O Brasil virou de cabeça para baixo
Temer aplica o golpe de simular indignação para parecer inocente
A denúncia da Procuradoria Geral contra Temer prova que sua quadrilha, em propinas, agasalhou mais de meio bilhão de reais da Petrobrás, Furnas, Caixa Econômica, Ministério da Integração Nacional, Ministério da Agricultura, Secretaria de Aviação Civil e Câmara dos Deputados. Diante dessa denúncia, a defesa de Temer é uma confissão. Em vez de abordar as provas, tem-se uma golfada de insultos contra o procurador Janot, como se fosse algum inocente, indignado por uma acusação – que todo mundo, aliás, sabe que é verdade.
Em sua segunda denúncia contra Temer, a Procuradoria Geral da República – na época sob o comando de Rodrigo Janot – provou que sua quadrilha se apropriou, em propinas, de ao menos R$ 587.101.098,48, ou seja, mais de meio bilhão de reais (incluindo 62 milhões de dólares), com os assaltos na Petrobrás, Furnas, Caixa Econômica Federal, Ministério da Integração Nacional, Ministério da Agricultura, Secretaria de Aviação Civil e Câmara dos Deputados.
Os relatos desses roubos – que baseiam a acusação de formação de organização criminosa e obstrução da Justiça – são bastante detalhados, na alentada denúncia da Procuradoria.
Diante dessa denúncia, a suposta defesa de Temer, entregue na quarta-feira à Comissão de Constituição de Justiça da Câmara (CCJ), é, sob qualquer aspecto verdadeiro, uma confissão de culpa.
A defesa de Temer não é uma defesa. Nem se preocupa com as provas apresentadas pela Procuradoria – exceto para dizer que elas não existem, tendo como fundamento para isso a declaração de Temer, e de seus advogados, de que elas não existem.
Fora isso, essa “defesa” é uma coleção de insultos, ao estilo nazista, contra o procurador Janot. A defesa é constituída, portanto, pela difamação de quem fez a denúncia.
ESSÊNCIA
Seria difícil encontrar maior prova de que os fatos elencados na denúncia estão além de qualquer contestação, do que essa substituição da defesa pela difamação. Como Temer não pode – e não tem como – responder ao que se descobriu e se arrolou, o negócio é atacar quem o denunciou.
Junto com isso, através de impropérios, aleivosias e meros xingamentos, Temer quer passar a ideia de que está muito indignado com a denúncia, como ficam os homens decentes, quando são acusados injustamente.
Mas Temer não é um homem decente. O que, aliás, transparece ao mais superficial olhar – desde que seja um olhar minimamente honesto. Temer, como diriam os franceses, é o seu próprio “physique du rôle” [físico adequado ao papel]: o papel de um velhaco.
Embora, é forçoso reconhecer, nada é tão idêntico à podridão quanto a podridão. Os corruptos, no Brasil, estão com a aparência cada vez mais igual – manifestando, portanto, que sua fétida essência é a mesma: exceto alguma peculiaridade incidental na forma da demagogia, a defesa de Temer poderia ser assinada por Lula.
Segundo essa “defesa”, a intenção do procurador Janot, ao apresentá-la, era dar um golpe de Estado (literalmente, é dito que se trata de “insana tentativa de golpear as instituições por meio da deposição do Presidente” e de um “plano para dar um golpe e destituir o Presidente da República”).
Não era isso o que Dilma e Lula diziam (e dizem) de Temer?
Não foi isso, essencialmente, o que disse Lula, ao ser condenado pelo juiz Sérgio Moro?
Para essas quadrilhas, combater os ladrões do dinheiro do povo, os assaltantes do Tesouro e das estatais, os ratos que infestam o governo – ou seja, combater a elas – é golpe.
Não é que acreditem nisso. Eles sabem, melhor que ninguém, que seu negócio é roubar. Querem ficar no poder para roubar – e querem roubar para ficar no poder. Por isso, querem passar que aqueles que os desmascaram, estão promovendo um golpe, como se tivessem adquirido o direito de roubar eternamente a coletividade.
Sintomaticamente, acompanhando esse prato, Temer esguichou o seu rosário de insultos contra o procurador Janot, no mais cru estilo nazista, ou seja, no estilo da pior espécie de golpista.
Assim, Janot é injuriado como “antiético, imoral, indecente”, sem que nada tenha feito – ou, melhor, por denunciar os crimes de Temer & quadrilha.
O próprio Temer – não seus advogados, mas ele mesmo – escreveu, no Twitter: “precisamos lidar com mais uma denúncia inepta e sem sentido, proposta por uma associação criminosa que quis parar o País”.
A denúncia é chamada de “inepta” exatamente para não ter que demonstrar a sua suposta inépcia; é “sem sentido” porque o sentido da vida (?) de Temer é continuar roubando. Tudo o mais é “sem sentido”. Temer acusa os procuradores, precisamente, do que lhe estão acusando, como se despejar a acusação sobre quem a fez, o livrasse dela. Por fim, não é ele (e Dilma) que parou o país: foram os procuradores, em especial, Janot, que cometeu o crime de não se submeter à quadrilha de Temer nem à de Lula.
MAL
Esta última menção a Lula é, exatamente, porque também este afirma que foi a Operação Lava Jato – e não a política de Dilma e Temer – que pararam o país e devastaram a economia.
Portanto, o combate à ladroagem é o grande mal. Quanto aos ladrões, estes são os beneméritos, diante dos quais o povo deve se prosternar e agradecer por ser roubado, por seus filhos não frequentarem escolas decentes, pelos hospitais que estão caindo aos pedaços, pelos despejos que enchem de gente a sombra dos viadutos, pelos jovens que naufragam no tráfico, pelos idosos que morrem sem medicamentos, pelas mulheres que se desesperam quando nada têm para alimentar a família.
Qualquer brasileiro já viu – ou ouviu falar – no ladrão que sai gritando “pega ladrão” para escapar da cadeia, mesmo à custa de que a polícia encarcere algum pobre coitado, que nada fez de errado.
Temer é pior: ele sai gritando que o ladrão é a polícia – ou os procuradores.
A coisa mais estranha de tudo isso é que a tarefa de provar que Temer é um ladrão, chefe de uma organização criminosa (ou seja, de uma quadrilha) e que tentou obstruir a Justiça, tem como principal dificuldade o fato de que, hoje, isso é evidente a tal ponto que ninguém, ou quase ninguém, demonstra dúvida. Ninguém acha que é necessário provar o que é convicção geral, quase unânime – porque todos viram ou ouviram as gravações e outras provas.
Em suma, o estranho, como já nos referimos anteriormente, ao ler a atual denúncia contra Michel Temer – ora em tramitação na Câmara dos Deputados – é que todos os fatos, documentos e depoimentos foram reunidos, em 245 laudas, para provar (e, com efeito, provam) o que todo mundo já sabe, e está, até mesmo, fora de discussão: que Temer é o cabecilha de uma quadrilha formada por, além dele, Eliseu Padilha, Moreira Franco, Geddel Vieira Lima, Eduardo Cunha, Henrique Alves e Rodrigo Rocha Loures.
QUADRILHA
Em suma, do ponto de vista político, a República – um dos maiores países do mundo – está entregue a uma quadrilha, a gangsters cuja extensão dos delitos transformaria Al Capone, por comparação, em um punguista. Afinal, o máximo que Capone conseguiu foi dominar três distritos no sul de Chicago, com o permanente risco de ser enviado, pela concorrência, a prestar contas em outro mundo.
Mas Al Capone, que acabou com os costados em Alcatraz, jamais foi presidente da República, nem mesmo senador ou deputado.
Que criminosos sem nenhum escrúpulo ocupem a Presidência e chamem de “antiético, imoral e indecente” um homem que expôs ao país e à Justiça a indecência, a imoralidade desses celerados, é um sinal – e dos mais candentes – do que o Brasil necessita se livrar, neste momento, para existir como Nação, como comunidade de gente honesta e trabalhadora, pois assim são os brasileiros.
CARLOS LOPES