A Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) considerou que a denúncia de 200 mortes em uma pesquisa clínica com a proxalutamida feita no Amazonas, se confirmada, representará uma violação aos direitos humanos e uma das infrações éticas mais graves e sérias da história da América Latina.
“É urgente que, se comprovadas as irregularidades, sejam investigados e responsabilizados ética e legalmente todos os envolvidos, incluindo equipes de pesquisa, bem como instituições responsáveis e patrocinadores, nacionais e estrangeiros”, apontou. A Unesco pede uma investigação profunda sobre o caso.
A denúncia foi encaminhada à Procuradoria-Geral da República pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), entidade que regula a participação de seres humanos em pesquisas científicas no Brasil.
O documento foi divulgado sábado (9) por meio da Rede Latino-americana e Caribenha de Bioética (Redbioética-Unesco).
De acordo com a rede de bioética da Unesco, a denúncia da Conep inclui graves violações dos padrões éticos durante o estudo com a proxalutamida.
Entre as críticas ao estudo, estão a ocultação de informação sobre os locais e número de participantes. Eles reforçam também que mudanças de protocolo deveriam ter sido aprovadas pelo órgão regulador, no caso a Conep.
O documento diz ainda que as equipes não apresentaram análise crítica da pesquisa e, mesmo com o aumento no número de mortos, optaram por continuar com a implementação da pesquisa clínica.
“É urgente identificar as causas das mortes ocorridas durante os estudos. É inaceitável que esses tipos de eventos, se verificados, estejam acontecendo no ano de 2021″, assinalaram os pesquisadores. Para a Unesco, “nenhuma emergência sanitária, ou contexto político ou econômico, justifica fatos como esses apresentados na denúncia da Conep”.
O presidente Jair Bolsonaro já defendeu o uso do medicamento no combate à Covid-19, mas a substância não teve eficácia comprovada contra a doença. Porém, o uso da substância em pesquisas científicas foi vetado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) no início do mês passado.
No relatório encaminhado à Procuradoria Geral da República, a Conep concluiu que os responsáveis pelo estudo desrespeitaram quase todo o protocolo aprovado pela comissão em 27 de janeiro.
Havia autorização para que a pesquisa científica fosse realizada com 294 voluntários em Brasília. Mas, segundo a comissão, o protocolo começou a ser aplicado no Amazonas em fevereiro sem autorização. No total de 645 pessoas.
O perfil dos voluntários mortos também não era compatível com o perfil clínico dos pacientes registrados no estudo.
Segundo a Conep, a pesquisa no Amazonas foi desenvolvida sob a liderança do endocrinologista Flávio Cadegiani e patrocinada pela rede privada de hospitais Samel. O médico divulgou uma nota no perfil oficial que tem no Twitter dizendo que “a Unesco foi induzida a erro por declarações tendenciosas, por informações inverídicas e distorcidas fornecidas pela Conep, decorrentes de vazamentos ilegais, as quais são objeto de investigações pelos órgãos de controle e pela Justiça Federal”.