Negociações entre os partidos se estenderam até tarde da noite e, como o quórum não era seguro para a aprovação da matéria, a votação deverá ocorrer nesta sexta (26)
A Câmara dos Deputados adiou para esta sexta-feira (26) a votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 3/21, de autoria do deputado Celso Sabino (PSDB-PA), que regulamenta e altera o artigo 53 da Constituição Federal. A PEC cria novas regras para as prerrogativas parlamentares e a prisão de deputados e senadores. Na quarta-feira (24), a admissibilidade da matéria já tinha sido aprovada por 304 votos contra 154 e 2 abstenções.
Após reunião com líderes partidários, nesta quinta-feira, a relatora da proposta, deputada Margarete Coelho (PP-PI), aceitou extrair de seu parecer o ponto que alterava a regra sobre inelegibilidade na Lei da Ficha Limpa. O trecho da proposta retirado do parecer pela relatora previa que um candidato só poderia ficar inelegível após o duplo grau de jurisdição. Ou seja, após a fase de recurso. Na prática, o artigo derrubava a Lei da Ficha Limpa.
Durante a sessão, houve intervenções no sentido de que a discussão fosse adiada e que o rito completo para a aprovação de uma PEC, como a discussão pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e o debate com a a sociedade em uma comissão especial, fosse respeitado.
O líder do PCdoB, deputado Renildo Calheiros, argumentou, durante orientação de voto, que esse assunto deveria ser resolvido o mais rápido possível para que temas urgentes, como a solução da falta de vacinas e a ajuda emergencial, possam ser pautados e votados.
Renildo defendeu a chamada de PEC das Prerrogativas, afirmando que “ministro do STF não pode ser ameaçado, não pode votar pressionado”. O líder do PCdoB disse que os parlamentares também não podem ser ameaçados. Ele considera que as mudanças propostas pela PEC garantem um maior equilíbrio entre os três poderes.
A maioria do plenário aprovou a continuidade da discussão sobre a alteração do artigo 53 da Constituição e rejeitou os requerimentos que pediam o adiamento da decisão e a especificação de que a votação fosse feita artigo por artigo em discussão.
O deputado Paulo Ramos (PDT-RJ) argumentou que a PEC está correta, que não altera o que já existe na Constituição e reduzirá os excessos que venham a ser cometidos pelo Judiciário. A deputada Maria do Rosário (PT-RS) posicionou-se contra a aprovação da PEC com o argumento de que induz à impunidade.
Atualmente, pelo artigo 53, os parlamentares têm imunidade parlamentar e só podem ser presos em flagrante por crime inafiançável. Segundo a PEC, o parlamentar só pode ser preso em flagrante por crime inafiançável previsto na Constituição, como prática de racismo, tortura, tráfico de drogas ilícitas, terrorismo, crimes hediondos e ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático de Direito.
A relatora afirmou que, em seu texto, irá alterar esse trecho para “crimes inafiançáveis previstos em lei”. Segundo ela, isso facilitará porque, caso o Legislativo queira acrescentar mais algum crime inafiançável na legislação, não precisará modificar a Constituição.
Alguns deputados alertam, porém, que, dependendo do conteúdo do parecer, há riscos sobre o seu entendimento. O deputado Fábio Trad (PSD-MS), por exemplo, manifestou-se contra a PEC e contestou a relatora, argumentando que de nada adianta trocar “crimes inafiançáveis previstos pela Constituição” por “crimes previstos na lei”. A lei define crimes inafiançáveis com base na Constituição.
Atualmente, no rito em caso de prisão em flagrante, a Câmara (no caso de deputado) ou Senado (se for senador) tem que ser notificado em até 24 horas sobre a prisão em flagrante e submeter ao plenário a análise da medida. O plenário pode revogar a prisão ou mantê-la por decisão da maioria absoluta (isto é, 257 deputados ou 41 senadores).
A PEC diz que o parlamentar preso fica em custódia nas dependências da própria Câmara ou do Senado até que o plenário se pronuncie. Se o plenário decidir manter a prisão, o parlamentar preso será submetido a uma audiência de custódia pelo juízo competente. O texto diz que o juiz poderá relaxar a prisão, concedendo liberdade provisória. Ele só poderá mantê-lo preso se houver manifestação do Ministério Público pedindo a conversão para prisão preventiva ou a adoção de medidas cautelares.
Sobre o alcance da imunidade parlamentar, atualmente, deputados e senadores têm imunidade parlamentar, civil e penalmente, por quaisquer opiniões, palavras e votos. O princípio da imunidade parlamentar é dar garantia institucional ao parlamentar para que não seja perseguido por ideias e opiniões.
Segundo a PEC, a imunidade parlamentar fica mantida, mas o parlamentar só pode responder por suas declarações em um processo disciplinar no Conselho de Ética da Câmara ou do Senado, que eventualmente pode levar à perda do mandato. Não poderá ser responsabilizado civil ou penalmente de jeito nenhum.
Quanto às medidas cautelares – hoje restritas ao afastamento do mandato ou restrição para frequentar determinados lugares, poderão ser decididas pelo juízo competente do caso. Pela PEC, qualquer decisão que afete o mandato parlamentar não pode ser dada em regime de plantão judiciário e só terá efeito depois de ser confirmada pelo plenário do STF. A PEC veda expressamente que o parlamentar seja afastado temporariamente do mandato por uma decisão judicial.
No caso de buscas e apreensões, o juiz hoje é responsável pelo caso pode determinar busca e apreensão que tenham parlamentares como alvo. Pela PEC, somente o STF poderá determinar essas ações contra parlamentares quando forem cumpridas nas dependências da Legislativo ou nas residências dos parlamentares. Em caso de busca e apreensão nas dependências das casas legislativas, o cumprimento da medida deve ser acompanhado pela Polícia Legislativa da Câmara ou do Senado. Se for em outro local, a medida de busca e apreensão também poderá ser determinada por outra instância da Justiça, mas os itens apreendidos ficarão sob cautela até que a decisão seja confirmada pelo plenário do STF, sob pena de crime de abuso de autoridade.
Pelo entendimento atual do Supremo Tribunal Federal, conforme julgamento de 2018, o foro privilegiado vale somente para crimes cometidos no mandato e relacionados à atividade parlamentar, ou seja, deputados e senadores não dispõem de foro em crimes comuns ou cometidos antes do mandato e respondem a esses processos em instâncias inferiores. Pela PEC, a regra que restringe o foro fica mantida e passa a constar expressamente na Constituição.