Após expelir sua raiva contra a Polícia Federal que intimou sua filha, Maristela, para prestar depoimento sobre a origem dos recursos usados para a reforma de sua casa em São Paulo, paga por João Batista Lima Filho, operador de Temer, o Planalto cancelou, mais uma vez, a viagem que ele faria à Ásia a partir da próxima semana.
Diante da repercussão, quando todos interpretaram que foi por medo das investigações decorrentes do decreto fraudulento dos portos, que beneficiou empresas amigas portuárias, que Temer desistiu da viagem, o planalto emitiu nota alegando que o motivo foi para evitar “prejuízos à economia” em razão da dificuldade de fazer votações no Congresso, jurando de pés juntos que a desistência não estava ligada às investigações.
Michel Temer adotou a linha da defesa de Lula e diz que não há provas contra ele, apesar das provas clamarem aos céus (e aos infernos). Como o petista, reclamou que está sofrendo “perseguição política”. A grita se deu após o anúncio de que sua filha, Maristela Temer, foi intimada a prestar depoimento à Polícia Federal sobre a origem dos recursos usados para a reforma de sua casa em São Paulo, paga por João Batista Lima Filho, operador de Temer (Foto ao lado).
Não é o primeiro caso em que isso acontece na Operação Lava Jato, mas é inevitável frisar: o sujeito envolve a própria filha em um pagamento de propina – e depois o problema é a polícia, ou a Justiça…
Temer chamou o inquérito da PF, autorizado pelo Supremo Tribunal Federal, de “perseguição criminosa disfarçada de investigação”. Da mesma forma que outros investigados pela Lava Jato, diz que as provas colhidas pela investigação não passam de “ilações”. Apesar das evidências de crimes serem abundantes – aliás, por isso mesmo – ele insiste em tentar minimizá-las. Essa estratégia não deu certo para os outros investigados e caminha para não dar certo também para o peemedebista.
Temer está sendo investigado por ter assinado um decreto beneficiando empresas que operam no Porto de Santos, em troca de propina. O ex-auxiliar de Temer, Rodrigo Rocha Loures, o mesmo que foi flagrado correndo pelas ruas de São Paulo com uma mala cheia de dinheiro passado pela JBS, negociou pagamentos a Temer, por vantagens à empresas na nova regulamentação dos portos.
No início de março, nesse mesmo inquérito, por decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, o sigilo bancário de Temer fora quebrado. Em um primeiro momento, Temer disse que mostraria publicamente todos os seus extratos bancários. Em poucos dias, desistiu.
Agora, o homem transparente (vice da mulher honesta) expeliu sua raiva porque, além da convocação de sua filha, a PF pediu, também, a prorrogação das investigações por mais 60 dias. O motivo do adiamento é que a PF quer aprofundar as análises das quebras de sigilo e destrinchar os depoimentos dos presos na Operação Skala, que investiga a quadrilha de Temer.
CORRUPÇÃO DESELEGANTE
Uma das provas do envolvimento direto de Temer com o recebimento de propinas é o depoimento do executivo Ricardo Saud, da JBS, que tinha interesse em desembargar uma obra da Eldorado – braço do grupo no ramo da celulose – no Porto de Santos.
Saud relatou à Força Tarefa da Lava Jato detalhes da entrega de R$ 1 milhão em dinheiro vivo, pessoalmente, para João Batista Lima Filho, a pedido de Temer. Declarou o executivo da JBS: “o Michel Temer fez uma coisa até deselegante. Porque nessa eleição de 2014 só vi dois caras roubar deles mesmos. Um foi o Kassab, o outro o Temer. O Temer me deu um papelzinho, e falou: ‘Ó, Ricardo, tem um milhão, que quero que você entregue em dinheiro nesse endereço aqui’. O Temer falou isso. Na porta do escritório dele, na calçada. Só eu e ele na rua. Na Praça Panamericana“.
A Eldorado, controlada então pelo grupo da JBS, iniciou a construção de um terminal no Porto de Santos em 2014. A instalação, que seria operada pela Rishis (outra empresa do grupo), era resultado de um investimento de R$ 90 milhões. Deste total, R$ 50 milhões foram para a compra dos direitos de exploração do Armazém XIII (13 externo), onde a unidade foi erguida.
O contrato de arrendamento estava firmado com o Grupo Rodrimar, que o vendeu ao grupo da JBS. Um mês após a obra de construção do terminal ser iniciada, ela foi embargada pela Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), a autoridade portuária de Santos, controlada, desde o governo Fernando Henrique, por Temer.
Saud informou que isso se deu por conta da exigência de vários documentos e acrescentou que, depois de uma reunião com Temer, o embargo foi levantado.
O executivo da JBS disse que foram repassados ao PMDB um total de R$ 15 milhões. Esse repasse, disse Saud, foi feito a pedido do PT, para financiar a campanha de Temer, então vice de Dilma (v. Termo de depoimento n° 8 e nº 25 de Ricardo Saud).
O dinheiro estava incluído nos R$ 300 milhões passados ao PT, que foram referidos por Joesley Batista em seu depoimento à Procuradoria Geral da República (v. Termo de Colaboração nº 1 de Joesley Batista, p. 3).
MAIS PROVAS
Uma gravação da conversa entre Rocha Loures e o executivo Ricardo Saud, e outra com o subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo Rocha, também são reveladoras da associação de Rocha Loures com Temer nas atividades criminosas investigadas pela PF.
Vejam o conteúdo da gravação:
ROCHA LOURES: “Então vamos fazer o seguinte. Eu vou verificar com Edgar, se o Edgar… Tem duas opções: o Edgar ou o teu Xará”.
RICARDO SAUD: “Pra mim é mais confortável com o Edgar”.
ROCHA LOURES: “Você não conhece e ele também não te conhece”.
Em outro momento, a PF gravou o diálogo que Loures manteve com Gustavo Rocha, subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, e que é um dos personagens mais influentes do governo Temer.
GUSTAVO ROCHA: “É uma exposição muito grande para o presidente se a gente colocar isso. Já conseguiram coisas demais nesse decreto”.
ROCHA LOURES: “O importante é ouvi-los.”
GUSTAVO ROCHA: “A minha preocupação é expor o presidente em um ato que é muito sensível. […] Esse negócio vai ser questionado”.
Disse Temer, em solenidade na sexta-feira (27), que “fazem-se ilações as mais variadas” e que a PF “supõe que, acha que, e isso é divulgado para a imprensa” – e ameaçou diretamente o delegado que conduz o inquérito: “não é a imprensa que vai atrás. É quem preside o inquérito. Vou sugerir ao ministro Jungmann que apure internamente como se dão esse vazamentos irresponsáveis”.
O problema é que as “ilações” enchem malas e malas de dinheiro. Por exemplo:
“Em 2010, atendendo a um primeiro pedido de Temer, concordou em pagar 3 milhões de reais em propinas, sendo 1 milhão através de doação oficial, e 2 milhões para a empresa Pública Comunicações, através de Notas Fiscais número 149 e 155” (cf. Anexo 9 do depoimento de Joesley Batista – Fatos diretamente corroborados por elementos especiais de prova).
As notas foram apresentadas à PF e ao Ministério Público pelo dono da JBS.
“Em agosto e setembro de 2010, a pedido de Temer, também concordou com o pagamento de uma propina de 240 mil reais à empresa Ilha Produções, Notas Fiscais 63, 64 e 65” (idem)
“Quando Wagner Rossi deixou de ser Ministro da Agricultura, Temer pediu que pagasse a ele mensalinho de 100 mil reais e a Milton Hortolan o mensalinho de 20 mil reais. Aquiesceu e determinou o pagamento, que foi feito dissimuladamente por cerca de um ano.
“Na Campanha para a Prefeitura de São Paulo, em 2012, Temer voltou a solicitar o pagamento de 3 milhões de reais para a campanha do então candidato Gabriel Chalita. Os valores foram pagos por meio de Caixa 2, mediante diversas notas fiscais, conforme planilhas a serem anexadas” (idem).
“… convidando-o para uma reunião no Escritório Jurídico de Temer, na região dos Jardins, em São Paulo, e pediu a propina no valor de R$ 300.000,00 para pagar despesas de marketing político pela internet, pois o mesmo [Temer] estava sendo duramente atacado no ambiente virtual. Temer orientou fazê-lo a ‘Elcinho’ marqueteiro de sua confiança. Chamou então ‘Elcinho’ em sua casa e lhe entregou os 300 mil em espécie” (idem).
O final desse anexo da confissão de Joesley Batista, o leitor, provavelmente, já conhece: é a descrição da conversa com Temer, no Jaburu, gravada pelo dono da JBS e divulgada na televisão.
Essas são algumas das “ilações” de que Temer reclama – e que quer proibir a PF de investigar.
Aliás, somente réprobos como Temer (ou Lula) são capazes, depois que as provas foram tornadas públicas, de reclamar da falta de segredo da PF, como se a população – cujo dinheiro e cujos interesses foram assaltados – não tivesse que saber dos crimes que praticaram.
“Se pensam ilusoriamente que vão me derrubar, não irão conseguir”, bradou Temer. “É ataque moral. Se pensam que atacarão minha honra e da minha família e vão ficar impunes, não ficarão sem resposta”.
Esconder-se atrás da família é coisa de covarde. Quanto à sua “honra” ou “moral” na vida pública, é difícil atacar o que não existe.
Mas Temer enfatizou, com isso, que somente o “foro privilegiado” impede que preste contas aos agentes da Lei e da Justiça. Mas isso, dentro de alguns meses, vai acabar – é o que ele, inconformado, chama de tentativa de “derrubá-lo”. Mas é apenas o cumprimento da Constituição.
POLÍCIA FEDERAL
A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) divulgou nota, na sexta-feira, na qual manifestou “preocupação” com a fala do presidente Michel Temer, acrescentando que a PF “não protege nem persegue qualquer pessoa”.
“É necessário serenidade, sobretudo daquele que ocupa o comando do país, para que suas manifestações não se transformem em potenciais ameaças e venham a exercer pressão indevida sobre a Polícia Federal. A ADPF reitera que a instituição não protege, nem persegue qualquer pessoa ou autoridade pública, apenas cumpre seu dever legal de investigar fatos e condutas tipificadas como crimes”, acrescentou a entidade.
Também em nota, o presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), Marcos Camargo, afirmou ser preciso “rechaçar qualquer possibilidade de retrocesso na independência investigativa”. Para Camargo, não se pode aceitar “nenhum retrocesso na independência investigativa da PF.” “O gargalo do combate ao crime no Brasil, hoje, está nos crimes que não ocorrem em flagrante e dependem de investigação para serem elucidados. É o caso do colarinho branco, dos crimes sexuais e dos homicídios”, afirmou.
“Para isso, é fundamental o investimento no desenvolvimento científico da investigação policial focado nas provas dos crimes. Essa é a forma de reforçar a produção da prova material isenta como elemento fundamental dos processos. A perícia criminal indica culpados e também inocentes, dando elementos para que sejam evitados os erros judiciais e mantida a eficiência e credibilidade do sistema de Justiça”, acrescentou.
Leia abaixo a íntegra da nota da ADPF:
A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) manifesta preocupação com a entrevista do Presidente da República, Michel Temer, sobre as apurações de suposta prática de lavagem de dinheiro envolvendo a si e a seus amigos e familiares.
É muito comum que investigados e suas defesas busquem, por todos os meios, contraditar as investigações. Entretanto, é necessário serenidade, sobretudo daquele que ocupa o comando do país, para que suas manifestações não se transformem em potenciais ameaças e venham a exercer pressão indevida sobre a Polícia Federal.
A ADPF reitera que a instituição não protege, nem persegue qualquer pessoa ou autoridade pública, apenas cumpre seu dever legal de investigar fatos e condutas tipificadas como crimes. Vale destacar que, no caso concreto, vários documentos e peças das diligências estão disponíveis ao público no sistema de processo eletrônico do Supremo Tribunal Federal.
É fundamental que as autoridades policiais tenham a tranquilidade necessária para realizar seu trabalho investigativo, com zelo, eficiência, dentro da mais absoluta legalidade, tendo sempre resguardada sua autonomia e respeitada sua independência funcional.
A ADPF defende a apuração de supostos vazamentos causados por qualquer das instituições que manuseiam os autos. A entidade seguirá vigilante com o desenrolar dos acontecimentos e não admitirá pressões ou campanhas com a finalidade de desacreditar a atuação dos Delegados de Polícia Federal na condução dessa ou de qualquer outra investigação.
Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF)
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abuso de poder e ameaça. o michel temer deveria ser cassado por intimidar e atrapalhar as investigaçoes. a Lei é feita para todos ,e ninguem esta acima dela.