BORBA TOURINHO
(HP 29/04/2015)
“Está hoje provado que não necessitamos
do capital estrangeiro para industrializar
o nosso petróleo. São os fatos
que se encarregam dessa prova.
Fomos os iniciadores da indústria, ora
em adiantada execução. Descobrimos
o combustível, montamos refinarias,
construímos oleodutos e adquirimos
frota de petroleiros. Tudo isso se fez
com recursos nossos, e também contratados,
e máquinas que adquirimos.
Agora que tudo está em boa marcha,
não necessitamos de convivas para a mesa posta”
(Discurso do deputado Arthur Bernardes,
sessão de 6 de junho de 1952)
“Gostaria, agora, de examinar a natureza
do empreendimento petrolífero. Ora,
o petróleo é, tipicamente, por natureza,
empreendimento monopolista e de integração.
Não pode ser, com êxito técnico,
em condições econômicas,explorado
separadamente. As fases que ele compreende,
como pesquisa, lavra, refino e transporte,
devem obedecer a uma integração perfeita.
Outro aspecto que convém notar é o seguinte:
não é possível confundir o problema
do petróleo com os demais problemas.
O petróleo tem tal influência na vida econômica
e financeira do mundo, que as nações prevenidas
não abrem mão de sua posse nem
de seu controle. O que é verdade para a
indústria siderúrgica, o que é verdade para
outras indústrias, para a indústria de tecidos,
para a indústria de calçados não é, absolutamente,
verdade para a indústria do petróleo
(Discurso do deputado Euzébio Rocha,
sessão de 9 de junho de 1952)
De 31 artigos constava o projeto nº 1.516, de 1951, enviado à Câmara dos Deputados pelo então presidente da República, sr. Getúlio Vargas (Mensagem nº 469), que dispunha sobre a criação da Petrobrás. O projeto de Vargas admitia a existência de empresas privadas com a mesma finalidade, muito embora, em sua Mensagem, afirmasse categoricamente:
“É fora de dúvida, como o demonstra a experiência internacional, que, em matéria de petróleo, o controle nacional é imprescindível. O governo e o povo brasileiros desejam a cooperação da iniciativa estrangeira no desenvolvimento econômico do país, mas preferem reservar à iniciativa nacional o campo do petróleo, sabido que a tendência monopolística internacional dessa indústria é de molde a criar focos de atritos entre povos e entre governos. Fiel, pois, ao espírito nacionalista da vigente legislação do petróleo, será essa empresa genuinamente brasileira, com capital e administração nacionais”.
Também o projeto de Vargas não estatuía a condição de brasileiro nato para ser acionista da empresa que propunha criar. Reconhecia, porém, que havia o perigo da ação de grupos monopolísticos de fonte estrangeira ou mesmo nacional, através da participação do capital privado.
Um mês depois, isto é, a 28 de janeiro de 1952, o deputado Euzébio Rocha, do Partido Trabalhista Brasileiro, apresentava projeto, que recebeu o número 1.595, reajustando o de nº 1.516. Naquela proposição, subscrita por outros parlamentares, o parágrafo 3º do artigo 2º, discretamente, admitia um regime monopolista, ao estatuir:
“Não serão instituídas quaisquer outras organizações nem feitas novas autorizações ou concessões com objetivos idênticos, correlatos ou afins aos da Sociedade e suas subsidiárias”.
Simultaneamente com o projeto nº 1.516, o presidente Vargas, em outra Mensagem, fazia encaminhar ao Congresso o de nº 1.517, que provia recursos ‘‘para o programa do petróleo e para o Fundo Rodoviário Nacional”, estabelecendo o imposto único de importação para consumo, de derivados de petróleo.
Ambos os projetos de Vargas e, posteriormente, o do deputado Euzébio Rocha, foram distribuídos às Comissões de Constituição e Justiça; de Economia e Finanças; de Transportes, Comunicações e Obras Públicas; de Segurança Nacional e de Finanças, onde foram exaustivamente analisados e modificados, enquanto que, aguardando sua ida a plenário para discussão e votação, deputados de várias correntes políticas debatiam as teses do monopólio estatal e da livre empresa.
Em maio de 1952 o deputado Gustavo Capanema, líder do Governo, apresentou requerimento de urgência, que foi aprovado para discussão e votação dos projetos 1.516 e 1.517. No decorrer dos debates em torno daquele requerimento os principais partidos políticos anteciparam a posição que iriam assumir na votação da lei criando a Petrobrás, antes mesmo do pronunciamento dos órgãos técnicos, tendo os srs. Arthur Bernardes, como líder do Partido Republicano, e Bilac Pinto, líder da União Democrática Nacional (UDN), criticado a solução proposta por Vargas – sociedade de economia mista -, defendendo a instituição do monopólio estatal absoluto.
Segundo crença de muitos, a proposição inicial de Vargas, não radicalizando o monopólio, era hábil manobra destinada precisamente a acirrar as contradições partidárias das oposições, que seriam assim levadas ao estatismo, afinal consagrado na lei sancionada sem vetos, o que faz corroborar essa suposição.
O sr. Bilac Pinto, em veemente discurso, que marcou definitivamente os rumos que seriam adotados no projeto, anunciou o propósito de a UDN propugnar no sentido de que a pesquisa, a lavra, o transporte especializado e a exploração industrial do petróleo, fossem empreendidos “por uma empresa genuinamente estatal, sem a participação de acionistas particulares, de quaisquer espécies”, sustentando:
“Estamos seguros de que a Câmara será sensível aos nossos argumentos, todos eles inspirados em razões de ordem econômica e política, cuja procedência nos parece irrecusável. Iremos iniciar hoje a discussão e a votação de uma lei histórica, que deve marcar o advento, em poucos anos, da emancipação econômica do Brasil, o fortalecimento da segurança nacional e um ciclo de prosperidade inigualável.
“A sociedade de economia mista, por maiores que sejam as cautelas do legislador, deixará um flanco aberto à penetração de interesses antibrasileiros, que somente se empenharão em dificultar ou impedir a nossa autossuficiência em matéria de combustíveis líquidos”.
NO PLENÁRIO
A 6 de junho de 1952 foi anunciada na Câmara dos Deputados a 1ª discussão do Projeto nº 1.516/51, que se prolongou até 2 de julho. Ao mesmo foram anexados os de números 1.595 (Euzébio Rocha) e 1.517, que instituía o imposto único de importação para consumo de derivados de petróleo. Iniciando os debates, o deputado Bilac Pinto, líder da União Democrática Nacional (UDN), pronunciou um discurso reiterando seu pensamento e o da maioria de seu partido, contrário àquele projeto e defendendo a tese do monopólio estatal.
Foi nessa fase que as diversas correntes políticas chegaram a um denominador comum.
Surgiu, assim, na sessão do dia 5 de setembro, com a fusão das emendas apresentadas e aprovadas, a redação do projeto n.° 1.516, elaborado peia Comissão de Constituição e Justiça, do qual foi ainda relator o deputado Antônio Balbino, para discussão e votação pelo plenário. Novas emendas recebeu o projeto, que passou a ter o número 1.516-D, com pareceres favoráveis das comissões técnicas, até que teve sua votação final iniciada no dia 11, prolongando-se até o dia 25 do mesmo mês, quando, já com o número 1.516-E, sua redação final foi definitivamente aprovada. No dia 30, era então enviado ao Senado.
NO SENADO
Enquanto o projeto que criava a Petrobrás tramitava na Câmara dos Deputados, o problema do petróleo era debatido no Senado, através de pronunciamentos de vários oradores, na hora do expediente.
No dia 18 de junho o Senado aprovou a redação final do projeto, enviando-o, a seguir, à Câmara que, no dia 14 de julho, constituiu uma Comissão Especial, presidida pelo deputado Menezes Pimentel e relator o deputado Lúcio Bittencourt, para dar parecer às modificações nele introduzidas.
No dia 10 de setembro, teve início a discussão única das emendas apresentadas pelo Senado, a qual se prolongou até o dia 15. O plenário aprovou o trabalho da Comissão Especial e as emendas aceitas incorporaram-se ao texto definitivo do projeto, cuja redação final foi aprovada no da 21 de setembro de 1953. Dois dias depois, pelo ofício nº 1.578, a Câmara dos Deputados enviava o projeto nº 1.516-H à sanção presidencial.
Sancionado sem veto, pelo sr. Getúlio Vargas, transformou-se na Lei nº 2.004, de 3 de outubro de 1953, coroando assim os esforços de todos quantos, nas praças públicas, nas entidades de classe, nas associações culturais e afinal no parlamento, vinham lutando anos a fio pela implantação de uma política petrolífera no Brasil.