Debochada convocação da “Festa para Macron” lota a Praça da Bastilha e exibe verdadeira face do “presidente dos ricos” em versões hilárias: Drácula, Luis XVI, Júpiter e Margareth Thatcher
“Um ano basta”: 100 mil em Paris e mais dezenas de milhares em Tolouse, Bordeaux, Lyon, Estrasburgo e Rennes atenderam no sábado (5) à debochada convocação da “festa para Macron”, pelo primeiro ano no governo do “Presidente dos Ricos” e suas famigeradas reformas.
Na véspera do bem-humorado “Fora Macron” à francesa, mais um dia da greve dos ferroviários contra a privatização e supressão de direitos, enquanto estudantes mantinham várias universidades sob ocupação contra a elitista ‘reforma educacional” e os servidores públicos continuavam em pé de guerra contra 120 mil demissões anunciadas. Também não cessa o repúdio à reforma da lei trabalhista.
Macron, que montou um ‘partido’ prêt-à-porter para se candidatar, só foi eleito graças ao embuste da “ameaça de Le Pen” e se dizer “centrista”. Uma vez no poder, exercitou exemplarmente seu “centrismo”: cortou os direitos dos trabalhadores e os impostos dos ricos, para abrir caminho para sua “França moderna”. Não esconde que o próximo alvo das suas ‘reformas’ serão os aposentados.
A idéia da “Festa para Macron” partiu do deputado François Ruffin e dos organizadores da “Nuit Debout”, uma espécie de lual que agitou as noites francesas durante a resistência de 2016 ao pacote antitrabalhador do então presidente Hollande, que agora Macron busca piorar. No 1º de Maio, confrontos de black blocks com policiais serviu de pretexto a que o governo acusasse cinicamente o movimento França Insubmissa, que nada tem a ver com os black blocks, de “violento”.
Provavelmente, Macron teria preferido mais porretadas e gás lacrimogêneo. Foi exibido nas ruas de Paris em versões hilárias, que expuseram os recônditos de sua alma: Luis XVI (o guilhotinado, cuja esposa dizia aos pobres ‘comam brioches’), Drácula, Júpiter e Margareth Thatcher. A convocação para a manifestação incluía um “pot-au-feu” (“panela no fogo”), um cozido típico francês, que não deve ser do agrado do refinado paladar do ex-funcionário dos Rothchilds.
Significativamente, a “festa” que começou na Praça da Ópera foi encerrada na Praça da Bastilha – local, segundo Macron, responsável pelo “vazio existencial dos franceses” desde que guilhotinaram o rei. Provavelmente por causa dos brios feridos, não se viram nas marchas menções à “amizade proibida” de Macron com Trump. O sucesso da mobilização animou os organizadores, os partidos de oposição – comunistas, França Insubmissa e outros – e entidades progressistas e centrais sindicais a trabalharem por um novo ato, no dia 26.
Na Praça da Bastilha, o deputado Jean-Luc Mélenchon, que como candidato a presidente das forças de esquerda obteve quase 20% dos votos, saudou “os assalariados da Air France, os funcionários dos hospitais públicos, os estudantes, os advogados” – os principais setores mobilizado no momento para a resistência a Macron e seu neoliberalismo.
Macron tem dito que “não abre mão de nada” da sua privatização da SNFC, a estatal da rede de trens, inclusive dos afamados de alta velocidade, mas os trabalhadores já completaram 14 dias de paralisação (dois dias a cada cinco trabalhados) e em um mês uma coleta pela internet para o fundo de greve angariou 1 milhão de euros. Sua “reforma educacional” elitista provocou a indignação dos estudantes, que ocupam universidades, são desalojados pela polícia e voltam a ocupar. O presidente da União Nacional dos Estudantes Secundaristas franceses, Louis Boyard, denunciou que o governo é “hipócrita ao dizer que não há meios” para garantir a tradição igualitária da Quinta República, de De Gaulle, de oferecer educação superior para todos. Também os advogados repudiam sua “reforma do judiciário”.
O que já se reflete nos índices de popularidade medidos pelas pesquisas. Desde a posse, perdeu mais de 20 pontos e, segundo a mais recente pesquisa do instituto Odoxa, 60% dos franceses não querem que se candidate à reeleição em 2022 – ou seja, repete o trajeto do falido Hollande. A imagem que surge dessas inquirições é a de um presidente arrogante e “dos ricos”. Como denunciou Ruffin, um “Robin Hood às avessas que tira dos pobres para dar aos ricos”.
A política externa de Macron é outro desastre. Embarcou caninamente no ataque com mísseis à Síria sob um pretexto fabricado (o inexistente ‘ataque químico’ em Douma), faz malabarismos para continuar servil a Trump e manter os contratos bilionários de venda ao Irã e simula que está na boleia da União Europeia ao lado de Frau Merkel. O anúncio de que tropas especiais francesas estavam operando, com os americanos, no norte da Síria, partiu do Pentágono, e não de Paris. Com tudo isso, Mélenchon acredita ser hora de uma “maré popular” para derrotar o afetado neoliberal que infelicita os franceses e atende aos bancos.
ANTONIO PIMENTA