O presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Antonio Corrêa de Lacerda, que é doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Coordenador do Grupo de Pesquisas sobre Desenvolvimento e Política Econômica da PUC/SP, criticou a decisão do Banco Central de elevar a taxa básica de juros da economia (Selic) em mais 0,5 ponto percentual, na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), realizada na quarta-feira (3).
“Criamos no Brasil uma ideia de que a inflação, independentemente das suas causas, se combate com elevação dos juros. É um grande equívoco, e não é um equívoco neutro, porque representa um ônus terrível para a sociedade, para economia brasileira. Porque, evidentemente, a inflação que nós sofremos hoje, ela vem de causas que não têm a ver com o aumento da demanda, que justificaria um aumento do crédito e um incentivo a poupança para evitar pressão sobre o consumo. Então, estamos vivendo uma situação absolutamente esquizofrênica, do ponto de vista da economia. Porque a economia vai mal, o desemprego é muito elevado, as empresas estão quebrando, as famílias estão endividadas e muita gente passa fome. E, o Banco Central, o governo está elevando a taxa de juros, o que vai agravar estas situações”, advertiu Corrêa de Lacerda, em entrevista à rádio Nova Brasil FM.
Desde março de 2021, foram realizadas 12 altas consecutivas na taxa Selic a pretexto de conter a inflação. A Selic passou de 2% ao ano para 13,75% ao ano, com a última decisão do Copom. Já a inflação continuou avançando. Em 12 meses, até junho, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) acumula alta de 11,89% e acelerou em relação a maio, quando estava em 11,7%.
Corrêa de Lacerda ressalta que “hoje o pensamento econômico dos dirigentes do Banco Central e da equipe econômica do governo são muito semelhantes. Criou-se no Brasil, e isto não é de hoje, esse falso consenso de que qualquer pressão inflacionária deve ser combatida com elevação da taxa de juros. O Brasil é, de longe, o país que mais elevou sua taxa de juros nos últimos 12 meses. Foram basicamente 12 pontos percentuais de elevação. Veja, outros países estão elevando os juros, mas são elevações moderadas. O próprio EUA como a gente tem visto. Os EUA subiu, por exemplo, um pouco mais de 1% da sua taxa de juros. 1 ponto percentual ao longo dos últimos meses”, exemplificou.
“No Brasil, com a elevação dos juros, o crédito fica proibitivo, isso inviabiliza as empresas, inviabiliza as pessoas que não conseguem pagar suas contas e o próprio Estado brasileiro é onerado, porque cada ponto percentual a mais na Selic é um aumento do custo de financiamento da dívida pública. Porque a dívida pública, que é a dívida do Estado com seus credores, aumenta conforme a taxa de juros. Nós vamos gastar esse ano – nós sociedade brasileira, porque nós pagamos os impostos – R$ 700 bilhões para pagar o encargo sobre a dívida pública”, denunciou.
O economista destaca que “a inflação se combate nas causas”.
“Quais as causas da inflação atual? Ela advém de um cenário de pandemia, depois a guerra entre Rússia e Ucrânia, e isto desequilibrou as cadeias internacionais de suprimentos de uma forma geral e elevou os preços das commodities – matérias primas, grãos, que são cotados no mercado internacional…”. “Então, nós temos o aumento nos grãos, no petróleo, na energia, e isso evidentemente não tem nada a ver com o aumento da demanda, e sim com a pressão dos custos. Então, é preciso atuar para amenizar estes impactos, por exemplo, na política de preços da Petrobrás, que é talvez o principal opressor”.
“Nós vimos na semana passada, a Petrobrás anunciar lucros extraordinários que serão distribuídos aos seus acionistas, inclusive ao próprio governo federal. E por que estão ocorrendo? Porque virou um excelente negócio. Favorece a empresa, favorece os acionistas, mas é um ônus brutal para a sociedade. Da mesma forma, é preciso atuar sobre a formação de preços dos alimentos, com estoques reguladores de grãos (que foram desmobilizados no governo Temer, e agora no governo Bolsonaro), por exemplo, para equilibrar a oferta e procura, de modo a não gerar escassez que provoque a elevação de preços. Por fim, mas, não menos importante, a administração da taxa de câmbio, porque o real é a moeda mais volátil frente ao dólar e essa pressão dos custos acaba sendo repassada aos preços, e aí se cria esse ambiente prol elevação de juros, que traz enormes desvantagens a sociedade brasileira”, defendeu Antonio Corrêa de Lacerda.