O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), ex-governador do seu Estado, e, atualmente, membro da CPI da Pandemia, afirmou que o impeachment de Bolsonaro, diante do escândalo de corrupção, no caso da Covaxin, deixou de ser uma reivindicação sem base na realidade para ser uma possibilidade bem concreta – e, a rigor, uma necessidade.
“A situação, que já estava muito grave, passou para gravíssima”, declarou Tasso, em entrevista à revista Crusoé. “Se fosse apenas uma negligência ou pensamento diferente, no caso da imunidade de rebanho, entre outros, já seria muito grave pelas consequências que geraram, como a morte de mais de 500 mil pessoas no país.
“Se essas condições todas ficarem provadas e chegarmos à conclusão que houve interesse escuso por trás da compra das vacinas indianas, e os indícios já são fortes, pode chegar a um desfecho traumático.
“A gente sabe hoje por informações, documentos e vídeos que o presidente tinha alguma interferência nos erros e omissões durante a condução da pandemia.
“Agora, o que vemos com certeza é um procedimento ilegal. E com o conhecimento do presidente, o que torna o episódio mais grave ainda.
“Todo governante costuma dizer ‘eu não sabia’, ‘aconteceu à minha revelia’, mas esse caso andou com tanta rapidez que a desconfiança de corrupção chegou direto à pessoa do presidente da República. Sem dúvida, se isso tudo ficar comprovado, é o caso de medidas extremas”.
NOVAS CONDIÇÕES
“Eu sempre disse em conversas com outros políticos e mesmo em entrevistas que eu não achava que haveria condições para o impeachment agora.
“Mas a última defesa do presidente diante da sociedade era a questão da corrupção. Dizia: ‘Ah, foi feito isso, foi feito aquilo, mas não tem corrupção’. Essa era a alegação. Até mesmo na CPI, quando a gente chega a determinadas conclusões, seus defensores vão lá e dizem: ‘Mas não rouba’.
“Esse fato novo derruba o último pilar. A casa desmorona. O clima na sociedade vai mudar inteiramente. Até a questão moral dos defensores do presidente vai ficar enormemente enfraquecida”.
À pergunta: “A tese de ‘deixar o presidente sangrar’ até o fim do governo para chegar cambaleante nas eleições ainda é defendida por setores da oposição, inclusive pelo PT. Ela perde força agora?”, respondeu o senador cearense:
“Não vejo isso como uma questão eleitoral. É uma questão fundamental para o país. Para o futuro próximo e de longo prazo. Estamos falando de mortes, 500 mil mortes.
“Existe um sentimento anticorrupção tão grande na sociedade, devido à longa tradição de corrupção de governos anteriores, que essa questão passou a ser muito forte na população.
“A decepção desses segmentos, até entre os que votaram em Bolsonaro, e não estou falando dos fanáticos, vai ser tão grande que esse pilar desaba e não há como levantá-lo novamente. Vai ser uma decepção com o candidato em quem esse eleitor acreditou.
“Até hoje no meio político, e falo da Câmara, Senado, governadores, partidos políticos, ninguém havia levado a sério a possibilidade do impeachment. Nunca se discutiu isso a sério porque Bolsonaro ainda é sustentado na opinião pública, em parte por esse discurso de que ele não rouba. Aparentemente é sustentado pelas Forças Armadas, e ele faz questão de exibir esse apoio, falando em “meu Exército”, e nas polícias militares, um setor da sociedade onde ele tem mais penetração, e por ter uma militância própria violenta. Essas condições não levariam a um ambiente positivo para o impeachment.
“Agora, do ponto de vista da opinião pública, tem essa questão moral. O que se imaginava até então era que ele é desajeitado, grosseiro, mas não cometia malfeitos.
“Com isso mudando, temos outro cenário. E a solução, nesse caso, tem que ser pela Constituição. Não há outra. A saída, se os indícios se confirmarem, é o vice-presidente assumir”.
CLIMA SUFOCANTE
E, à pergunta “O sr. já presenciou um cenário político tão delicado como esse no Brasil?”:
“Não. Nada nem parecido. Aliás, nunca esperei que um homem com a mentalidade e o primarismo do Bolsonaro chegaria à Presidência da República. E com essas atitudes. O que ele faz, o que diz, como ele age, como se relaciona com amigos, adversários políticos, imprensa, é tudo com muita brutalidade.
“Posso dizer que é o pior presidente da história do Brasil. O governo não é orgânico. São ilhas ao redor de um chefão do qual todos têm medo, e que não tem um projeto de país, mas um projeto de poder.
“Para piorar, temos um ambiente de ódio, muito por causa das redes sociais. Não se discute nada profundamente. Nem sobre economia, sobre educação e outros temas importantes. Chegamos ao ponto de debater o que é e o que não é ciência.
“E tudo sem argumento e com muito ódio. Perdi amigos de longa data depois que passei a criticar mais fortemente o governo. Esse clima, eu nunca vi. E é desse clima que devemos sair”.