Depois de prometer zerar as filas pra exames médicos durante a campanha eleitoral, João Dória (PSDB) deixa a Prefeitura de São Paulo para disputar o governo do Estado e as filas mais que dobraram.
Pouco mais de um ano depois de se eleger, os moradores da periferia continuam sem sentir a presença do poder público ao procurar atendimento médico, diferente do que havia sido prometido pelo tucano.
Apesar de admitirem que fazer exames ficou mais rápido durante o Corujão da Saúde, mutirão de três meses criado pelo ex-prefeito para reduzir a fila destes procedimentos, conseguir realizar uma consulta com um médico é um martírio. O número de pedidos nesta fila aumentou 173% no último ano, segundo os dados atualizados da Prefeitura.
Na semana passada, Ivonizete Nunes dos Santos, de 52 anos, deixou a Unidade Básica de Saúde (UBS) São Mateus I com uma guia exibindo a data da sua próxima consulta com um ginecologista: 23 de outubro de 2018, ou seja, em pouco mais de cinco meses. “O problema está sério aqui. Antes tinha psicólogo, agora não tem. Ortopedista também só em outra unidade. Eu moro neste bairro há 37 anos e uso este posto de saúde há 30. A cada gestão que passa parece que piora”, afirmou ela ao jornal “El Pais”.
“Os exames, de fato, melhoraram, antes a gente esperava meses. Mas de que adianta, se não tem médico? Tenho problema cardíaco, fiz os exames e demorei um ano para conseguir passar no cardiologista outra vez. Quando consegui, tive que refazer alguns deles porque já não valiam mais”, disse Ivonizete.
O Corujão da Saúde aconteceu em parceria com a iniciativa privada, realizando exames dos pacientes do SUS de madrugada, em horários que o equipamento privado não estivesse em uso. Mas, fazer exames na rede municipal de São Paulo, após os três meses do mutirão Corujão da Saúde, voltou a demorar em média quatro meses.
O prazo de 60 dias havia sido informado por Doria como adequado para os exames, mas em fevereiro de 2018, do total de 163.473 exames na fila, 130.474 demoravam mais do que 60 dias. Já a fila de consultas tinha, no período, 687.037 em espera. Dentre os procedimentos, 647.584 estavam acima do prazo. Das 106.582 consultas de avaliação cirúrgica na fila, 77.760 tinham tempo médio maior do que 60 dias.
Depois de eleito, Doria focou o Corujão apenas em um grupo de diagnósticos de imagem, como ultrassonografia e ressonância e em setembro anunciou que já havia feito mais de 1 milhão de diagnósticos pelo programa. Porém, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde, de julho de 2017 até fevereiro de 2018, três dos cinco exames incorporados pelo Corujão tiveram aumento na espera.
A mamografia passou de 18 dias para 42. A ecocardiografia transtorácica, passou de 43 dias para quase 75 dias em média. A densitometria óssea foi de 45 dias para No caso das ultrassonografias, de 15 tipos informados, 9 tiveram piora no tempo de espera e 6 melhoraram.
Para Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da USP, os dados sobre a fila da saúde mostram que programas como o Corujão apenas “enxugam gelo”. “Parece que esse primeiro momento de parceria privada foi muito mais um marketing do que uma política consistente e sólida”, disse o professor ao jornal “Folha de S.Paulo”.
O professor ressaltou que para reduzir a fila de forma consistente é preciso investir principalmente em quatro direções: “ampliar a oferta pública de serviços de saúde; melhorar a atenção primária, para evitar que o quadro do paciente se agrave e ele tenha que fazer exames e novas consultas com especialistas; melhorar a transparência, informando o lugar de cada pessoa na fila; e cumprir a promessa de contratar 800 médicos”.
O compromisso foi outro descumprido por Doria.