O deputado estadual do PCdoB diz que as privatizações tiram a soberania do estado em encaminhar políticas estratégicas para a região. “Isto impede a vinda de investimentos e de empregos”, aponta o parlamentar
O deputado estadual pelo PCdoB de Minas Gerais, José Célio de Alvarenga, o Celinho Sintrocel, um dos parlamentares mais atuantes da Assembleia Legislativa de Minas, afirmou, nesta quinta-feira (21), em entrevista ao HP, que as privatizações das empresas de água, saneamento e energia que o governo do estado está levando a cabo são todas elas “nefastas para Minas Gerais e para o Brasil”.
“Em primeiro lugar perde-se a soberania do Estado em encaminhar as políticas estratégicas nessa área. Isso impacta, por exemplo, em disponibilidade de energia e água para grandes investimentos que poderiam atrair milhares de emprego, como parques industriais pelo nosso estado, até a disponibilização da água, saneamento e energia para lugares distantes e mais carentes”, disse o deputado.
Celinho denunciou também os acordos do governo com a Vale no caso do desastre ambiental de Brumadinho. “Fez um acordo tímido com a Vale, no caso do acidente de Brumadinho, que matou 270 trabalhadores. Tímido porque não atende de fato a situação dos mais atingidos, não aposta em um programa consistente de alternativa produtiva para o Estado. São obras pontuais e dispersas, sem a lógica de uma política una, que possa a médio e longo prazo viabilizar uma economia mais multifacetada, que invista na indústria, em um modelo econômico não dependente das comoditties da mineração”, avaliou.
Na opinião do parlamentar, o governador Romeu Zema “tem semelhanças grandes com Bolsonaro”. “A visão macroeconômica ultraliberal de Paulo Guedes e Zema são muito parecidas”, disse o deputado. “O desrespeito às instituições, a falta de trato político, o menosprezo ao parlamento e a democracia aproxima a visão dos dois”, acrescentou.
Confira abaixo a entrevista na íntegra.
HORA DO POVO: Quais as consequências para o Brasil e para Minas das privatizações de empresas como Cemig e a Copasa?
CELINHO SINTROCEL: A consequência das privatizações de empresas estratégicas como as de água e saneamento e energia são diversas para o país e para Minas Gerais. Todas nefastas. Em primeiro lugar, perde-se a soberania do Estado em encaminhar as políticas estratégicas nessa área. Isso impacta, por exemplo, em disponibilidade de energia e água para grandes investimentos que poderiam atrair milhares de empregos, como parques industriais, pelo nosso estado, até a disponibilização da água, saneamento e energia para lugares distantes e mais carentes.
Sob o comando do Estado, pode-se operar essas empresas com a perspectiva do desenvolvimento econômico e social de todo o estado. Sob o jugo da iniciativa privada, tudo está apenas sob a ótica do lucro. Com isso,€ as moradias em áreas mais distantes, que não são lucrativas para a empresa privada, não serão atendidas. Investimentos de aporte de energia para o desenvolvimento industrial também não.
Veja o exemplo de Belo Horizonte na década de 30 do século passado. Minas queria desenvolver um grande parque industrial em Belo Horizonte. Mas havia um monopólio privado com uma concessão da energia elétrica na capital na mão dos norte-americanos que não se dispuseram a realizar investimentos na cidade. Desmembrou parte de BH, a Cidade Industrial, e transferiu esta área para o município de Contagem, para ai o Estado poder investir e atrair dezenas de empresas, onde hoje está a Cidade Industrial.
“Veja o exemplo de Belo Horizonte na década de 30 do século passado. Minas queria desenvolver um grande parque industrial em Belo Horizonte. Mas havia um monopólio privado com uma concessão da energia elétrica na capital na mão dos norte-americanos que não se dispuseram a realizar investimento na cidade”
Além disso a tendência é o encarecimento geral da conta de água e luz para todos os moradores, pois o que estará no centro das decisões de valor e de preço é meramente o lucro dos acionistas. Sem contar o direito dos trabalhadores eletricitários e urbanitários, que não se asseguram após anos, décadas de dedicação às empresas e ao estado de Minas.
HP: O governador Zema está tendo alguma política para deter a desindustrialização do estado?
CELINHO: Infelizmente não vimos. O Governo Zema aposta no Estado mínimo, sua crença no Deus Mercado o faz trabalhar com as frias planilhas dos tecnocratas e sem observar o interesse básico da população. Emprego, emprego e emprego. Com isso, Minas vai perdendo capacidade de atrair investimento produtivo, a região mesmo que moro, o Vale do Aço, vem a duras penas tentando manter os empregos e as empresas na região. Não há investimento estratégico, nem política em defesa da empresa. A indústria mineira, como a nacional, padece dos descasos neoliberais que o atual governo impõe.
HP: Sobre os desastres provocados pelas mineradoras. O governo está agindo corretamente na recuperação das áreas destruídas?
CELINHO: O Governo na prática terceirizou as próprias empresas na recuperação das áreas atingidas. Fez um acordo tímido com a Vale no caso do acidente de Brumadinho, que matou 270 trabalhadores. Tímido porque não atende de fato a situação dos mais atingidos, não aposta em um programa consistente de alternativa produtiva para o estado. São obras pontuais e dispersas, sem a lógica de uma política una, que possa, a médio e longo prazo, viabilizar uma economia no estado mais multifacetada, que invista na indústria, em um modelo econômico não dependente das commodities da mineração.
O valor acordado para pagar R$ 37 bilhões em dez anos é menor que um mês de lucro da empresa. Foi feito açodadamente pelo governador. Conseguimos, na Assembleia Legislativa, melhorá-lo, dando mais autonomia aos municípios. Diminuímos os danos, mas, longe de reparar o mal causado. Para o acidente de Mariana, que comprometeu a Bacia do Rio Doce, que corta o leste mineiro e o Espírito Santo, quase nada foi investido na recuperação da calha do Rio, das suas nascentes, e seus afluentes.
“O valor acordado com a Vale para pagar em dez anos, R$ 37 bilhões, é menor que um mês de lucro da empresa”
Ações mitigadas, pontuais e mais uma vez dispersas. Há investimentos em infraestrutura, como a da LMG 760, pelos quais lutamos, que liga o Vale do Aço à Zona da Mata, além do recurso para o Parque Estadual do Rio Doce. Mas, tudo foi muito tímido. Não repara o essencial do que foi destruído com toda a lama que correu de Mariana até o Oceano Atlântico.
HP: Qual é a sua opinião sobre a proximidade entre Zema e Bolsonaro?
CELINHO: Tem semelhanças grandes. A visão macroeconômica ultraliberal de Paulo Guedes e Zema são muito parecidas. O desrespeito às instituições, a falta de trato político, o menosprezo ao parlamento e a democracia aproxima a visão dos dois.
Mesmo na maioria dos manifestos assinados pelos governadores de todo o Brasil, seja na defesa da vacina, da vida, da democracia, o governador Zema se ausentou, não assinou. Sendo, em muitas vezes, um dos poucos governadores que não cerraram fileiras pela vida, pelo Brasil. Claro, Zema não se apresenta da forma truculenta, agressiva como Bolsonaro, nem atenta o tempo todo contra a democracia, mas, sim, há mais similaridades que diferenças. Infelizmente.
HP: As obras ferroviárias de escoamento de minérios de Minas estão respeitando as normas ambientais? O governo está com algum planejamento nesta área?
CELINHO: Atualmente, os investimentos no setor são pífios e os recursos auferidos com a antecipação das concessões, feitas pela ANTT, não serão alocados em Minas Gerais. Ao contrário, servirão para construção de vias em outros estados e regiões. No transporte de passageiros, então, o investimento é praticamente zero. No país existem somente Linhas de transporte de passageiros – uma no Pará e a BH-Vitória.
Sou membro efetivo da Comissão de Ferrovias da Assembleia e participei da elaboração, em 2018, do Relatorio Final da Comissão Extraordinária Pro-Ferrrovias Mineiras. Ali apresentamos várias propostas. Parte delas contribuiu para a elaboração, por parte do governo do Estado, do plano Estrategico Ferroviario de Minas Gerais (PEF).
Conduzido pela Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade (Seinfra), o plano foi elaborado pela Fundação Dom Cabral (FDC) em parceria com a Comissão Extraordinaria Pró-Ferrovias da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e patrocionado pela Associação Nacional dos Transportadores Ferroviarios (ANTF).
Lançado em agosto de 2019, o PEF partiu do diagnóstico do atual sistema e da identificação de demandas em todas as regiões do estado, para definir um horizonte de investimentos de curto, médio e longo prazos para transporte de passageiros e de cargas sobre trilhos. O PEF agora, tem que sair do papel.
CELINHO SINTROCEL está no terceiro mandato consecutivo na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Foi eleito suplente em 2007 e reeleito em 2011, 2014 e 2018. Representa a região dos Vales do Aço, Mucuri e Jequitinhonha, Leste e Norte de Minas. Foi vice-líder do Bloco Minas Melhor, no mandato anterior, e presidente da Comissão do Trabalho, da Previdência e da Ação Social. Também atuou na Comissão Extraordinária das Barragens, na Comissão Extraordinária Pró-Ferrovias Mineiras e na Comissão de Transporte, Comunicação e Obras Públicas, entre outras.
SÉRGIO CRUZ