Os aplausos e a saudação de “Audálio presente!” ecoaram pela sala Vladimir Herzog, do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo (SJSP), nesta quinta, dia 31 de maio, quando da chegada do corpo do jornalista Audálio Dantas, que faleceu aos 88 anos, deixando mulher, Vanira Kunc, quatro filhos, netos e inúmeros amigos e admiradores, ao Sindicato às 12:30 h, local onde foi velado com a visita de centenas de jornalistas, artistas, políticos e lideranças de movimentos sociais e sindicais.
O presidente do SJSP, Paulo Zocchi, destacou que Audálio “foi o maior nome do nosso Sindicato, um dos maiores homens públicos deste país”.
“O que marcou a vida e a profissão de Audálio”, acrescentou Paulo Zocchi, “foi a ligação profunda com o anseio por democracia e uma referência na maioria, nos mais pobres, com aquela parcela da sociedade brasileira que compõe a classe trabalhadora”.
O apresentador e cantor Rolando Boldrin, a quem o filho mais velho de Audálio, José Dantas, veio agradecer a ida ao velório, declarou: “Eu é que agradeço a oportunidade de tê-lo conhecido. Além do grande jornalista, ele deu enorme importância à cultura brasileira”.
“Audálio nos indica os caminhos de firmeza, coerência, retidão que precisamos trilhar em um momento em que são necessárias as transformações na Nação brasileira. Seu inconformismo com as diferenças entre as classes sociais serve de exemplo, pois o que está aí não pode continuar”, afirmou o pré-candidato a deputado federal pelo Partido Pátria Livre, Fabiano Pavio, presente ao ato de solidariedade aos seus amigos e familiares.
As orações foram conduzidas pelo padre Júlio Lancelote que ressaltou a sensibilidade de Audálio Dantas e destacou que “neste momento difícil em que vive o nosso país, Audálio adormeceu para que nós acordemos”.
Presentes, o radialista Assis Ângelo, o deputado federal, Arnaldo Faria de Sá, o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, o diretor da Agência Sindical, João Franzin, entre outras lideranças políticas.
Também vieram prestar homenagem, dirigentes sindicais que acompanharam a luta de Audálio Dantas no momento em que negou a versão de “suicídio”, forjada pelos órgãos de repressão da ditadura para esconder a morte sob tortura do jornalista Vladimir Herzog e convocou o encontro ecumênico na Catedral da Sé, que a lotou e à praça que a abriga, com milhares de pessoas, transformando-se em ato fundamental pela derrubada do regime imposto ao povo brasileiro.
Em diversos dos pronunciamentos no Sindicato, foi destacado que o livro, que o próprio autor reconhecia como sua maior contribuição à literatura, o ingresso de Carolina de Jesus na literatura brasileira, uma mulher negra e favelada, resultou da profunda conexão do nordestino Audálio aos setores do povo que mais necessitam e aspiram às mudanças na sociedade brasileira.
Uma trajetória que, além de sua atuação à direção do SJSP, inclui o mandato à frente da Federação Nacional dos Jornalistas, Fenaj, na primeira eleição direta da entidade; sua eleição e atuação como deputado federal e que valeu a Audálio, em 1981, o prêmio Kenneth Kaunda de Defesa dos Direitos Humano, instituído pela ONU.
No aniversário do ano passado, numa iniciativa da Agência Sindical, Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e Oboré Projetos Especiais, com apoio do SJSP, da Fenaj e do Instituto Vladimir Herzog, entre outras entidades, o jornalista, num evento que lotou o SJSP, recebeu o troféu Indignação-Coragem-Esperança.
Também recebeu o prêmio Jabuti, em 2013, por sua obra “As duas guerras de Vlado Herzog: da perseguição nazista na Europa à morte sob tortura no Brasil”.
Questionado sobre os caminhos que o levaram ao jornalismo, Audálio disse: “Eu escolhi e em determinados momentos se inverteu, acho que também fui escolhido. Mas Jornalismo resultou de uma aspiração que tem tudo a ver com a minha preocupação com os problemas sociais desde menino. Minha atuação como jornalista foi sempre, desde o início, na reportagem, e meus principais trabalhos foram voltados às questões sociais”.
Quando o jornalista Cláudio Campos, dirigente do Movimento Revolucionário 8 de Outubro, e fundador do jornal Hora do Povo, foi preso no início da década de 80, por denunciar a existência de contas secretas de brasileiros na Suíça – que já naquela época recebiam propinas e roubavam nossas empresas públicas -, lá estava Audálio Dantas, denunciando e lutando por sua liberdade e pela liberdade de expressão.
Incansável defensor da liberdade de imprensa, em entrevista concedida em 2014 e publicada pelo Sindicato dos Escritores, ressaltou que a mídia predominante atua na produção de matérias sem pesquisas ou profundidade, abafando o jornalismo de denúncia e reportagem no qual se destacou e deu grandes contribuições.
Da sede do Sindicato, seguiu às 20h para o Cemitério Vila Alpina, na zona leste, onde às 11h deste 1º de junho ocorreu a cerimônia de cremação.
NATHANIEL BRAIA