A coordenadora do Programa Nacional de Imunizações (PNI) do Ministério da Saúde, Francieli Fontana, pediu exoneração do cargo na última quarta-feira (30).
A decisão teria partido da própria servidora, que deixa o posto afirmando que a postura adotada pelo presidente Jair Bolsonaro no enfrentamento da pandemia prejudicou o andamento e a estratégia de vacinação contra a Covid-19 no Brasil.
“Isso divide a opinião pública. Quando se tem certeza de que vacina é o meio mais efetivo para conter a epidemia junto com as medidas não farmacológicas, e tem comunicação diferente do líder da nação, isso traz prejuízo para a campanha de vacinação”, comentou em entrevista à “Folha de S.Paulo”.
Ela afirmou que declarações que colocam as vacinas em dúvida, colaboram para enfraquecer o programa, reconhecido por uma trajetória de sucesso nos últimos anos.
Segundo as informações divulgadas pela “Folha”, Fontana nega ter deixado o posto em razão das investigações da CPI da Covid.
A ex-coordenadora considerou que a campanha de imunização enfrenta dificuldades devido à falta de doses e vê em declarações de Bolsonaro prejuízos à estratégia de vacinação no país.
Há alguns dias, os senadores da Comissão Parlamentar de Inquérito aprovaram a convocação de Francieli Fontana, com o intuito de fazer uma acareação com a médica Luana Araújo sobre recomendações adotadas para a vacinação de gestantes.
A coordenadora do PNI teria sido responsável por editar nota técnica aos Estados, recomendando a vacinação de gestantes que tinham recebido a primeira dose da AstraZeneca, com qualquer vacina que estivesse disponível, sem nenhuma comprovação de segurança ou eficiência.
Seu sigilo telefônico também foi quebrado a pedido da CPI. A defesa da servidora recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a medida, mas o ministro Alexandre de Moraes manteve a quebra.
Durante a entrevista, a ex-coordenadora revelou ainda que o governo Bolsonaro dificultou as campanhas publicitárias sobre a importância da vacinação. “Qualquer programa de vacinação no mundo, para ter sucesso, precisa de vacina e comunicação, e não tive nenhum dos dois”, afirmou.
Fontana contou que solicitou várias vezes ao então ministro Eduardo Pazzuelo e à comunicação da pasta que se fizessem campanhas informando a população sobre a eficácia da vacina e quais eram os grupos prioritários. Os pedidos, no entanto, não foram atendidos.
“Dificilmente se conseguia uma comunicação. Eu entrava em contato com o núcleo de comunicação, que fazia contato com a assessoria, e não era explorado esse tema”, contou.
Além disso, ela destacou que declarações de Bolsonaro pela desobrigação do uso de máscaras também atrapalharam as estratégias de combate à pandemia. Uma das sugestões frequentemente repetida pelo presidente foi de que quem já tivesse sido vacinado deveria parar de usar o item de proteção. A estratégia do PNI vai no sentido contrário.
“Verificar uma fala do presidente da República de que vacinado já poderia deixar de usar a máscara é um cenário muito ruim para o Programa de Imunizações. Não vacinamos ainda quantitativo suficiente da população e estamos com número de casos expressivo”, apontou.
Com relação à falta de doses suficientes para imunizar a população, Fontana evitou se posicionar sobre a demora em fechar contratos, afirmando que o PNI não participava das negociações. Mas assinalou que a equipe técnica do programa reforçou em notas técnicas a necessidade de aquisição de vacinas.
“As negociações de contratos não eram feitas com o Programa Nacional de Imunizações. Quem fazia era a secretaria-executiva. Participávamos de reuniões como área técnica para ver características da vacina e em que fase os estudos clínicos estavam, mas não participávamos do processo de fechar os contratos”, relatou. “Mas o PNI apontou desde o começo a necessidade.”
O primeiro desses posicionamentos, observou, ocorreu em 19 de junho de 2020, em documento que apontava a necessidade de 141 milhões a 242 milhões de doses para iniciar a estratégia de vacinação. “A ideia era começar já com esse quantitativo”, comentou, lembrando que na época ainda não havia definição concreta sobre o número de doses da vacina para cada pessoa (uma ou duas).
Ainda segundo Fontana, a necessidade de que houvesse doses disponíveis em maior escala foi reiterada ao longo dos meses em outros documentos. Análises do programa também não apontavam restrição a qualquer tipo de vacina ou fornecedor.