
No primeiro dia de debate do Congresso Extraordinário da União Nacional dos Estudantes (UNE), os participantes se reuniram para debater os impactos dos cortes na educação, assim como na ciência e tecnologia, na conferência virtual “O projeto de desmonte das universidades públicas nas instituições estaduais”.
O debate contou com a presença do professor Dr. Pedro Falcão, reitor da Universidade de Pernambuco (UPE); do professor Dr. Ricardo Lodi Ribeiro, reitor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ); Guilherme Bianco, vereador em Araraquara pelo PCdoB e ex-diretor de Universidades Públicas da UNE; além da professora Flávia Bischain, representando a coordenação nacional da CSP-Conlutas.
O professor Dr. Pedro Falcão, reitor da Universidade de Pernambuco (UPE), denunciou que o governo Bolsonaro “está de olhos fechados para educação, para a ciência, para a saúde.”
“A ciência conta com o menor orçamento da história e esses cortes condenam a ciência por impedir as universidades, através do corte das bolsas da CAPES por, justamente, por não ter a oportunidade de estudantes de terem bolsas de mestrado e doutorado, assim como os cortes nas bolsas de iniciação científica que vem ocorrendo com esse governo que aí está. Em 2020 nós temos praticamente o mesmo valor orçamentário na junção dessas entidades financiadoras de pesquisa (FNDCT, CNPq e CAPES) que tínhamos em 11 anos atrás”, disse Falcão.
O reitor da estadual pernambucana relembrou os cortes promovidos pelo governo federal que reduziram o orçamento para pesquisas do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) de R$ 4,6 bilhões, em 2020, para R$ 2,8 bilhões neste ano.
“Um governo que num curto espaço de tempo que foi empossado, a bagunça é tão grande que já vamos aí para o quarto ministro da Educação. Um que passou apenas três meses, outro passou mais de um ano, outro que nem chegou a tomar posse em virtude de seu currículo mentiroso e agora a gente vê esse que tem promovido a diminuição de recursos para educação, ciência e tecnologia. Nós temos um orçamento cada vez menor para uma população de pesquisadores cada vez maior”, disse o professor Pedro Falcão.
O reitor da UERJ, Ricardo Lodi, afirmou que a pandemia deixou ainda mais evidente a importância das instituições públicas para a garantia das condições de vida do povo brasileiro. “Esse momento de combate à covid-19 ressalta a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) e das universidades públicas e centros de pesquisa em nosso país. É preciso que nós possamos nos mobilizar nesse momento que as atenções da sociedade estão voltadas para a sociedade e para o SUS para consagrar esses direitos do ponto de vista legislativo”, disse Ricardo Lodi.
“É preciso então que a gente cada vez esteja mais presente na luta na rua, na luta pelo impeachment, na luta pelo SUS, na luta pela universidade pública, na luta pela permanência estudantil, na luta pelos empregos, na luta pelo resgate do papel do Estado como fomentador da economia. Essas lutas são fundamentais para o nosso país e é preciso entender que não basta só ganhar eleições, é preciso que as nossas pautas sejam consagradas na hegemonia política em nosso país”, continuou.
Lodi lembrou dos episódios recentes em que parlamentares bolsonaristas atacaram a universidade, tanto com projeto propondo sua extinção, como foi o caso do projeto apresentado pelo deputado estadual Anderson Moraes (PSL), arquivado na ALERJ. Esse mesmo deputado protagonizou cenas, em vídeos que circulam nas redes sociais, em que invadia universidades para arrancar faixas e cartazes em oposição ao governo federal.
“Recentemente, um deputado da bancada bolsonarista invadiu a UERJ tentando arrancar a faixa da associação docente que falava de direito à vacina, que falava de comida no prato e que falava de fora Bolsonaro. Evidentemente que a segurança não permitiu que isso acontecesse e nós representamos à mesa da Assembleia Legislativa contra o deputado para que as providências fossem tomadas. Também um vereador carioca, aqui do Rio de Janeiro, veiculou nas redes sociais através de um programa de televisão, que na UERJ os professores fumavam maconha na sala de aula junto com os alunos, o que evidentemente não corresponde à realidade. Também fizemos uma representação à mesa da Câmara de Vereadores para que as providências fossem tomadas. Na UERJ, nenhum ataque fascista ficará sem a devida resposta jurídica que o caso exige”, disse o reitor.
“Parece que a UERJ desperta um sentimento especial nos fascistas, por seu caráter pioneiro na introdução do sistema de cotas, por ser uma universidade com o maior grau de inclusão social e sempre tem incomodado muito as odes fascistas”, disse.
Vereador pela cidade de Araraquara, no interior paulista, Guilherme Bianco (PCdoB) enfatizou que os cortes feitos no orçamento da educação colocam em xeque a sobrevivência das universidades.
“No caso das estaduais paulistas, o orçamento é estabelecido pelo ICMS [Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços], como faz para fechar a conta se os investimentos nas universidades são fixos e, inclusive, expansivos, mas seu financiamento não é fixo, é volátil. Quando a economia vai bem, o ICMS também cresce e com isso o orçamento das universidades; quando a economia vai mal, quando a gente está na crise, quando a gente passa por um momento como o que o Brasil tem vivido de uma crise bastante longa tem também impacto no financiamento das universidades”, disse Guilherme.
Bianco lembrou que “temos hoje cerca de 15 milhões de desempregados; 116 milhões de brasileiros vivem sob a fome. O Brasil voltou para o mapa da fome, no mesmo período em que o país ganhou dez novos bilionários numa das crises mais graves da história e que tem impactado direta ou indiretamente a sobrevivência das universidades e da pesquisa brasileira.
“No Brasil, quem produz ciência e tecnologia é a universidade pública, 95% das pesquisas são feitas dentro da universidade pública. Contudo, o governo Bolsonaro cortou R$4,9 bilhões da educação durante o ano de 2021, cortou R$5 bilhões da ciência e da tecnologia através do Fundo Nacional da Ciência e Tecnologia, que impactam diretamente na continuidade das pesquisas nas universidades. Bolsonaro vetou e entrou na Justiça contra o PL da Conectividade”, completou Guilherme.
O reitor da UERJ também defendeu a necessidade de se garantir um orçamento para as universidades na legislação brasileira. “Precisamos consagrar nacionalmente um percentual da arrecadação tributária, precisamos consagrar legalmente os dois décimos orçamentários para garantir a efetiva autonomia financeira e patrimonial da universidade”, disse.
Lembrando de 2017, quando o então governador Pezão, deixou de repassar as verbas previstas para a estadual fluminense, Rodi denunciou que grande parte das universidades estaduais pelo Brasil “não têm a garantia nem de que o que está previsto no orçamento vai ser repassado pelo poder executivo”.
“Isso é importante para preservar o núcleo da autonomia universitária que é a autonomia didático-científica. Porque em nenhum momento histórico do nosso país ficou tão claro que a universidade incomoda, que a ciência incomoda. Vivemos na era da pós-verdade e do irracionalismo, onde os fascistas apresentam suas próprias verdades e a investigação científica que demonstra o contrário é inimiga. Portanto, as universidades são tão perseguidas no atual governo federal”, explicou Ricardo Lodi.
Para a professora Flávia Bischain, representante da coordenação nacional da CSP-Conlutas, “é uma urgência tirar esse governo, não podemos esperar nenhum dia a mais desse governo que vimos agora que não é só genocida, é um governo corrupto.”
“É nesse contexto que estamos discutindo o avanço a passos largos do projeto de destruição da escola e da universidade pública, não só isso, de tudo que é público. Da Eletrobrás, dos Correios, a destruição completa dos serviços públicos e do patrimônio público, que não começou agora, mas que se aprofundou com o governo genocida de Bolsonaro”, disse Flávia.
“Nós estamos num momento em que falar de educação não é só falar de educação. Um momento em que a pandemia está longe de estar controlada. Não estamos expostos da mesma maneira à pandemia. Os trabalhadores, em especial aqueles que estão nas periferias, a população negra, a população que não teve direito à quarentena, são os mais expostos. Se combina com a crise sanitária uma crise econômica bastante profunda e a juventude tem sentido isso na pele, porque compõem a camada dos que são mais afetados”, completou.
Guilherme Bianco lembrou ainda das recentes revelações da CPI da Covid-19, no Senado Federal, que trouxe à tona supostos esquemas de corrupção envolvendo a compra de vacinas com repasses de propina para um grupo que atua no governo federal.
“A gente tem vivido um governo genocida que tem matado os brasileiros de covid porque se nega a comprar vacina. Na verdade, não se nega a comprar vacina, só compra vacina se tem a possibilidade de superfaturar para ganhar propina. Só compra vacina quando ele pode roubar. Por isso, não há outro modo de sair dessa crise que não seja derrubando Bolsonaro, que não passe pelo impeachment. Precisamos da unidade de todo o povo brasileiro para derrotar esse governo que tem promovido o desmonte do Estado brasileiro e condenado o povo à morte. É assim que se derrota o fascismo, com muita unidade, na rua”, disse Bianco.
Para o professor Rodi, “é preciso então que a gente cada vez esteja mais presente na luta na rua na luta pelo impeachment, na luta pelo SUS, na luta pela universidade pública, na luta pela permanência estudantil, na luta pelos empregos, na luta pelo resgate do papel do Estado como fomentador da economia. É preciso entender que não basta só ganhar eleições, é preciso que as nossas pautas sejam consagradas na hegemonia política em nosso país.”
“Não dá mais para segurar o povo em casa e a gente tem que pautar esse movimento para que não nos limitemos a tirar o fascista do poder e colocar um neoliberal que vai continuar toda essa agenda que destrói a educação pública, que destrói o SUS, que destrói todos os direitos sociais consolidados após quase um século de lutas do povo trabalhador no Brasil e em outros países. Vamos para rua sim e vamos pautar as questões que são caras ao povo brasileiro. Para garantir a produção de ciência que não fique pautada pelos interesses do mercado e pelos interesses do governo de plantão”, completou o reitor da UERJ.
RODRIGO LUCAS
Veja a íntegra do debate: