O ministro está numa “saia justa” diante dos procedimentos adequados para minorar as linhas de contágio — uso de máscara e álcool em gel e distanciamento social — e o presidente da República que faz o oposto
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga retorna à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do Senado, porque mentiu no primeiro depoimento dele tomado pela comissão em 6 de maio. Agora, ele volta um mês depois, na próxima terça-feira (8), para dar novas explicações sobre vários temas que surgiram em outras oitivas.
Diante disso, o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), em resposta ao governista Marcos Rogério (DEM-RO), disse que o ministro vai ser ouvido novamente pela comissão porque “mentiu” no primeiro depoimento.
A discussão ocorreu na última quarta-feira (2), durante a oitiva da médica infectologista Luana Araújo. Ao criticar Queiroga, Aziz afirmou, também, que o ministro terá de explicar por que concordou com a decisão do presidente Jair Bolsonaro de realizar a Copa América no Brasil no momento em que o País começa a enfrentar uma terceira onda da pandemia.
Ele será inquirido, ainda, em razão da insistência do chefe do Planalto de comparecer, sem máscara, a manifestações que causam aglomerações. Marcos Rogério argumentou que Queiroga não poderia ser convocado a depor na próxima semana porque “está na linha de frente do combate à covid”.
Aziz rebateu: “Está não, está não”. O senador governista insistiu, dizendo que “o apelo que faço à vossa excelência é que deixe o ministro trabalhar”. Nesse momento, bastante irritado, Aziz respondeu: “Sabe o que ele [ministro] estava fazendo ontem [terça-feira]? Anunciando a Copa América ao lado do presidente”.
NOVAS INTERROGAÇÕES
A maioria da CPI, entre os integrantes titulares, é formada por senadores independentes ou de oposição, o chamado G7. Eles e os demais membros do colegiado investigativo querem novos esclarecimentos sobre os seguintes tópicos:
Evento político de Bolsonaro sem máscara e sem distanciamento. Em 23 de maio, Bolsonaro fez passeio de moto pelo Rio de Janeiro. Sem máscara, ele foi seguido por milhares de motociclistas. No fim do passeio, o presidente subiu em carro de som ao lado do ex-ministro Eduardo Pazuello, ministros e parlamentares da base no Monumento aos Pracinhas, no Aterro do Flamengo. Eles discursaram para apoiadores que estavam muito próximos e sem máscara.
O evento político é a principal motivação da reconvocação de Queiroga. Os senadores querem saber por que o presidente da República contraria as recomendações do Ministério da Saúde de combate à pandemia, como distanciamento social e uso de máscara. O relator Renan Calheiros (MDB-AL) chegou a falar em “jogo macabro de Bolsonaro do qual o ministro Queiroga se torna cúmplice porque se omite diante do morticínio”.
O motivo da não efetivação da infectologista Luana Araújo no ministério da Saúde. Durante o depoimento da médica infectologista Luana Araújo, a quarta-feira (2) à CPI, os senadores questionaram várias vezes sobre o motivo de sua nomeação não ter saído, e ela disse que não foi informada. Os senadores mencionaram, então, que questionariam o ministro sobre os motivos. O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) disse que iria encaminhar ofício para estes esclarecimentos.
A realização da Copa América. Desde que Bolsonaro anunciou que o Brasil sediaria a Copa América, os senadores fizeram críticas públicas à realização do torneio. Renan fez apelo a Neymar para não entrar em campo e o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse que o governo federal demorou meses para responder à Pfizer e ao Butantan sobre ofertas de vacinas, mas horas à Conmebol para a realização do torneio.
O fato de a Conitec não ter se manifestado ainda sobre uso de cloroquina no tratamento da Covid-19. Durante o depoimento da médica Luana Araújo, o presidente da CPI mencionou a Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS) e disse que era importante questionar o ministro sobre o fato da comissão não ter emitido ainda nota técnica sobre a ineficácia da cloroquina no tratamento da Covid-19.
As ações de publicidade do governo sobre a Covid-19. Os membros da CPI já falaram que querem mais respostas sobre as ações de publicidade sobre a Covid-19, especialmente para orientação da população sobre uso de máscaras, higiene das mãos e distanciamento social, além da campanha de vacinação.
A posição do ministério sobre os decretos estaduais. A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), que não é membro da CPI, mas acompanha as discussões e representa a bancada feminina (as senadoras fazem rodízio), citou questões que devem ser levadas ao ministro Queiroga. Além de algumas já citadas, como a avaliação sobre o chamado “tratamento precoce”, a decisão do Brasil sediar a Copa América e a secretaria que seria comandada pela médica Luana Araújo, a senadora incluiu questionamentos sobre o posicionamento do ministro a respeito dos decretos estaduais, sobre a vacinação, e sobre as manifestações da população.
NOVOS DEPOIMENTOS
Além do ministro da Saúde que vai depor na próxima terça-feira estão previstas as seguintes oitivas:
- quarta-feira (9): Élcio Franco (ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde). Ele era o braço-direito do ex-ministro Eduardo Pazuello na pasta.
- quinta-feira (10): Wilson Lima (PSC) (governador do Amazonas). No depoimento, por óbvio, o governador terá de explicar a crise do oxigênio pela qual o estado passou no início do ano.
- sexta-feira (11): Cláudio Maierovitch (ex-presidente da Anvisa e da Fiocruz) e Nathalia Pasternak (pesquisadora da USP).
- terça-feira (15): Marcellus Campêlo (secretário de Saúde do Amazonas). Os senadores, novamente, irão questionar a crise de abastecimento de oxigênio no Estado.
- quarta-feira (16): Wilson Witzel (ex-governador do Rio de Janeiro). Ele sofreu impeachment após acusação de comandar esquema de corrupção na construção de hospitais de campanha.
- quinta-feira (17): Carlos Wizard (empresário integrante do chamado “gabinete paralelo”). Ele é apontado como conselheiro do presidente Jair Bolsonaro na pandemia, um dos líderes do “gabinete”.
M. V.