Como a China se relaciona com a América Latina é a pergunta que o pesquisador e escritor Elias Jabbour responde no Meia Noite em Pequim desta semana, pela TV Grabois.
A América Latina é um continente que é fundamental no mundo, destaca o pesquisador, tem três dos maiores países do mundo em extensão territorial, Brasil, Argentina e México, e é altamente estratégica em termos de petróleo. A agricultura de maior produtividade do mundo é a brasileira, assim como a pecuária. Tem também a Argentina. A localização da América Central é ultra estratégica.
Lembrando a teoria de Lenin do “elo débil do imperialismo”, Jabbour assinala que na atualidade esse ponto mais débil da cadeia imperialista é a América Latina. É aqui – ele prevê – que as lutas de classe deverão ocorrer em maior intensidade em um futuro muito próximo. Também na África e na Ásia, mas aqui há a especificidade de ser mais próximo dos Estados Unidos, que nos vê como extensão do território dele.
Isso possibilita situar o grau de tensão que existe nas relações entre a China e a América Latina sob o conflito de interesses com os Estados Unidos. Como quando ela passa a ser o principal parceiro comercial de vários países da América Latina.
A América Latina foi na década de 1990 a região do mundo onde a violência neoliberal se abateu da forma mais acentuada. Com o neoliberalismo prometendo mundos e fundos em troca da soberania de países como o Brasil, Argentina e México, que eram países que tinham conseguido êxitos em industrialização e substituição de importações.
Tamanha devastação acarretou protestos e levou a uma onda de governos progressistas na América Latina. Há a reaproximação da região com a China, diante do aumento das necessidades chinesas de commodities agrícolas e energéticas.
Em grande medida, a China passou a ser um mercado alternativo para as commodities latino-americanas, a América Latina passou a ter certo poder de escolha no comércio internacional, fortaleceu-se muito o comércio Sul-Sul.
Para Jabbour, essas relações China-América Latina são boas, mas ele não deixa de alertar que, em longo prazo, pode acarretar uma forma de dependência.
Muitos dirigentes latino-americanos, inclusive os progressistas, têm uma visão muito pouco estratégica sobre a necessidade do processo de industrialização. Aspecto em que se destaca a Bolívia, com a participação da indústria no PIB crescendo muito mais do que nos outros países da América Latina.
A América Latina precisa de investimentos produtivos e infraestrutura, assinala o pesquisador, e o único país do mundo que está se dispondo a fazer isso na América Latina é a China. A integração física da América Latina quem vai acabar fazendo é a China, prevê Jabbour, lamentando que não seja o Brasil.
Para ele, a América Latina deveria ter uma relação como bloco com a China, sob uma visão mais estratégica, e colocando em outro patamar os termos das negociações em torno de comércio e investimento. Não podemos nos contentar com venda de commodities para a China, ele alerta
Como exemplo de por onde avançar, Jabbour destaca o acordo China-Irã, que na prática troca petróleo por industrialização e infraestrutura. Isso é reverter a tendência de deterioração dos termos de troca.
O Paquistão vai no mesmo caminho, também a Etiópia, porque a China tem uma capacidade muito grande de se adequar a projetos nacionais autônomos. Para Jabbour, é nesse contexto que devem ser pensadas as relações da América Latina com a China.
Elias Jabbour é professor dos Programas de Pós-Graduação em Ciências Econômicas e em Relações Internacionais da UERJ.