Edson Fachin, que já havia votado pela aceitação da denúncia contra Lira e seus pares, usou um adendo do voto para contestar o arquivamento do inquérito. Lira e os demais deputados do grupo, segundo a PGR, prejudicaram a Petrobrás em cerca de R$ 30 bilhões
A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu na terça-feira (2), por 3 votos a 2, arquivar a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e outros políticos do partido, investigados no chamado Quadrilhão do PP.
A Procuradoria-Geral da República denunciou Lira, o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP, e os deputados Eduardo da Fonte (PP-PE) e Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) por envolvimento em desvios na Petrobrás, investigados pela Operação Lava Jato. A PGR afirma que Arthur Lira e os demais deputados prejudicaram a Petrobrás em cerca de R$ 30 bilhões.
Em junho de 2019, a Segunda Turma havia aceitado a denúncia. Na ocasião, ela era integrada pelos ministros Edson Fachin, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello, que se aposentou no ano passado.
Gilmar Mendes puxou a votação para livrar os parlamentares. Ele criticou o trabalho dos procuradores e disse que a denúncia foi “artificial” e não reuniu indícios de que, de fato, houve a atuação de uma organização criminosa. Para o ministro, a denúncia foi baseada somente em delação premiada, o que a lei proíbe, e houve tentativa de criminalizar a política. Edson Fachin, que já havia votado pela aceitação da denúncia, usou um adendo do voto para contestar Gilmar Mendes.
Fachin afirmou que entendimentos da própria Segunda Turma do STF reconheceram indícios de crimes investigados na Lava Jato e rechaçou a tese de criminalização da política. Segundo o ministro, não é regular a indicação a um cargo ou a sustentação política quando isso ocorre de forma desviada, transformando a função pública em “mercadoria”. O ministro disse que não houve vício processual no julgamento que justificasse acolher os recursos das defesas.
Nunes Marques, indicado por Bolsonaro, seguiu Gilmar Mendes e votou pela rejeição da denúncia. Segundo Nunes Marques, a PGR utilizou elementos já rejeitados em outros inquéritos e se baseou em elementos de delações. Entendeu, ainda, que não houve individualização da acusação. “Praticamente todos os inquéritos foram arquivados. O acórdão não considerou que investigações foram arquivadas, rejeitadas. Por esse motivo, rejeito a preliminar, para que tais elementos sejam incluídos ou aclarados, com a rejeição da denúncia”, disse.
A ministra Cármen Lúcia votou a favor de manter o recebimento da denúncia. Segunda a ministra, a defesa buscou rediscutir questões já rejeitadas. Cármen Lúcia disse também que não houve irregularidade ou vício na decisão que recebeu a acusação e descartou a criminalização da política no caso. A ministra ressaltou que a corrupção tira a credibilidade das instituições. “O que mina a credibilidade de instituições numa democracia é a corrupção, que precisa ser combatida. Faço questão de assinalar que é da maior gravidade o que foi posto”, afirmou.
O ministro Ricardo Lewandowski foi o último a votar. Entendeu que a denúncia deveria ser rejeitada porque não há elementos que permitam receber a acusação, que teria se baseado em afirmação de delatores. Mesmo assim, o ministro afirmou que o STF tem compromisso com o combate à corrupção.
A acusação, feita pela PGR é de que o interesse dos líderes do núcleo político era o de obter cargos estratégicos na Administração Pública Federal com o objetivo de arrecadar propina junto aos empresários que se relacionavam com empresas e órgãos públicos. “A existência da organização criminosa em tela e o esquema de pagamento sistemático de propinas intermediado pela Diretoria de Abastecimento da Petrobrás e por operador financeiro foram, inclusive, admitidos por parlamentares e ex-parlamentares denunciados nestes autos”, destacou Raquel Dodge, então procuradora-geral, no documento.
O argumento de Gilmar Mendes, de que a denúncia se baseou apenas em colaboração premiada foi contestada.
A PGR ainda ressaltou à época que a denúncia apresentava como provas depoimentos de colaboradores, que foram corroborados por planilhas de pagamento, cópias de contratos das empresas, comprovantes de transferências bancárias, e-mails, além da confissão parcial dos fatos por alguns dos denunciados.
A partir desses dados, argumentou a procuradora-geral, forma-se uma narrativa “harmônica” com a indicação de que os denunciados tinham plena ciência do esquema criminoso e da origem das quantias ilícitas, “tendo atuado concertadamente (unidade de desígnios e soma de esforços), em divisão de tarefas, de modo livre, consciente e voluntário”, salientou.
A denúncia foi oferecida pela Procuradoria-Geral da República em setembro de 2017 e tinha, inicialmente, 12 acusados. A parte que se referia a João Alberto Pizzolatti Júnior e a Pedro Henry Neto, foi enviada à Justiça Federal em Brasília, por determinação do STF, uma vez que não tinham foro por prerrogativa de função.
Outros quatro denunciados – José Otávio Germano, Benedito Lira, Luiz Fernando Ramos Faria, Nelson Meurer – tiveram o mesmo destino, uma vez que não foram reeleitos deputados federais e perderam o foro. Como Mário Negromonte exerce o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia (TCM/BA), a Corte determinou o envio dos autos do inquérito contra ele para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que tem competência para atuar no caso. Já os crimes relativos a Francisco Dornelles prescreveram, o que resultou no arquivamento da denúncia.