A tentativa do governo Bolsonaro de privatizar os Correios tem sido questionada, principalmente após as demonstrações de lucratividade e eficiência nos últimos anos, desmontando os argumentos do governo para entregar a estatal às mãos de empresas privadas, essencialmente estrangeiras.
Nos últimos 20 anos, de 2001 a 2020, a empresa lucrou R$ 12,4 bilhões em valores atualizados pelo IPCA segundo reportagem do Uol, e desses, R$ 9 bilhões foram repassados à União, ou, 73% dos seus lucros.
Em 2020, a empresa registrou o maior lucro dos últimos 10 anos, com R$ 1,53 bilhão e, segundo o próprio governo, “investiu na modernização da frota de veículos, ativos de tecnologia, automação do tratamento de objetos e ampliação da estrutura operacional no segmento de encomendas”.
Na última segunda-feira (2), o ministro das Comunicações, Fábio Faria, fez um pronunciamento em rede nacional para pressionar os parlamentares a votarem em apoio ao projeto de privatização do governo, onde afirmou que apesar de ser o “orgulho do Brasil”, e de ter registrado “lucro de R$ 1,5 bilhão em 2020”, a estatal precisaria de investimentos anuais de R$ 2,5 bilhões para continuar “competitiva”.
De acordo com a Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap), essa informação não é verdadeira, e trata-se apenas de mais um argumento falso para a privatização da empresa. “Até alguns meses atrás, o governo utilizava a argumentação de que os Correios precisavam ser vendidos porque davam prejuízo. Essa argumentação mentirosa era usada sistematicamente, apesar de os balanços da empresa demostrarem o contrário e do Ministério da Economia conhecer bem as causas dos déficits havidos no passado”.
“Com o resultado de 2020 superando R$ 1,5 bilhão, tiveram que buscar outra argumentação, pois ficaria ainda mais evidente que estavam mentindo. Surgiu, então, a argumentação de que os Correios não teriam condições de fazer os investimentos necessários no futuro e, por isso, precisariam ser vendidos. E a cifra de R$ 2,5 bilhões por ano foi lançada da mesma forma que outras informações – sem detalhamento ou fundamentação”, afirma a Adcap.
De acordo com entidades de trabalhadores dos Correios, não há outra razão para a privatização dos Correios que não a de atender a interesses econômicos dos que pretendem se apropriar de uma empresa lucrativa. A medida, no entanto, será desastrosa para a população brasileira, que sofrerá com a alta nos preços das tarifas postais e o repasse desse aumento aos produtos vendidos por pequenas, médias e grandes empresas.
Eles também alertam para o fato de que para as empresas privadas não é vantajoso o atendimento às regiões remotas do país e pequenos municípios, considerados menos lucrativos. Esses rincões do país seriam ignorados pelas empresas privadas, como já são atualmente para as que atuam no setor, que se utilizam da própria logística dos Correios para entregar suas encomendas.
Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Correios de São Paulo (Sintect-SP), Elias Cesário (Diviza), “os Correios, uma empresa de mais de 350 anos, é a única empresa do setor presente em mais de 5.570 municípios do país. Não são as empresas privadas que levam encomendas para os mais distantes desses municípios, somos nós, trabalhadores dos Correios que levamos”.
O risco de falta de atendimento nas regiões mais distantes do Brasil caso a estatal seja entregue à iniciativa privada é corroborado até por quem defende a privatização, como o doutor em administração e professor do Insper, Sérgio Lazzarini, que afirmou, em entrevista ao UOL que, “se vendermos os Correios com ‘porteira fechada’ [100% da empresa] e o comprador puder fazer o que quiser, certamente vai ignorar entregas mais complicadas ou cobrar preços bem mais altos”.
Portanto, como afirmam as entidades sindicais que representam os mais de 100 mil trabalhadores dos Correios espalhados por todo o país, que também estão com seus empregos sob risco com a privatização, a defesa de uma estatal estratégica como a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos “é uma luta de todo o povo brasileiro”.
Greve
Diante do avanço da tramitação do projeto de privatização dos Correios na Câmara dos Deputados (PL 591/2021), que tem previsão de ser votado esta semana, as entidades sindicais que representam os trabalhadores da estatal estão discutindo a realização de uma greve nacional contra a privatização.
Para o secretário-geral da Fentect, José Rivaldo da Silva, a questão da privatização dos Correios é mais importante do que a discussão da campanha salarial. “Não adianta ter um reajuste de salário, mas, amanhã, a empresa ser privatizada e a gente perder o emprego”, afirmou.
Para Elias Diviza, “o governo Bolsonaro quer destruir os Correios, e se conseguir vai ampliar o desemprego, causar um apagão postal no país e inviabilizar os pequenos negócios empresariais e comerciais, os principais impulsionadores da economia e da geração de emprego”, afirma Divisa. Em São Paulo, a assembleia da categoria está marcada para o próximo dia 10 de agosto.