“Pedro Parente foi escolhido a dedo por Temer porque tinha experiência em promover apagão e o desabastecimento. É isso o que ele sabe fazer muito bem”, disse o professor Ildo Sauer, vice-diretor do Instituto de Energia e Ambiente da USP, ao comentar o impasse criado pelos sucessivos aumentos nos preços do diesel praticados por Parente e os caminhoneiros em greve. Pedro Parente foi chefe da Casa Civil do governo FHC e foi nomeado para chefiar o Ministério do Apagão. Ele ficou conhecido como “ministro do apagão”.
“Os trapalhões do governo estão num beco sem saída. E tudo sempre para atender os interesses dos grupos financeiros e dos grandes grupos econômicos”, denunciou Sauer. “Parente é um serviçal do neoliberalismo e faz qualquer artimanha para cumprir esse papel”, prosseguiu o especialista. “Por isso que ele foi escolhido a dedo por este governo, me parece que pela experiência que tinha”, ironizou o professor Ildo Sauer.
Ele denunciou que “há um esquema grave acontecendo”. “Deliberadamente a Petrobrás decidiu praticar preços que incentivaram a importação de derivados pelos operadores privados multinacionais que estão aqui dentro e, inclusive, para a Petrobrás não operar, ou para operar abaixo da sua capacidade”, destacou Sauer. Ou seja, segundo Ildo, as refinarias brasileiras estão sendo sabotadas pela importação de derivados, incentivada pelo governo.
A Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet) denunciou que, com o atrelamento aos preços internacionais e o incentivo às importações, a estatal vem perdendo “com a ociosidade de suas refinarias e a entrega da sua participação no mercado brasileiro de combustíveis. Perde a maioria dos brasileiros que consome, direta e indiretamente, os combustíveis com preços majorados. Perde a União e os estados federados com os impactos recessivos e da arrecadação causados por preços elevados dos combustíveis”.
Segundo a Aepet, com os preços mais altos, abre-se espaço para a importação por concorrentes. “A estatal perdeu mercado e a ociosidade de suas refinarias chegou a um quarto da capacidade instalada. A exportação de petróleo cru disparou, enquanto a importação de derivados bateu recordes. O diesel importado dos EUA, que em 2015 respondia por 41% do total, em 2017 superou 80% do total importado pelo Brasil”, diz a entidade. As refinarias estão sendo paralisadas pelos efeitos da importação incentivada e já se fala até em privatizá-las.
Ildo Sauer lembra que “a capacidade de refino não vai mais ter condições de atender a demanda, por causa dos fiascos na expansão da capacidade de refino”. “Abreu e Lima, as duas do Maranhão e Pernambuco, o Comperj, tudo isso foi um desastre de gestão promovido a partir de 2008/9 com a hegemonia da senhora Rousseff na Petrobrás”, observou. “Depois que ela conseguiu nos ejetar de lá, ficou essa lambança e não expandiram a capacidade de refino”.
“Agora, num aceno muito claro de que a principal missão da Petrobrás é atender os interesses dos acionistas do Brasil e do exterior, que têm seus porta-vozes na grande imprensa diariamente defendendo isso, a Petrobrás exporta óleo que ela produz e importa e usa apenas uma parte da sua capacidade de refino para permitir que as outras ocupem espaço”, disse o professor. “Isso é coerente com a política anunciada de privatizar parte da capacidade de refino para criar um mercado aberto e também, ironicamente, é a estratégia que garante rentabilidade para a Petrobrás porque a maior margem do lucro da Petrobrás está em produzir petróleo e exportar”, acrescentou Sauer. “O importante é quem se apodera desse lucro”, alerta.
Para Ildo, esta estratégia “cai como uma luva nas ambições daqueles grupos que são os verdadeiros patrões desse governo”. “Esse sistema político partidário não passa de um grupo de capitães do mato organizados para subjugar a população brasileira aos grandes interesses empresariais e financeiros internos no Brasil e externos”, observa.
Ildo Sauer explica que a CIDE era para equilibrar as diferenças de preços internos e externos, mas, segundo ele, ela foi deformada. “Você tem um fundo rotativo com o qual, quando os preços aqui dentro estão acima do mercado internacional, por uma conjuntura, por causa da taxa de câmbio ou por causa dos preços que baixam no exterior, etc, você então acumula, você cobra um valor sobre os derivados, isso vai para um fundo. Quando há uma emergência como agora, esses fundos são usados periodicamente para compensar”, explicou. “Isto faz com que se faça o acompanhamento em relação à flutuação internacional. As variações ficam atenuadas por este fundo. No final ele se torna neutro, se bem administrado, e evita aumentos, etc. E permite também outras finalidades, aumentar a produtividade, etc. É legítimo que ele use parte do valor do excedente econômico – diferença entre o custo de produção e o valor dos derivados que o petróleo permite – para fazer políticas públicas transparentes e claras de engendrar novos segmentos, novos setores. Isso tudo eu considero legítimo num governo democrático e desenvolvimentista”. Mas, para Ildo, interesses escusos deturparam a ideia da CIDE.
O governo prioriza servir aos acionistas, que são aqueles que no longo entardecer do neoliberalismo, que aconteceu entre os anos 80 e 90, mas que foram consolidados nos governos do PT, mais se beneficiaram. “Do ponto de vista político são três grupos. O primeiro são os acionistas e os grupos externos, com a privatização, com a política do Banco Mundial , com o Concenso de Washington, conseguiram construir uma trajetória política e progressivamente se tornar controladores acionistas de grande parte desses segmentos da economia”, disse o professor da USP. Os outros são a população, dona de tudo e os consumidores.
“Há uma disputa em torno do valor que é produzido. Seja a mais valia na disputa pelo trabalho, seja no excedente econômico criado na produção de energia elétrica e do petróleo. Há um lucro extraordinário. A Petrobrás produz a 10 dólares e exporta a 80 dólares. Um lucro muito grande. Só que 52% do lucro é para privados, 30% na bolsa de Nova Iorque”, explicou Ildo. “Em 2000 o senhor Fernando Henrique Cardoso vendeu 30% da Petrobrás que, então, valia 15 bilhões de dólares por 5 bilhões de dólares. Vendeu um terço da Petrobrás e esses acionistas estão lá no exterior”, prosseguiu.
“É uma disputa entre três grandes grupos de interesses. Primeiro os acionistas que querem controlar esse segmento e maximizar o seu retorno. É o que tem acontecido ultimamente. O segundo grupo de interesses são os consumidores, isto é aqueles que usam a eletricidade, que usam o diesel, que usam a gasolina, que usam o GLP, que usam a Nafta. Segundo Sauer, “é legítimo que os consumidores queiram pagar menos. Agora, o terceiro grupo que é vitima dos dois lados é o grupo da população brasileira que, pela Constituição é, de fato, a dona dos potenciais hidráulicos, dona das jazidas de petróleo do país”.
“O PT não mudou a política, que tinha 20 anos. Tínhamos que resguardar o valor que a população tinha direito na retribuição justa pela utilização de seus recursos naturais. Que pertencem à geração futura. E todo o petróleo produzido agora, que não estará mais aqui, daqui a um, dois três, dez ou vinte, trinta anos, deverá ter deixado no seu lugar uma riqueza maior do que se permanecesse”, defendeu Ildo. “Isto não está acontecendo. Então há uma traição inter-geracional. As gerações futuras estão sendo subtraídas nos seus direitos pela geração atual para fazer isso”, denunciou.
“O segundo problema é que, num país que tem tantas carências, tem que buscar um equilíbrio entre a geração do excedente econômico para aplicação direta para fins públicos, como educação, saúde, reforma urbana, agrária, ciência e tecnologia, todas aquelas prioridades. Tem que ter dinheiro direto para esses programas. E a outra parte para manter o sistema econômico funcionando com eficiência, com aumento de produtividade e geração de emprego, porque nós temos que garantir uma transição desse sistema”, prosseguiu o professor.
Parente está, portanto, dando sequência em seu trabalho de serviçal. Ele fez isso na época de FHC e sua política, se uma forma ou de outra, prosseguiu e não foi modificada. “Nem FHC, nem Dilma, nem Lula, nem Temer. Nenhum deles serviu aos interesses do povo. Todos eles escolheram seus parceiros, a quem se subjugaram, e instrumentalizaram a Petrobrás e a Eletrobrás para fazer esse serviço de capitães do mato”, completou Ildo Sauer.