Presidente do Cidadania, em entrevista exclusiva ao HP, diz que os movimentos que se dizem religiosos que ingressaram com ação no STF para permitir seus cultos e aglomerações no momento mais crítico da pandemia “falam muito em dízimo”
O Supremo Tribunal Federal (STF) julga nesta quarta-feira (7) ação promovida pela Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure), que trata da abertura dos templos e liberação de cultos em plena pandemia, um dia após o país registrar o maior número de mortes em apenas 24 horas.
Segundo o presidente do Cidadania, ex-deputado Roberto Freire, “não estamos discutindo liberdade religiosa, mas, sim, a posição de igrejas neopentecostais de promoverem aglomeração diante da necessidade de evitá-las por conta da pandemia. O interesse é de igrejas que falam muito de dízimo. Não se trata de liberdade religiosa, que não está em discussão”, sentenciou.
Segundo Freire, “a liberdade religiosa está assegurada no país pela Constituição Federal e não é isso que está sendo discutido”, acrescentando que “o que está em jogo é o combate à pandemia e a defesa da vida que continua ameaçada por aglomerações que acontecem em templos religiosos como em outros ambientes”.
O dirigente ressaltou que “a discussão no momento tem que ser focada nos melhores procedimentos para combater a pandemia e as recomendações sanitárias indicam claramente que aglomerações contribuem com o contágio e as mortes, portanto, o fechamento dos templos não significa um atentado à liberdade religiosa”.
Freire argumentou que o posicionamento dessas igrejas “é uma evidente tentativa de querer burlar a necessária e correta defesa do sistema de saúde pública que se encontra em colapso”, algo com que “o governo federal não tem compromisso, como não tem compromisso com uma luta efetiva contra a pandemia”.
O presidente do Cidadania destacou que “essa não é a posição de várias igrejas sérias que existem no país, igrejas católica, protestantes e também evangélicas, que são sérias e não estão participando desse movimento até em razão de um sentido humanitário, pois é a vida das pessoas que está ameaçada”.
De acordo com Freire, “a expectativa é de que o STF tomará uma decisão no sentido de preservar a vida e não permitir qualquer tipo de aglomeração, uma restrição necessária nesse momento para defender a vida das pessoas”, lembrando que “outros segmentos estão preservando essas restrições e muitos funcionando de forma virtual, inclusive igrejas, portanto, elas podem ter outros meios de se manter em atividade sem promover aglomerações que ameaçam a vida e a saúde das pessoas”.
“Para mim, é uma questão muito pacífica no STF”, asseverou, informando que o Cidadania ingressou com um Mandato de Segurança Coletiva contra a decisão do ministro Kassio Nunes, indicado por Bolsonaro, que deferiu liminar atendendo pedido da Anajure, em razão da “ilegitimidade” da associação para promover esse tipo de ação.
“Essa não é uma questão de interpretação da Constituição. Basta ler a Constituição para saber quem pode e quem não pode entrar com esse tipo de ação, portanto, essa questão poderia ter sido resolvida preliminarmente com a nulidade da autoria da ação”, enfatizou Freire.
O plenário do STF julgará a questão depois que o ministro Gilmar Mendes concedeu uma liminar, em caráter provisório, em sentido oposto à decisão de Kássio Nunes, mantendo os efeitos do decreto do governo de São Paulo que proíbe celebrações religiosas presenciais no Estado, diante do aumento expressivo dos casos e mortes pela Covid-19.
Com as decisões conflitantes entre a sua decisão e a de Nunes Marques, que liberou os cultos, caberá ao plenário do Supremo dar a palavra final sobre a liberação, ou não, dos cultos e missas durante a pandemia.
A liminar de Kássio Nunes foi contestada também pela Frente Nacional de Prefeitos, cujo presidente, Jonas Donizette, afirmou que “essa flagrante contradição atrapalha o enfrentamento à pandemia em um país federado e de dimensões continentais como o nosso”, salientando que a liberação de cultos e missas no país ocorre no momento mais crítico da pandemia.
TEM IGREJA QUE SÓ LIGA PARA DÍZIMO, DIZ PASTOR
Sobre o assunto que será julgado em caráter definitivo pelo STF, o reverendo Augustus Nicodemus Lopes, da Igreja Presbiteriana de Recife e ex-chanceler da Universidade Mackenzie, presbiteriana, afirmou que nem todas as denominações evangélicas têm “preocupação cívica” ao pleitear que templos funcionem no auge da crise.
“Elas estão preocupadas porque têm um sistema de arrecadação que depende do [culto] presencial. Vão dizer o que for necessário para defender igrejas abertas”, argumentou,
O sacerdote paraibano lança, pela editora Mundo Cristão, “O Que a Bíblia Fala Sobre Dinheiro“. O pastor, considerado um dos mais influentes das chamadas igrejas evangélicas históricas, discorre sobre lockdown, dízimo, Jair Bolsonaro e a Teologia da Prosperidade que predomina entre congregações neopentecostais, que ele prefere não chamar de igrejas.
MAC