Esquema criminoso do Planalto, apelidado de ‘bolsolão’, desviou R$ 3 bilhões para a farra do toma-lá-dá-cá. Dinheiro poderia ter sido usado para comprar vacinas
Jair Bolsonaro se destemperou com a notícia que o Estadão deu do orçamento secreto criado por ele para subornar parlamentares. “Inventaram que eu tenho um orçamento secreto agora. Tenho um reservatório de leite condensado, 3 milhões de latas. Eles não têm o que falar. Como um orçamento foi aprovado, discutido por meses e agora apareceu R$ 3 bilhões? Só os canalhas do Estado de S. Paulo para escrever isso aí”, afirmou Bolsonaro.
Além de desviar os R$ 3 bilhões para fazer uma verdadeira orgia com verba pública sem nenhum controle, Bolsonaro foi denunciado também por ter propiciado compras superfaturadas com o dinheiro fartamente distribuído. No esquema ilegal, os parlamentares são os responsáveis ocultos por determinar onde a verba separada por Bolsonaro deve ser utilizada.
Os R$ 3 bilhões estavam numa rubrica, chamada de RP9, um tipo de emenda parlamentar em que o parlamentar decide sem ninguém saber, o destino da verba. Este esquema foi criada pelo Congresso em 2020 mas foi vetada pelo próprio Bolsonaro. Agora, na calada da noite, ele desenterra a emenda que ele mesmo vetou para subornar e chantagear parlamentares e obter os votos nas propostas do governo.
Quando vetou o projeto que previa esse tipo de emenda, Bolsonaro alegou que permitir a alocação dessa verba por ordem de congressistas contraria o “interesse público”. Na conversa com os apoiadores na manhã desta terça-feira, (11), Bolsonaro se esquivou de assumir a responsabilidade pelo orçamento secreto e disse que se a verba federal foi aplicada de forma irregular a culpa é dos gestores locais.
Dos R$ 3 bilhões que o Planalto destinou para o orçamento clandestino, como revelou o Estadão, metade foi para obras de asfaltamento em redutos eleitorais de apaniguados de Bolsonaro. Parte desse dinheiro do ‘bolsolão’ foi dirigida por parlamentares para a Codevasf. O Tribunal de Contas da União (TCU) identificou irregularidades nas licitações realizadas pela estatal entre novembro e dezembro para pavimentação. Os valores dos pregões questionados são de R$ 533 milhões.
Os esquemas burlaram os órgãos de controle. Um caso emblemático da roubalheira é o do deputado Lúcio Mosquini (MDB-RO). O governo aceitou pagar R$ 359 mil num trator que, pelas regras normais, somente liberaria R$ 100 mil dos cofres públicos. No total, o deputado direcionou R$ 8 milhões. Também foram encontrados superfaturamentos nas compras de tratores.
Os 101 ofícios que vieram a público mostram que os recursos foram usados sem nenhum controle e tiveram critérios eleitoreiros. Nos últimos três meses foram distribuídos de acordo com o posicionamento do parlamentar em relação a projetos do governo. A medida, além de ilegal, atropela orçamento da União e dificulta o controle do Tribunal de Contas da União (TCU) e da sociedade. Os acordos para direcionar o dinheiro não são públicos, e a distribuição dos valores atende a critérios eleitorais. Só ganha quem apoia o governo.
Outro caso que revela a dimensão do esquema é o dos deputados do Solidariedade Ottaci Nascimento (RR) e Bosco Saraiva (AM). Eles direcionaram R$ 4 milhões para Padre Bernardo (GO). Se a tabela do governo fosse considerada, a compra sairia por R$ 2,8 milhões. Eles disseram ao Estadão que atenderam a um pedido de Nascimento, seu colega de partido. Por sua vez, Nascimento afirmou ter aceito um pedido do líder da legenda na Câmara, Lucas Vergílio (GO).