Principal redução foi nos leitos de psiquiatria, pediatria e obstetrícia. Governo diz não ver problema no corte
O Sistema Único de Saúde (SUS) perdeu 34 mil leitos hospitalares, nos últimos oito anos, segundo dados levantados a partir do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde do Ministério da Saúde.
Os dados se referem ao período entre 2010 e 2018, governos da então presidente Dilma (PT) e o atual Temer (PMDB), onde a redução de leitos atingiu principalmente a psiquiatria, a pediatria clínica, a obstetrícia e a cirurgia geral. Em março de 2010, o Brasil tinha 336.842 leitos de internação para uso exclusivo do SUS. Em março deste ano, esse número reduziu para 302.524 leitos, uma queda de 10%.
Percentualmente, o estado do Rio de Janeiro foi o que mais perdeu leitos: foram 9 mil leitos fechados no período, o que representa uma queda de 28%. Em situação proporcionalmente semelhante, está o estado de Sergipe que perdeu 500 leitos, significando uma diminuição de 19% da capacidade de internação do SUS.
Dos 26 estados e Distrito Federal, apenas cinco aumentaram o total de leitos de internação: Rondônia (25%), Roraima (12%), Amapá (11%), Tocantins (10%) e Mato Grosso (8%).
A divulgação destes números alarmantes da saúde pública brasileira é convergente com o dossiê do abandono do SUS elaborado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e entregue ao ministro da Saúde, Ricardo Barros, em julho do ano passado.
O CFM considera que as medidas adotadas pelo governo, como o congelamento nos investimentos e arrocho nas verbas de custeio agravam a crise na rede pública de saúde. Entre as principais dificuldades está a falta de verba, a redução no número de leitos, falta de medicamentos e sucateamento da infraestrutura.
TERAPIA INTENSIVA
Apenas 505 municípios brasileiros possuem Unidades de Terapia Intensiva (UTI), ou seja, 10% do total. Isso deixa sem esse tipo de cobertura os moradores das outras 5.065 cidades.
Segundo o levantamento do CFM, em 70% dos estados não há o número de leitos de UTI preconizado pelo Ministério da Saúde para garantir o bom atendimento de sua população. Entre eles está Santa Catarina.
Na avaliação do 1º vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM) Mauro Ribeiro, um dos lados mais desumano e perverso dentro do caos que assola a saúde pública no Brasil está na falta de leitos de UTI, onde pacientes entubados em ventiladores improvisados morrem de causas evitáveis.
“Por mais que os médicos e toda a equipe multiprofissional se dediquem a salvá-los, esses pacientes não estão onde deveriam estar. A gama instrumental de uma UTI, aliada à capacidade da equipe que atua nela, permite que muitas pessoas sejam salvas”, afirmou Ribeiro.
Se consideradas as unidades públicas, o SUS conta com 0,95 leitos de UTI para cada grupo de 10 mil habitantes. Mas de acordo com a Portaria Ministerial nº 1.101/2002, o correto era existir de 2,5 a 3 leitos hospitalares por cada 1 mil habitantes. Já a oferta necessária de leitos de UTI deveria ficar entre 4% e 10% do total de leitos hospitalares, o que corresponde a um índice de um a três leitos de UTI para cada 10 mil habitantes.
“Todos os dias nós, médicos, testemunhamos a morte de pessoas que poderiam ser salvas pela disponibilidade de um leito de UTI. Para os governos, quando um paciente morre, trata-se apenas de mais um número. Para a família, no entanto, é uma tragédia”, critica Mauro Ribeiro.
SUBFINANCIAMENTO
De acordo com o Conselho Federal de Medicina, as denúncias e números negativos apresentados no dossiê têm origem na má gestão e no baixo comprometimento do Estado com as despesas em saúde no País. Conforme o último relatório divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é terceiro pior das Américas em termos de gastos públicos com a área.
Os dados revelam que, em 2014, apenas 6,8% do orçamento público brasileiro foi destinado à saúde, sendo a terceira pior taxa entre os 35 países que compõem os continentes americanos – a frente apenas do Haiti e da Venezuela e abaixo da média mundial (11,7%).
O levantamento também aponta que, ao longo dos anos, o percentual gasto pelo Governo com saúde no Brasil oscilou entre 4,1% (2000) e 9,9% (2010), incluindo as três esferas de gestão (União, Estados e Municípios). Atualmente, a taxa brasileira é também inferior à média do que se gasta na África (9,9%), dividindo a posição no ranking com Gana, Tajiquistão, Omã e Mongólia.
Análise do Conselho Federal de Medicina (CFM) mostra ainda que, entre 2003 e 2016, o Ministério da Saúde (MS) deixou de aplicar cerca de R$ 155 bilhões no SUS. No período apurado, cerca de R$ 1,5 trilhão foi autorizado para o Ministério da Saúde no Orçamento Geral da União (OGU). Os desembolsos, no entanto, foram de R$ 1,3 trilhão (89% do previsto).
RESPOSTA
Já o Ministério da Saúde diz que não há preocupação em ampliar o número de leitos do SUS. A atual gestão, assim como a de Dilma Rousseff (PT), afirma que o necessário é “melhorar a ocupação dos leitos existentes”.
“O Ministério da Saúde informa que aproximadamente 60% dos hospitais que atendem SUS são de pequeno porte e, nessas unidades, a taxa média de ocupação dos leitos é de 30%. Dessa forma, a discussão atual é melhorar a ocupação dos leitos existentes”, diz a nota do MS.