A China não tem favelas, assinala o economista e pesquisador Elias Jabbour, no Meia Noite em Pequim, da TV Grabois. Ele também registrou como, desde a primeira vez que esteve lá, em comparação com Nova York, Paris e outros centros capitalistas desenvolvidos, “chega a ser impressionante” o quão a China tem poucas pessoas vivendo em situação de rua.
Constatação que chocou positivamente o pesquisador, já que, como apontou, a gente vive em um país, o Brasil, em que mais de 11 milhões de pessoas vivem em favelas segundo o IBGE. “No Rio de Janeiro, a cidade em que eu moro, 14,4% da população vive em favelas”.
A gente quase naturaliza esse tipo de realidade – destacou – e aí vai num país de 1,4 bilhão de habitantes, com cidades com 20-25 milhões de pessoas, como Pequim, Xangai e Shenzhen, e 100 cidades com mais de 1 milhão de moradores, “e não tem favela”.
A base disso – esclarece Jabbour – é que em 1949 a China realizou a reforma agrária, que não é somente um meio para formação do mercado interno, também é um instrumento para planejamento da dinâmica de ocupação territorial do país.
Sem reforma agrária é possível ter crescimento, é a chamada via prussiana, quando os feudais tomam o poder para fazer a modernização de cima para baixo sem fazer a reforma agrária, como no Japão e na Alemanha.
Mas os países com essa dinâmica de acumulação têm um dilema, não podem parar de crescer, porque senão vai acumular muita gente na periferia das cidades, a massa de pessoas que sai do campo de forma descontrolada.
Foi o que aconteceu com o Brasil na década de 1980, depois de crescer por 50 anos, e a crise de superpopulação agrária se torna em uma crise de superpopulação urbana. “Paramos de crescer e ao parar de crescer a via prussiana vira uma bomba relógio”.
A China fez a reforma agrária e implantou em 1949 um sistema chamado hukou, um sistema ultrapolêmico, que obriga as pessoas a terem passaporte interno e são praticamente proibidas de trabalhar fora de sua região, revela Jabbour.
O que serviu para desencorajar a migração campo-cidade e também deu condição de alocar a força de trabalho territorialmente. Em 1949, com 600 milhões de habitantes, essa medida foi fundamental para evitar que a China se transformasse em uma imensa favela.
Vem a polêmica de que é uma ‘ditadura’, ‘contra as liberdades individuais’. “Aí temos a discussão de liberdade real x liberdade formal”, assinala Jabbour, que ressalta como Marx e Hegel superaram essa separação entre liberdade individual e liberdade coletiva.
A discussão suscita uma comparação entre a China, que fez sua revolução em 1949, e a Índia, que conquistou a independência um ano antes.
A Índia tem taxas de crescimento semelhantes à da China, a Índia é chamada pela mídia vinculada à Otan de democracia, em oposição à China, que seria ‘ditadura’, é um país que tem uma população similar à da China, num território não tão grande quanto o da China, só que, ao contrário da China, atualmente a Índia tem dados sociais muito ruins. “35% da população da Índia, segundo o Banco Mundial, vive em favelas”.
“Não estou criticando a Índia, estou registrando que a China é um modelo alternativo”, enfatiza o pesquisador.
Um aspecto central da reforma econômica de 1978 – e que Jabbour considera “a grande política social da China” – é que a China estabelece um contrato de responsabilidade da família camponesa com o Estado, que concede a terra a ela. Isso significa que toda a família camponesa tem um pedaço de terra que é dela.
Com a reforma de 1978, as pessoas na China passaram a migrar de forma clandestina para as cidades, sendo que não existem direitos sociais para quem está fora de sua região de origem.
Quem migra, se não consegue um emprego, acaba voltando para a aldeia. Isso significa que o exército industrial de reserva não está nas favelas, está nos vilarejos, no campo.
Atualmente, há um contínuo relaxamento do sistema hukou. Com o 14º Plano Quinqüenal, essas pessoas vão gozar dos mesmos direitos da população urbana, é um salto de qualidade.
O processo de crescimento traz também um processo de urbanização, o que demanda a criação de um sistema financeiro de longo prazo para bancar isso. Entre 2008 e 2019, 78 milhões de residências foram construídas na China, números que incluem o programa para erradicação da pobreza.
Assim, a China, a partir do seu sistema de hukou, a partir do planejamento do sistema de transporte de massa e da utilização do capital financeiro de longo prazo foi criando as condições para o planejamento do processo de urbanização.
Para concluir, Jabbour observa que essas são as questões que os comunistas têm que pautar quando se fala em reforma urbana: como financiar a construção de milhões de casas, como realizar a transição campo-cidade, como gerar empregos para essa massa de gente.
Elias Jabbour é professor dos Programas de Pós-Graduação em Ciências Econômicas e em Relações Internacionais da UERJ.
pois é, a China dá um exemplo ao mundo, em especial ao Brasil, e esfrega na cara dos bolsonaristas e á gentalha da direita que comunistas não comem criancinhas.