Está cada vez mais difícil para o presidente do Senado segurar a instalação da investigação sobre os desmandos do governo federal no combate à pandemia. O morticínio de brasileiros vai mostrando que é preciso investigar as atitudes de Bolsonaro que, grosso modo, permitiram chegar nesse estágio de descontrole total da virose. Os mortos já contam mais de 3 mil por dia
Com mais de 3 mil mortes/dia por Covid-19 registradas, numa espiral mórbida de falecimentos, com os sistemas público e privado de saúde de quase todos os 26 estados e o Distrito Federal em colapso ou colapsando, a pressão pela instalação da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) se intensifica no Senado.
O pedido para instalação da CPI, encabeçada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), subscrito por outros 29 membros da Casa, ganhou novo destaque nesta terça-feira (23), durante a sessão de debates temáticos no plenário da Casa, quando vários senadores afirmaram que o presidente da República, Jair Bolsonaro, e o Ministério da Saúde estão sendo incompetentes e omissos na condução do combate à Covid-19.
Alguns senadores chegaram até a defender a criação imediata da CPI da Pandemia, mas outros não concordam com a iniciativa.
A senadora tucana Mara Gabrilli (SP) cobrou do governo mudança de postura concreta em relação ao enfrentamento da pandemia. Ela criticou o presidente da República por promover aglomerações rotineiramente desde o começo da pandemia e estimular o consumo de medicamentos sem comprovação científica. Agora, disse a senadora, há milhões de famílias sem saber se serão atendidas, se terão leito de UTI e oxigênio se adoecerem.
“Mais um ministro da Saúde [Marcelo Queiroga] que afirmou que dará continuidade ao que está sendo feito. É sério isso? Vai dar continuidade ao que está sendo feito? Isso significa que a gente vai continuar contando mortes aos montes? É isso que está acontecendo. Queremos ver uma mudança de postura concreta, caso contrário, em vez de discutirmos o próximo ministro da Saúde, teremos que discutir o próximo presidente”, disse a deputada.
Gabrilli desafiou Bolsonaro a visitar um hospital no Distrito Federal nos próximos dias para constatar o grande número de doentes e mortos e a falta de leitos e medicamentos. Na avaliação da senadora, “o Jair já era!”.
NA LINHA DE FRENTE DO DEBATE
Para o senador Fabiano Contarato (Rede-ES), a instalação da CPI da Pandemia é necessária e urgente. Ele afirmou que o presidente Bolsonaro comete crime de responsabilidade ao atentar contra o direito à saúde da população. Ele acredita que os senadores estão devendo uma resposta à população brasileira, pois o governo federal vem se omitindo.
Contarato, junto com Randolfe, lideram o debate para instalação da CPI na Casa. Ambos estão na linha de frente no plano do debate e das iniciativas para que a maioria do Senado Federal pare de querer fingir, diante do caos geral, que está tudo bem e que a CPI ao invés de ajudar vai atrapalhar na solução da crise.
“A resposta é apurar e dar a atribuição da responsabilidade civil, administrativa e criminal para quem, de qualquer forma, tenha concorrido para essa pandemia. Então não basta ficarmos simplesmente se lamentando, com todo dia batendo recorde de mortes”, confrontou o senador capixaba.
“O que nós, no Senado Federal, podemos fazer além de ficar aqui lamentando, ouvindo o que os expositores acabaram de falar? É isso que nós temos como postura? Uma das funções do Senado da República é fiscalizar o Executivo, é apurar a conduta do Executivo, dos ministros de Estado, e nós não estamos aqui cumprindo esse papel”, criticou.
“BOLSONARO ERROU E CONTINUA ERRANDO”
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) afirmou que o presidente da República “errou e continua errando” e se recusa a seguir as recomendações da OMS (Organização Mundial da Saúde).
Ela e outros senadores defenderam de maneira enfática a criação da CPI da Pandemia. Entre eles Tasso Jereissati (PSDB-CE), segundo o qual o presidente Bolsonaro boicota o combate à Covid-19 todos os dias.
“É imperiosa a instalação da CPI. As pessoas que estão no governo precisam saber que serão responsabilizadas pelos crimes que estão cometendo. Elas não podem continuar a agir como se fossem impunes nesse verdadeiro morticínio que está havendo. Todos os dias há uma notícia dele em algum momento boicotando [o combate à pandemia]”, apontou Jereissati.
E acrescentou: “Nem que nós não consigamos responsabilizar ninguém agora, pelo menos a nossa obrigação é a única arma que nós temos é pará-lo, para que pare com esse boicote. O mundo está vendo o que está acontecendo no Brasil”.
O GOVERNO RESISTE
O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), elogiou o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), por (ainda) não ter autorizado a criação da CPI da Pandemia. Para Fernando Bezerra, todo o país precisa se concentrar agora no atendimento à população e na vacinação. A fala do líder é, no mínimo, contraditória, pois o país só chegou nesse quadro porque o governo fez tudo ao contrário do que deveria ter feito.
A resistência do governo é quase uma confissão de culpa. Ora, se não há o que temer ou esconder, por que essa postura negacionista do Planalto? No mínimo, o governo precisa responder a essa que seria uma pergunta inicial.
E outras óbvias, como: por que fez tudo ao contrário do que deveria fazer? Por que não seguiu as melhores práticas de outros países que tiveram êxito no combate à pandemia? Por que negou os protocolos da OMS?
“O Brasil vive a fase mais dramática da pandemia, o que tem exigido dos governos e da sociedade esforços de grandes proporções para conter o contágio acelerado do coronavírus e oferecer atendimento médico às pessoas que manifestam o quadro mais grave da doença”, contemporiza o líder do governo.
“Queria manifestar aqui o meu apoio à sua posição de não instalar a comissão parlamentar de inquérito com o argumento de que nós precisamos enfrentar os problemas e os desafios que estão diante de nós, para que nós possamos, sim, adotar todas as medidas necessárias para que possamos oferecer a perspectiva do melhor enfrentamento da pandemia.” Problemas esses criados pelo presidente da República.
M. V.