“A ciência vencerá. A fraternidade vencerá. A medicina vencerá e vocês estarão protegidos”, diz um trecho do documento intitulado “Carta de Natal do Conass às crianças do Brasil”
Os Secretários estaduais de Saúde anunciaram que não vão seguir as orientações do governo Bolsonaro e do ministro da Saúde Marcelo Queiroga quanto à exigência de receita e de consentimento dos pais para vacinar as crianças contra a Covid-19. Bolsonaro é contra as vacinas e o governo federal está protelando o início da vacinação nas crianças, uma medida que já começou em praticamente todo o mundo.
Queiroga repete o que manda Bolsonaro, que não quer a vacinação das crianças. Em obediência, ele inventou a exigência da receita médica, medida jamais utilizada em nenhuma campanha de vacinação no país. Na quinta-feira, 23, ele disse que “(Para) as sem comorbidades, há necessidade de prescrição médica”. “O documento que vai ao ar é um documento que recomenda a vacina da Pfizer. Nossa recomendação é que não seja aplicado de forma compulsória. Essa vacina estará vinculada à prescrição médica, e a recomendação obedece às orientações da Anvisa”, acrescentou Queiroga
Bolsonaro, que conseguiu que seu ministro fizesse todas as suas vontades, saiu repetindo. “Eu não sou médico, mas tenho uma filha de 11 anos. Mas já tinha respondido, tenho um médico do meu lado aqui [governador de Goiás, Ronaldo Caiado]. Eu acho que qualquer procedimento tem que passar pelas mãos do médico, tá ok?”, disse Bolsonaro.
Apesar da recomendação do governo federal, quem define como será a vacinação e quais regras devem ser aplicadas são estados e municípios. Após reunião nesta manhã, o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass) afirmou que não será necessário apresentar uma prescrição médica para vacinação infantil.
O órgão se reuniu nesta sexta-feira (24) para preparar uma reação à determinação do Ministério da Saúde pela prescrição médica para vacinação de crianças. O posicionamento do órgão foi publicado na forma de carta às crianças.
“E é esse recado que queremos dar no dia de hoje, véspera de Natal: quando iniciarmos a vacinação de nossas crianças, avisem aos papais e às mamães: não será necessário nenhum documento de médico recomendando que tomem a vacina. A ciência vencerá. A fraternidade vencerá. A medicina vencerá e vocês estarão protegidos”, diz um trecho do documento intitulado “Carta de Natal do Conass às crianças do Brasil”.
O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, afirmou – em uma publicação no Twitter – que não vai exigir atestado médico para a vacinação de crianças na capital fluminense. A informação foi divulgada após o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, dizer que o ministério recomendará que as crianças de 5 a 11 anos sejam vacinadas desde que haja prescrição médica e assinatura de termo de consentimento pelos pais.
O argumento de Paes é que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) aponta como atribuição do Sistema Único de Saúde (SUS) a prevenção de doenças na população infantil a partir de vacinação. “Aqui não vai precisar de atestado para vacinar crianças não. Vejam o que diz o parágrafo primeiro do art 14 do Estatuto da Criança e do Adolescente”, afirmou Paes, publicando um trecho do ECA. O parágrafo único do estatuto, por sua vez, afirma que “é obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias”.
Outra maneira de protelar a decisão sobre o início da vacinação das crianças foi a realização de uma inusitada consulta pública sobre o assunto. Nunca houve no país uma consulta para leigos sobre uma decisão técnica, aprovada por todos os órgãos técnicos do ministério responsáveis pelo assunto. Além disso, as perguntas foram feitas para induzir as pessoas a se posicionarem contra a vacinação.
Veja algumas perguntas da “consulta”
1– “Você concorda com a não obrigatoriedade da apresentação de carteira de vacinação para que as crianças frequentem as escolas ou outros estabelecimentos comerciais?”
2– “Você concorda com a priorização, no Programa Nacional de Imunização, de crianças de 5 a 11 anos com comorbidades consideradas de risco para COVID-19 grave e aquelas com deficiência permanente para iniciarem a vacinação?”
3– “Você concorda que o benefício da vacinação contra a COVID-19 para crianças de 5 a 11 anos deve ser analisado, caso a caso, sendo importante a apresentação do termo de assentimento dos pais ou responsáveis?”
4– “Você concorda que o benefício da vacinação contra a COVID-19 para crianças de 5 a 11 anos deve ser analisado, caso a caso, sendo importante a prescrição da vacina pelos pediatras ou médico que acompanham as crianças?”
No último dia 16, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovou o uso da vacina da Pfizer em crianças de 5 a 11 anos. Além da Anvisa, todas as entidades médicas do país se posicionaram pela imediata vacinação das crianças. Tentando atropelar esses órgãos todos, o ministro realizou uma reunião no início da semana onde somente pessoas contrárias à vacinação das crianças foram convidadas.
O microbiologista e pesquisador Atila Iamarino afirmou na segunda-feira (20) que somente o negacionismo explica a postura do governo federal sobre a vacinação contra a covid-19 de crianças entre 5 e 11 anos. Segundo ele, não há necessidade de realização de uma audiência pública para a decisão, já que diversas sociedades médicas já foram consultadas sobre o tema.
“Negacionismo. É a única palavra que eu sei usar para rotular isso que está acontecendo. Os resultados que a Pfizer apresentou nos Estados Unidos e aqui, no Brasil, dos testes de segurança já eram suficientes para aprovação dessa vacina para uso permanente”, disse.
O questionário sobre a vacinação de crianças de 5 a 11 anos contra a Covid-19 usado para a consulta pública entrou no ar na manhã desta quinta-feira e ficou fora dor ar por cerca de quatro horas. O Ministério da Saúde ainda não informou o motivo de o formulário estar indisponível. A consulta ficaria aberta até 2 de janeiro. O questionário é formado por 19 perguntas, algumas alinhadas com o que o ministério tem dito sobre vacinação para este público, como exigência de prescrição médica para imunizar crianças.