
O ministro Luís Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou um prazo de cinco dias para que o governo federal preste esclarecimentos sobre a grave situação vivida pelo povo Yanomami, na Amazônia. A decisão do magistrado é uma resposta à ação impetrada pelo líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), em 15 de novembro.
A gestão Bolsonaro deve enviar ao STF informações sobre a situação nutricional, acesso à água potável, serviços de saúde e medicamentos disponibilizados ao povo indígena. O ministro sustenta que o governo deve tomar todas as medidas necessárias a fim de garantir as condições mínimas aos três pontos questionados e também garantir a segurança dos indígenas, “como exaustivamente determinado por este Juízo e previsto no Plano Geral de Enfrentamento à Covid-19 para Povos Indígenas”.
Ainda na segunda-feira, o Ministério Público Federal (MPF) cobrou do Ministério da Saúde um plano de reformulação de atendimento que reforce à assistência à saúde dos povos Yanomamis. As unidades do MPF em Roraima e na Amazônia contabilizam mais de 20 ações judiciais sobre ataques de garimpeiros, omissão de socorro e morte de indígenas. As ações interpostas reivindicam a ampliação do quadro de profissionais da saúde que atendem aos Yanomamis.
O MPF ainda recomenda auditorias nas contas do distrito sanitário que atua na saúde dos indígenas na Amazônia.

Descaso e desnutrição
Reportagem do Fantástico levada ao ar no domingo (14) revelou que os povos indígenas sofrem com o abandono e falta de ação do Executivo federal no combate aos garimpos ilegais, que ameaçam a sobrevivência e continuidade das comunidades indígenas da Amazônia.
A equipe do programa permaneceu por duas semanas na reserva Yanomami, a maior da região, onde vivem cerca de 30 mil indígenas, em mais de 30 comunidades. Surucucu, Heweteu e Xaruna. Falta medicamentos nos postos de saúde, estruturas precárias. Em Surucucu, por exemplo, que atende a 23 comunidades, o chão da unidade é de terra, as paredes são de madeira. Os pacientes são atendidos na sala de internação. “A estrutura é precária, com pequenas fogueiras para proteger do frio da noite e dos mosquitos”, denuncia a reportagem.
A malária também é outro problema constante. A doença tem avançado de maneira persistente na terra Yanomami: são mais de 16 mil casos só este ano — mais da metade da população. Em toda a reserva, a responsabilidade do atendimento é da Secretaria Especial de Saúde indígena (Sesai) e do Distrito Sanitários Especial Indígena (Dsei), ambos ligados ao Ministério da Saúde.
“Na comunidade há de dezenas de crianças, quase uma centena muito magras,
doentes, com a barriga muito dilatada por causa de parasitas, segundo especialistas. Muitas não conseguiam andar, de tão fracas que estavam. A gente viu crianças de 4 anos pesando 9 kg, chorando de dor, febre e sem nenhuma assistência”, denuncia a reportagem.
“Várias crianças morreram. Várias mães sofreram. Então a gente quer saúde aqui, equipe de saúde”, cobra uma líder da comunidade Heweteu. “Quanto mais desnutrida a criança é, maior a chance de ela ter infecção por qualquer causa. Pode ser respiratória, intestinal. infecções de pele”, alerta Maria Paula de Albuquerque, pediatra e nutróloga da Unifesp.
Há relatos de pessoas que morreram por falta da cloroquina, medicamento usado no tratamento da malária, que é uma doença que pode ser tratada facilmente, caso haja o atendimento médico adequado. Chega a ser irônico, porque a cloroquina, que é uma medicamento que não tem nenhuma eficiência comprovada contra a Covid-19 e que foi distribuída aos montes para comunidades indígenas durante a pandemia, hoje não chega a esses indígenas”, informam os repórteres. Uma situação muito triste de abandono. Fora isso, a gente vê a presença cada vez mais forte do garimpo destruindo rios, matando peixes e afastando a caça”, completam.

20 mil garimpeiros invadem o território Yanomami
O garimpo ilegal é outro fator que impacta na qualidade de vida das comunidades. Estimativas apontam, atualmente, a ação criminosa de 20 mil garimpeiros na área que possui uma população de indígena de 30 mil. Incentivado pelo governo Bolsonaro, de 2019 até os dias atuais, essa prática é responsável pelo crescimento descontrolado do desmatamento na terra Yanomami. O aumento chegou a 140%, segundo o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).
“Esse desmatamento tem se concentrado nessas regiões ao longo de rios. Tem uma série de consequências de problemas de saúde pública também, que pode afetar, por conta dessa atividade ilegal”, diz Antônio Victor Galvan Fonseca, pesquisador do Imazon.
Um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) analisa as consequências da presença do garimpo para a vida das populações indígenas. “Estudamos 19 comunidades e detectamos a presença de altos níveis de mercúrio no cabelo dos participantes. As populações tradicionais vão ser afetadas por intermédio do consumo do pescado contaminado, aponta Paulo César Basta, médico e pesquisador em saúde pública da Fiocruz. “Garimpo quando entra, a primeira providência é provocar uma devastação. Impacta diretamente nas fontes alimentares dessas famílias”, denuncia.
JOSI SOUSA