“O presidente da República deveria saber que decretar estado de sítio não é tão fácil como depositar R$ 89 mil na conta da primeira-dama”, afirmou o senador Randolfe Rodrigues (Rede AP). Reação foi imediata
Jair Bolsonaro afirmou a apoiadores na manhã desta sexta-feira (19), na saída do Palácio do Alvorada, que o “terreno fértil para a ditadura é exatamente a miséria, a fome, a pobreza“ e insinuou a decretação de um estado de sítio.
Ele fez essas ameaças ao comentar as medidas tomadas pelos governadores para conter o crescimento dos casos de Covid-19. “Mortes há em qualquer lugar do mundo”, disse ele para justificar sua inação e mostrar que ele não se preocupa com as quase 300 mil pessoas que morreram no Brasil de Covid.
INSINUAÇÕES DE ESTADO DE SÍTIO
Depois de entrar com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra as medidas sanitárias dos Estados e municípios para fazer frente ao avanço da pandemia, Bolsonaro voltou a ameaçar os governadores. Disse que o governo federal precisará adotar medidas contra as ações restritivas adotadas por governadores e prefeitos.
Ele disse que governadores e prefeitos estariam “humilhando a população, dizendo que está defendendo a vida deles”. “Ora bolas, que defendendo a vida. Vocês estão matando essas pessoas”, disse Bolsonaro.
E ele ainda continuou: “Não se pode, governadores e prefeitos, usurpam da Constituição via decretos, retirar o direito de ir e vir das pessoas. Isso é para estado de sítio, estado de Defesa. E não é só eu, é o Congresso também sendo ouvido”. Mais uma vez, interesseiramente, ele confunde as medidas tomadas pelos governadores, que são baseadas na Lei 13.979, de 6/2/20, com estado de sítio.
Esta lei traz em sua abertura o seguinte: “a lei dispõe sobre as medidas que poderão ser adotadas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto que se iniciou em 2020”. A Lei 13.979 concede às três esferas de governo o direito de adotar medidas restritivas como isolamento, quarentena e restrição a locomoções, entre muitas outras. Não tem nada a ver com estado de sítio.
“Eu tenho mantido todos os ministros informados do que está acontecendo. E ainda culpam a mim, como se eu fosse um insensível no tocante às mortes. A fome também mata. A depressão tem causado muitos suicídios no Brasil. Onde é que nós vamos parar? Será que o governo federal vai ter que tomar uma decisão antes que isso aconteça? Vamos ter que reagir. Será que a população está preparada para uma ação do governo federal no tocante a isso?”, disse Bolsonaro.
Em seguida, ele justificou sua ameaça: “É para dar liberdade para o povo. É para dar o direito ao povo trabalhar. É para dar direito ao povo trabalhar. Não é ditadura não. Temos uns hipócritas aí falando de ditadura o tempo todo, uns imbecis. Agora o terreno fértil para a ditadura é exatamente a miséria, a fome, a pobreza”, complementou. Por fim, ele completou: “Eu gostaria que não chegasse o momento (de decretar o estado de sítio), mas vai acabar chegando”.
REAÇÕES
A ameaça de Bolsonaro, feita exclusivamente para que mais pessoas morram de Covid no país, gerou imediata reação nos meios políticos e jurídicos. O senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB), primeiro-vice-presidente do Senado, gravou um vídeo para repudiar a declaração de Jair Bolsonaro de que pode decretar estado de sítio no Brasil. “O presidente insiste com o mesmo roteiro de fazer insinuações, de querer intimidar com discursos que nós não aceitaremos”, afirmou o senador em trecho da gravação.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede), líder da oposição no Senado, lembrou que estado de sítio precisa da aprovação do Congresso e provocou: “O presidente da República deveria saber que decretar estado de sítio não é tão fácil como depositar R$ 89 mil na conta da primeira-dama”. A referência do senador Randolfe é aos depósitos no valor total de R$ 89 mil feitos pelo faz-tudo de Flávio Bolsonaro, Fabrício Queiroz, na conta da primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
O senador Angelo Coronel (PSD) comentou: “Para decretar estado de sítio, precisa a assessoria do presidente estudar e mostrar a ele como funciona. Não estamos em 1922. Estamos em 2021 e hoje temos a nossa Constituição Federal. Estudar é bom.” O deputado do Novo Paulo Ganime ironizou: “Estado de sítio para deixar o povo trabalhar?”. Toninho Wandscheer (Pros), deputado que chegou a ser vice-líder do governo, também ficou sem entender: “Estado de sítio para liberar?”
FUX PUXOU A ORELHA
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, ligou para Bolsonaro esclarecer sua fala a apoiadores. Fux deu um puxão de orelhas em Bolsonaro. Disse a ele ter recebido informações desencontradas sobre declarações que teriam mencionado estado de sítio.
O presidente do STF contou que estava no Rio de Janeiro e que gostaria de saber se seria necessário voltar a Brasília. Bolsonaro enfiou o galho dentro e negou a Fux que estivesse falado alguma coisa que significasse decretar estado de sítio, e que apenas questionou, no STF, os decretos de governadores que estabeleceram medidas de restrição.
Assista as ameaças de Bolsonaro