Governo amplia corte no orçamento para R$ 8,7 bilhões e, em um ano, transfere R$ 206,7bilhões dos cofres públicos para pagamento de juros. Reajuste para servidores nem pensar
O governo Bolsonaro anunciou na segunda-feira (6) um corte de mais R$ 6,965 bilhões no orçamento dos ministérios. O Ministério da Ciência e Tecnologia sofreu o maior corte, no valor de R$ 2,5 bilhões, seguido pela pasta da Educação (R$ 1,59 bilhão), Saúde (R$ 1,25 bilhão) e Defesa (R$ 706 milhões).
Enquanto isso, sobra dinheiro para dar para os bancos. Em um ano, a transferência de recursos públicos para o pagamento de juros subiu R$ 206,7 bilhões. De acordo com dados do Banco Central (BC), em 12 meses até abril, foram sangrados dos cofres públicos R$ 489,4 bilhões, o que corresponde a 5,42% do PIB brasileiro. No mesmo intervalo de tempo de 2021, o gasto do governo com os juros foi de R$ 282,7 bilhões (3,60% do PIB).
Desde março de 2021, o BC vem elevando a Selic, hoje em 12,75% ao ano, a pretexto de controlar a inflação – que continua desenfreada corroendo o poder de compra da população. Pressionado pela alta dos combustíveis – que são administrados pelo governo federal – a inflação medida pelo IPCA registrou alta de 1,06% em abril – a maior para o mês desde 1996 – e acumula alta de 12,13%, em 12 meses.
A tesourada de Bolsonaro no orçamento de 2022 visa garantir o “cumprimento da regra do teto de gastos”, que congelou por 20 anos o crescimento das despesas obrigatórias do governo, limitando seu reajuste ao índice de inflação do ano anterior. Em março, o governo Bolsonaro já havia cortado R$ 1,722 bilhão das chamadas emendas de relator. Dessa forma, o corte total anunciado em 2022 até agora é de R$ 8,687 bilhões.
Veja as pastas que tiveram cortes em seus orçamento
1. Ciência, Tecnologia e Inovações: R$ 2,5 bilhões
2. Educação: R$ 1,59 bilhão
3. Saúde: R$ 1,25 bilhão
4. Defesa: R$ 706,9 milhões
5. Infraestrutura: R$ 199,8 milhões
6. Relações Exteriores: R$ 120,6 milhões
7. Desenvolvimento Regional: R$ 149,8 milhões
8. Justiça e Segurança Pública: R$ 117 milhões
9. Cidadania: R$ 94,49 milhões
10. Comunicações: R$ 87,39 milhões
11. Minas e Energia: R$ 46,9 milhões
12. Turismo: R$ 36,55 milhões
13. Presidência da República: R$ 25 milhões
14. Banco Central do Brasil: R$ 18,73 milhões
15. Mulher, da Família e dos Direitos Humanos: R$ 9,65 milhões
CALAMIDADE
O corte nas despesas discricionárias das universidades federais equivale a 7,2%. Essas despesas englobam gastos com custeio (como luz, água, telefone, pagamento de terceirizados e verba para pesquisas e assistência estudantil) e investimentos em infraestrutura das instituições.
Em audiência na Comissão de Educação da Câmara, na segunda-feira (6), reitores de universidades e representantes de entidades ligadas à Ciência e Tecnologia denunciaram que sob o governo Bolsonaro as instituições de ensino superior vêm enfrentando ano a ano cortes em seus orçamentos.
A reitora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Sandra Almeida, ao destacar que em 13 anos a UFMG cresceu em seu número de matrículas e na sua estrutura, disse que o orçamento da instituição parou no tempo. “Com um orçamento que, no caso da UFMG, está de volta aos patamares de 2009. Quer dizer, não dá, não tem como nós sustentarmos este tipo de contexto”, declarou a reitora.
“Nós estamos hoje maiores: 45% de aumento de matrículas, comparado ao que nós tínhamos antes do Reuni [Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais], estamos também com espaço físico maior do que tínhamos, ou seja, os gastos são maiores. A conta não fecha”, disse Sandra Almeida aos deputados, ao explicar que uma vez que, paralelamente, houve sucessivos bloqueios de recursos, o orçamento da universidade hoje é 48% menor.
O presidente da A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e reitor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Marcus Vinicius David, declarou que a categoria continuará mobilizada para suspender o corte e pela complementação do orçamento previsto para 2022, de R$ 5,3 bilhões, que já estava defasado.
“Nós observamos que o orçamento das Universidades teve uma redução muito expressiva quando comparamos o período 2014/2015 até agora em 2022. Nos anos de 2020 e 2021 nós sofremos perdas orçamentárias muito expressivas na universidade. A justificativa para que isso estivesse ocorrendo era basicamente a necessidade de adequação das contas públicas aos limites fixados pelo teto de gastos. Então, com o passar dos anos, o que já era anunciado quando se aprovou a emenda do teto de gastos, nós estávamos programando uma grande crise orçamentária para os próximos anos, o que acabou ocorrendo em 2020 e 2021. Porque as despesas obrigatórias Federal têm comportamento de crescimento vegetativo e elas vão pressionando as despesas discricionárias”, alertou.
“Em 2019 nós tínhamos um orçamento discricionário das universidades de R$ 6,2 bilhões. Em 2021 esse orçamento chegou a R$ 4,5 bilhões. Nós caímos de R$ 6,2 bilhões para R$ 4,5 bilhões. Em 2022, nós recuperamos um pouco, nós passamos de R$ 4,5 bilhões para R$ 5,3 bilhões. Mas quando a gente compara 2022 com 2019, nós estamos muito aquém do último ano que nós operamos de forma presencial, integralmente. Eu estou tratando de valores nominais, eu não estou falando de inflação. Se nós pegarmos a altíssima inflação desse período, é uma inflação que tem um fortíssimo impacto nas universidades. É a inflação do alimento, que atinge os RUs [Restaurantes Universitários]; a inflação das tarifas públicas, que afeta nossa conta de energia; a inflação do combustível; a inflação que se reflete nos dissídios coletivos e dos nossos contratos terceirizados. A inflação também traz um aumento de gastos nas nossas instituições. Então, nós já começamos o Orçamento de 2020 aquém das nossas necessidades”, afirmou Vinicius David.
O presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e ex-ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, lembrando que todas as pesquisas são feitas nas universidades públicas, declarou que “tem um efeito calamitoso” os cortes das verbas discricionárias instituições federais, que também atingem a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
“No Brasil, a geração de patentes é esmagadoramente devida a universidade pública, ao contrário dos Estados Unidos. 70% das patentes dos Estados Unidos vêm das empresas e 30% da Universidade. No Brasil o percentual seria inverso. Então, para o próprio desenvolvimento econômico, é fundamental o reforço das Universidades para a qualificação maior do Brasil”, defendeu Janine Ribeiro.
“Os cortes são muito preocupantes”, afirmou. “Tecnicamente, as verbas que podem ser contingenciadas são as discricionárias, ou seja, aquelas que são gastas ou alocadas ao arbítrio do governante. Porém, grande parte dessas verbas não tem essa característica de poderem simplesmente serem cortadas. Está no discricionário, por exemplo, todo o contingente de bolsas que é distribuído pelos vários setores do governo, como CAPES e CNPq, e também está no discricionário o pagamento das contas de luz e de água das instituições. Está no discricionário então, um conjunto de despesas, que na verdade são investimentos, e que não podem ser cortados de um momento para o outro”, criticou o presidente da SBPC.