“Tem que mudar o objetivo da CPI” (da Covid-19), disse Bolsonaro em telefonema ao senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO). “Se não mudar, a CPI vai simplesmente ouvir o Pazuello, ouvir gente nossa, para fazer um relatório sacana”, acrescentou o capitão cloroquina. “O fato é gravíssimo”, alertou Rodrigo Maia
Jair Bolsonaro telefonou para o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO), no domingo (12), para pressionar o Senado a dirigir as investigações da CPI da Pandemia contra os governadores e prefeitos.
A CPI foi originalmente solicitada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede) para investigar as graves omissões e atitudes irresponsáveis do governo federal diante da crise sanitária que está levando ao colapso os hospitais e já matou mais de 350 mil pessoas no país.
O senador revelou, no próprio domingo, o conteúdo de sua conversa com Bolsonaro ao telefone, que foi gravada por ele. Em um diálogo de cerca de seis minutos, Bolsonaro pressionou para que o alvo da CPI fosse mudado para atingir governadores e o STF. Ele reclamou da investigação pelo fato dela estar mirada para as omissões criminosas do governo federal. Bolsonaro exigiu que governadores e prefeitos sejam chamados para prestar satisfações.
Ele também pressionou para que ministros do STF fossem atingidos, inclusive com pedido de impeachment de integrantes da Corte. Bolsonaro pediu explicitamente a Kajuru que houvesse uma pressão sobre o Supremo Tribunal Federal (STF) para a abertura de processo de impeachment contra qualquer um dos ministros. A intenção de Bolsonaro é que, pressionado, o Tribunal poderá recuar da decisão de determinar ao presidente do Senado a instalação da CPI que investigará seus crimes na Pandemia.
Durante a conversa, Bolsonaro tentou eximir seu governo da responsabilidade pelas mortes por coronavírus no país – que chegaram, neste final de semana, a 350 mil. Ele não só tentou tirar o corpo fora da tragédia que provocou como acusou os governadores pela crise e as mortes. “Vai morrer gente no Brasil – agora, podia morrer menos gente se os governadores e prefeitos todos pegassem o recurso e aplicassem em postos de saúde e hospitais”, disse ele, insinuando, sem nenhuma prova, que governadores e prefeitos estão desviando recursos que deveriam ser usados na pandemia.
“Tem que mudar o objetivo da CPI – tem que ser ampla”, diz Bolsonaro ao senador. “O objetivo do autor, que eu não sei quem é, é investigar omissões do governo federal no tratamento da Covid”, insiste Bolsonaro. “[A CPI] Iria para cima de mim.” O presidente disse acreditar que a CPI poderá trazer danos ao seu governo: “Se não mudar, a CPI vai simplesmente ouvir o Pazuello, ouvir gente nossa, para fazer um relatório sacana”, disse.
“Você tem de fazer do limão uma limonada. Tem de peticionar o Supremo para colocar em pauta o impeachment (de ministros) também”, afirmou o Bolsonaro ao senador. “Sabe o que eu acho que vai acontecer, eles vão recuperar tudo. Não tem CPI… não tem investigação de ninguém do Supremo”, afirmou Bolsonaro.
O senador Jorge Kajuru respondeu que já tinha entrado com pedido de afastamento do ministro do STF, Alexandre de Moraes. “Você é dez”, comemorou Bolsonaro. “Nós dois estamos afinados. CPI ampla e investigar ministros do Supremo. Ponto final”, disse ele ao senador.
A CPI da Pandemia será lida nesta terça-feira (13), às 16h, no plenário do Senado Federal. A sua abertura foi determinada pelo ministro do STF, Luís Roberto Barroso. Ele atendeu a um pedido de liminar dos senadores Alessandro Vieira (Cidadania) e do próprio Jorge Kajuru, também do Cidadania. Ela será apreciada no plenário do Supremo na quarta-feira (14), mas a tendência é que seja confirmada, principalmente depois dos seguidos ataques de Bolsonaro à decisão de Barroso.
Agora, com a divulgação do telefonema entre Bolsonaro e Kajuru, onde ficam claras as ameaças e ofensas do Planalto a governadores e ao Supremo, diversos parlamentares estão afirmando que a CPI tornou-se mais urgente ainda e mais necessária do que nunca. O ex-presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou em suas redes sociais que a conversa entre os dois “é gravíssima” e o “possível crime do presidente deve ser apurado, inclusive, pela própria CPI”.
Bolsonaro também usou as redes sociais e conversas com apoiadores no fim de semana, no Alvorada, para seguir agredindo os governadores e esculhambar com o STF, chamando todos de “comunistas”. Na postagem, sem citar em nenhum momento o enfrentamento da pandemia que já matou mais de 350 mil pessoas no país, o capitão cloroquina elegeu o “comunismo” como inimigo a ser combatido.
Num discurso cheirando a mofo e repetido em seguida às fracassadas “Marchas com Deus pela Liberdade”, pró-Bolsonaro, realizadas neste domingo, reunindo meia dúzia de fanáticos, ele revelou que considera todos os seus oponentes, no Congresso e no STF, como “comunistas”. “Hoje você está tendo uma amostra do que é o comunismo e quem são os protótipos de ditadores, aqueles que decretam proibição de cultos, toque de recolher, expropriação de imóveis, restrições a deslocamentos, etc”, afirmou.
Apesar dele incluir a expropriação de imóveis na lista, numa tentativa ridícula de alarmar a população, nenhum governador ou prefeito adotou a medida entre as estratégias para conter o vírus. Na verdade, quem está realmente expropriando as casas, a comida, a renda e, até, a vida de milhões de brasileiros é ele próprio, com o seu negacionismo diante da pandemia e o seu desastroso desgoverno pró-banqueiros, cada vez mais repudiado pela população.
Muitos já reagiram às manifestações de Bolsonaro dirigidas ao Senado e ao Supremo, entre eles o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia: “o fato é gravíssimo”.
S. C.