderes vai se reunir e essas questões poderão ser tratadas e formalizadas.
REPERCUSSÃO NEGATIVA E “ULTIMATO”
O sítio “O Antagonista” veiculou, nesta quarta, nota em que Arthur Lira, em razão da repercussão negativa do nome de Bia Kicis para presidir a CCJ, dá “ultimato” para que o PSL indique outro nome para o posto. Segundo a nota, Lira teria dito “aos deputados do PSL que o partido quebrou o acordo sobre a indicação para a CCJ. O PSL teria a primazia na indicação, porém o cargo deveria ser ocupado por um deputado considerado mais moderado”.
“O nome de Bia foi rechaçado por Lira e por outros líderes. O receio é que a condução dela à CCJ acirre os ânimos com o STF. A ala bolsonarista, do outro lado, quer manter a indicação de Bia Kicis para CCJ”, acrescentou.
E finalizou: “Por essa razão, Lira deu um ultimato à bancada do PSL: ou apresenta um outro nome ou o partido perderá o comando da CCJ. ‘Tudo que a Câmara não precisa agora é criar confusão com outros poderes’, resumiu um importante aliado de Lira em caráter reservado a O Antagonista.”
QUEM É BIA KICIS
Deputada de 1º mandato, foi eleita pelo PRP, com 86.415, migrou para o PSL em 2019. É advogada e procuradora aposentada do Distrito Federal.
A deputada do PSL é uma das mais fiéis defensoras de Bolsonaro no Congresso e nas redes virtuais. Ela comemorou nas redes sociais a derrubada do lockdown (confinamento) em Manaus, dias antes do colapso na saúde do Estado.
Ela é uma das deputadas bolsonaristas investigadas na CPMI (Comissão Parlamentar de Inquérito Mista) do Congresso que apura as chamadas “fake news”, cujos trabalhos estão suspensos em razão da pandemia de coronavírus.
O inquérito investiga os atos antidemocráticos, autorizado pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que apura a organização de manifestações de simpatizantes de Bolsonaro que reivindicaram pleitos inconstitucionais, como o fechamento do Congresso, do STF, e a instituição de golpe militar.
A CPMI das Fake News foi instalada, em setembro de 2019, cujo presidente é o senador Ângelo Coronel (PSD-BA) e a relatora é a deputada Lídice da Mata (PSB-BA). O requerimento para a sua criação foi apresentado pelo deputado Alexandre Leite (DEM-SP), e contou com apoio de 276 deputados e 48 senadores. A CPMI é composta por 15 senadores e 15 deputados e investiga “a criação de perfis falsos e ataques cibernéticos nas diversas redes sociais, com possível influência no processo eleitoral e debate público”.
MARCOS VERLAINE (colaborador)