Não houve política de contenção da virose. Ao contrário, afirma a microbiologista
A microbiologista Natalia Pasternak, ouvida pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid-19, nesta sexta-feira (11), no Senado, disse que 375 mil mortes poderiam ter sido evitadas no Brasil caso as medidas de contenção do novo coronavírus tivessem sido tomadas de forma mais efetiva e eficaz. Não houve política de contenção da virose. Ao contrário.
Na ocasião, a pesquisadora citou estudo publicado na revista científica The Lancet, realizado pelo epidemiologista Pedro Hallal, professor da Escola Superior de Educação Física da UFPel (Universidade Federal de Pelotas) e coordenador do Epicovid-19, maior estudo, até o momento, epidemiológico sobre a doença no País.
“Três de cada quatro mortes teriam sido evitadas, se o Brasil estivesse na média mundial de controle da pandemia, ou seja, quando atingirmos 500 mil mortes, isso quer dizer que 375 mil mortes poderiam ter sido evitadas com o melhor controle da pandemia”.
NÃO HOUVE E NÃO HÁ COMPANHA DO GOVERNO
A microbiologista também afirmou que o governo federal e o Ministério da Saúde nunca coordenaram medidas para combater a contaminação de Covid-19 no Brasil.
“As medidas preventivas precisam ser efetivamente implementadas, de preferência, com uma campanha coordenada pelo governo federal e pelo Ministério da Saúde, para que estado e municípios tenham diretrizes áreas de como proceder e, principalmente, para poder proceder em conjunto”, disse ela.
“Essas ações, infelizmente, nunca foram coordenadas, nunca foram centralizadas no governo federal ou no Ministério da Saúde, bem pelo contrário, não tem diretrizes claras, Estados e municípios foram deixados à própria sorte e isso pode parecer democrático, mas, na verdade, é só falta de comando central e de vontade política”, acrescentou a pesquisadora.
PLANEJAMENTO MACRO
O sanitarista e ex-presidente da Anvisa Cláudio Maierovitch, ouvido como convidado nesta sexta-feira pela CPI, defendeu que os militares não deveriam estar em postos de comando do Ministério da Saúde durante uma pandemia.
“É muito diferente uma experiência no campo militar, que pode ser extremamente complexa, não conheço, para levar suprimentos para tropas, para deslocar equipamentos, deslocar armas, de uma experiência no campo da saúde pública.”
“Eu não me atreveria, apesar de ter uma longa experiência, de mais de 35 anos, na saúde pública, não me atreveria a fazer uma gestão de suprimento militar em momento de guerra. Acho que as pessoas que não têm a experiência de trabalhar em momento de epidemia, em momento de crise sanitária, não deveriam ser encarregadas de tomar decisão e comandar as operações neste caso”, questionou o médico.
E completou: “Não é assunto para amador, para quem nunca fez isso na vida. Muitas vezes, decisões que tem que ser tomadas instantaneamente. Senão tomadas implica na falência do programa [de imunização]. Nós só temos programas de imunização pujantes no Brasil porque temos pessoas capazes de fazer isso. Infelizmente, uma quantidade de pessoas capazes tem se reduzido na estrutura do Ministério da Saúde”, observou.
Maierovitch também destacou a importância de haver um planejamento macro para o Brasil enfrentar a pandemia da Covid-19, obtendo melhores resultados.
“O plano deve prever a organização, de que maneira o sistema de saúde deve funcionar para responder à pandemia. Um plano, naturalmente, tem que conter um planejamento em relação a insumos. Aquilo que a gente assistiu: ‘falta oxigênio, falta kit de intubação, falta profissionais, etc’. Vai faltar tudo se não houver um plano”, afirmou Maierovitch.
“IMUNIDADE DE REBANHO”
O sanitarista ainda comentou sobre a ideia de “imunidade de rebanho”, fazendo uma crítica não apenas à ideia de imunizar a população pela doença, sem vacina, mas também ao próprio termo, que faz referência a animais.
Por sua vez, a pesquisadora Natalia Pasternak iniciou seu depoimento defendendo as evidências científicas e se posicionando contra o negacionismo.
“Não se trata de ignorância inocente. É mentir em nome de uma agenda política ou ideológica. Ou encontrar desculpas para não fazer nada. Quando Jair Bolsonaro nega a pandemia, nega a ciência, e nega o direito à vida dos brasileiros, nega consensos científicas e nega direitos humanos. Mente. Negacionismo é a propagação intenção da mentira. E não devemos permitir que negacionistas ocupem posições de poder”, afirmou a pesquisadora no final da fala dela, antes das perguntas, ao se apresentar aos senadores.
ORQUESTRAÇÃO DO NEGACIONISMO
A pesquisadora acusou o governo federal e o Ministério da Saúde de orquestrarem o negacionismo, sendo responsáveis por mortes no Brasil durante a pandemia da Covid-19.
Sobre o uso do “Kit Covid” para o chamado “tratamento precoce”, a microbiologista destacou que é um problema que de gasto de dinheiro público sem melhorias para a população, já que os medicamentos [cloroquina, azitromicina e outros] enviados aos municípios não possuem eficácia comprovada contra Covid-19.
Pasternak destacou que a ciência não é uma verdade absoluta, mas que deve estar sendo verificada o tempo todo. “Ciência não é uma questão de opinião. Não é como eu enxergo versus o que você enxerga. Não é uma visão do mundo. Alguém desenhou um número no chão, ou é 6 ou é 9. Não é como eu vejo, é o que desenharam. E para descobrir o que desenharam, a gente usa um método”.
Natalia Pasternak tornou-se figura pública relevante desde o início da pandemia da Covid-19. Em julho de 2020, publicou artigo em que afirmou que havia evidências científicas de que o tratamento precoce não era eficaz contra a doença. No mesmo mês, o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, emitiu nota promovendo o uso de cloroquina e hidroxicloroquina, baseando-se, nas palavras de Pasternak, em “evidências fracas”.
Pasternak e Maierovitch são especialistas favoráveis às medidas de distanciamento social e ao uso de máscaras — bem como defensores das vacinas e contrários a recomendação de remédios sem comprovação científica.
M.V.