Medidas anunciadas há uma década e que poderiam ter reduzido impacto das chuvas não avançaram
O impacto e a intensidade dos deslizamentos provocados pelas intensas chuvas em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro nesta terça-feira (15), que até o momento contabilizam 94 mortes, remetem à tragédia de 2011 na região. Na época, mais de 900 pessoas morreram e quase 100 estão ainda desaparecidas.
Os dias que sucederam à catástrofe de 11 de janeiro registravam intensa movimentação de militares e equipes de resgate por toda parte, ante a ameaça de novos desabamentos e mortes, com montanhas marcadas pelos deslizamentos, destroços, lama e poeira espalhados pelas ruas; bairros foram completamente devastados e imóveis que nunca se imaginaria que seriam abalados, ruíram.
Na ocasião, cerca de 35 mil pessoas perderam suas casas ou tiveram que deixá-las por risco de deslizamento. Os temporais também destruíram hotéis de luxo da região, que é turística. A ONU classificou o acontecimento como um dos dez piores deslizamentos do mundo em 111 anos.
Desta vez, se providências necessárias para enfrentar a tragédia tivessem sido adotadas, os danos poderiam ter sido minimizados. A Defesa Civil do Rio de Janeiro recebeu um alerta de possibilidade de “chuvas isoladas ao longo do dia, podendo deflagrar deslizamentos pontuais, especialmente nas regiões de serra e/ou densamente urbanizadas” na região Serrana do Rio de Janeiro, onde fica a cidade, conforme reportagem da Folha de São Paulo.
O comunicado foi feito na segunda-feira (14) pelo Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais), o que deveria ter levado as autoridades a retirarem os moradores do local, diz Paulo Artaxo, professor titular do Instituto de Física da USP e vice-presidente da Academia de Ciências do Estado de São Paulo. “Se há um alerta de chuva forte em uma região sabidamente de risco, a primeiríssima coisa a se fazer é retirar todo mundo desse local”, disse Artaxo.
Choveu na região em poucas horas 258mn, mais do que era esperado para todo o mês de fevereiro. Para o físico, a evacuação não ocorreu porque a Defesa Civil do Rio de Janeiro não está preparada para lidar com uma situação como essa. “Uma década depois do desastre de 2011 e isso volta a acontecer. O contexto climático, chuva e região de risco, é similar ao de dez anos atrás e ainda assim vivemos mais um desastre.”
Apesar de ter havido avanços, como a instalação de sirenes na região e o monitoramento de áreas de risco após a criação do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais) em 2011, a Defesa Civil não está preparada para agir, avalia Artaxo. “De nada adianta monitorar o risco se a Defesa Civil não for capaz de atuar. As defesas civis brasileiras precisam quadruplicar de tamanho urgentemente”, defende.
O meteorologista José Marengo, coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Cemaden, os deslizamentos foram previstos e notificados à Defesa Civil do estado, mas a magnitude pegou a todos de surpresa”, alega.
Na tragédia de 2011, alguns pontos da região serrana do Rio de Janeiro registraram cerca de 200 mm de chuva em um dos dias mais chuvosos de janeiro daquele ano. No dia 24, as prefeituras já haviam resgatado mais de 800 corpos. Em Itamaraju, no sul da Bahia, uma década mais tarde, em apenas um dia foram registrados cerca de 324 mm de chuva. No fim do mês, o número de mortos chegava a 24 e pelo menos 58 cidades haviam sido afetadas.
Apesar disso, o país ainda não se preparou para enfrentar essas situações, critica Artaxo. “Escolas foram varridas do mapa ontem em Petrópolis. Essas crianças vão perder um ano de suas vidas por causa de um desastre que poderia ter sido evitado se o Brasil tivesse aprendido a lição após 2011. O Cemaden precisa crescer e receber verba.”
Além do Rio de Janeiro e da Bahia, outros estados brasileiros têm enfrentando chuvas intensas, com desabamentos, mortes e milhares de desabrigados neste início do ano, como Minas e São Paulo. Outras unidades da Federação também têm sido castigadas pelos fortes temporais. Na região Norte, três delas sofreram com a cheia do rio Tocantins: Maranhão, Pará — com a pior enchente dos últimos 20 anos em Marabá —, e Tocantins, que chegou à situação de emergência em todo o estado.
Bolsonaro cortou a verba para ações de prevenção a desastres naturais
Em contrapartida, o governo Bolsonaro, confirma a sua falta de empatia e compromisso pelo povo brasileiro, reduzindo em 75% o orçamento de 2021 para ações de prevenção a desastres naturais do Ministério de Desenvolvimento Regional. O órgão é principal responsável por programas para conter eventos climáticos extremos. O recurso diminuiu de R$ 714 milhões em 2020 para R$ 171 milhões no ano passado.