Presidentes das casas admitem estudar alternativas enquanto Guedes diz que só pensa em discutir se cortar na educação, segurança e no salário de servidores
Pressionados pelo potencial explosivo que significa milhões de brasileiros passarem a ficar, a partir de agora, com o fim da ajuda emergencial, sem nenhuma condição de sobrevivência, os recém-eleitos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), se comprometeram a discutir “alternativas” para uma nova rodada de auxílio emergencial.
A intenção, mesmo sem muita convicção, revelada por eles, de procurar uma alternativa para evitar a tragédia, bate de frente com as posições intransigentes defendidas por Jair Bolsonaro e pela equipe econômica do governo comandada por Guedes.
Estima-se que 63 milhões de brasileiros podem ficar abaixo da linha da pobreza, com renda de até R$ 455 por mês, com o fim do auxílio emergencial, segundo o Ibre/FGV. Em 2019, segundo o IBGE, o país tinha 52 milhões de brasileiros nessa situação. Na extrema pobreza, no primeiro mês deste ano, estão cerca de 27 milhões de pessoas, isso significa que 12,8% dos brasileiros passaram a viver com menos de R$ 246 ao mês ou R$ 8,20 ao dia, segundo projeção da FGV Social, num cenário dramático de aumento do desemprego e dos preços dos alimentos, luz, gás, aluguel e transporte.
No início da pandemia, mesmo com Bolsonaro trabalhando contra qualquer medida de proteção aos brasileiros e repetindo que a pandemia não passava de uma gripezinha, o Congresso Nacional chamou para si a responsabilidade de defender a população e aprovou a ajuda emergencial de R$ 600 para socorrer as famílias vulneráveis à grave crise sanitária e econômica que se abateu sobre o país. Correndo atrás do prejuízo, Bolsonaro chegou a admitir R$ 200, mas o Congresso Nacional atropelou tanto Bolsonaro quanto os banqueiristas do governo e votou os R$ 600.
O Brasil vivia naquela época o primeiro pico da pandemia do novo coronavírus e o parlamento, diante do vazio de poder, diante da irresponsabilidade e do negacionismo de Jair Bolsonaro e sua trupe de terraplanistas, aprovou o “orçamento de guerra”, instrumento decisivo, formulado por Rodrigo Maia, que permitiu viabilizar a ajuda emergencial, bem como outras medidas de apoio a estados e municípios , além de recursos para socorrer pequenas e médias empresas.
No dia 2 de abril de 2020 foi sancionada a Lei 13.982 (lei da ajuda emergencial) que salvou a vida de milhões de pessoas. Nesta data morriam cerca de 500 pessoas por dia vítimas de Covid-19. Houve um curto período de redução do número de casos e mortes nos meses de setembro e outubro, mas a tragédia recrudesceu a partir de novembro. Hoje estão morrendo cerca de mil pessoas por dia. Manaus passou a viver a dramática falta de oxigênio que matou dezenas de pessoas asfixiadas. Ou seja, a situação é muito grave, pior do que quando a lei foi aprovada. Não há a menor justificativa, portanto, para o fim da ajuda emergencial decretado por Jair Bolsonaro.
A exigência é óbvia. A ajuda deve permanecer enquanto o problema existir. Se a pandemia está piorando, não há porque extinguir os mecanismos emergenciais para enfrentá-la. Não há porque cortar os instrumentos de estímulo para autônomos e para micro e pequenos empresários. Não há porque, numa situação como esta, deixar o povo abandonado à própria sorte, como quer Bolsonaro.
Secretários de Fazenda de 18 estados assinaram uma carta, no dia 22 de janeiro, destinada ao Congresso Nacional, em que pedem a adoção de “medidas urgentes” contra a segunda onda de Covid-19 no Brasil, entre elas a prorrogação do auxílio emergencial, concedido aos mais vulneráveis até dezembro.
O governo, que só fez alguma coisa que prestasse no enfrentamento da pandemia quando foi literalmente empurrado pelo Congresso Nacional e pela sociedade, agora está afoito para suspender qualquer ajuda, seja ela para trabalhadores, para autônomos ou para micro e pequenos empresários. Mesmo com a pandemia piorando, o Planalto não admite nem discutir a manutenção dos mecanismos excepcionais – como foi o orçamento de guerra – que permitiram a ajuda emergencial.
Jair Bolsonaro já se pronunciou negando a possibilidade de volta do auxílio por causa do “alto endividamento do país”. No dia 25 de janeiro, ele disse a um apoiador: “A palavra é emergencial. O que é emergencial? Não é duradouro, não é vitalício, não é aposentadoria.”
Paulo Guedes, seu ministro da Economia, afirmou que só prorroga benefício com congelamento de verbas para educação e segurança. Ele disse que qualquer discussão está condicionada ao fim do que chamou de “aumento automático” para educação, segurança e reajuste de salários de funcionários públicos.
“Não pode ficar gritando guerra toda hora. Nós temos que ter muito cuidado. Quer criar o auxílio emergencial de novo, tem que ter muito cuidado, pensa bastante. Porque se fizer isso não pode ter aumento automático de verbas para educação, para segurança pública, porque a prioridade passou a ser absoluta (para o auxílio)”, disse Guedes, durante evento virtual com investidores internacionais.
Ou seja, para Guedes e Bolsonaro, a saúde que interessa, não é a do povo, não é a dos trabalhadores, não é a do país, mas sim, única e exclusivamente, a saúde dos bancos.
S. C.