O Ministério Público Federal (MPF) entrou na Justiça para que o Ministério da Saúde garanta a distribuição de medicamentos essenciais para o tratamento de pessoas submetidas a transplantes de órgãos em São Paulo. A falta de Micofenolato de Sódio e Tacrolimo, imunossupressores que agem para evitar a rejeição dos órgãos e outras complicações, atingiram um ponto crítico e, sem os remédios, os pacientes correm o risco de rejeição e de morte.
Esses medicamentos são de aquisição e distribuição exclusiva do Ministério da Saúde, devido ao alto custo e à baixa disponibilização no mercado. A aprovação dos lotes, solicitados trimestralmente pela Secretaria de Saúde de São Paulo, que é o maior consumidor do país, tem sido apenas parcial.
Segundo o MPF, há cerca de dois anos, o fornecimento dos medicamentos pelo governo federal está instável, com atrasos nas entregas dos lotes e recusa do governo em liberar estoques de segurança, que servem para garantir o tratamento dos pacientes por 30 dias em caso de interrupção do fornecimento. Mas neste semestre, muitos hospitais e outros pontos de atendimento indicam que o estoque foi zerado ou está próximo do fim.
O problema afeta 591 municípios paulistas. Até 12 de abril, por exemplo, apenas 4% dos comprimidos de Tacrolimo (5 mg) e 14% dos de Micofenolato de Sódio (180 mg) previstos para este trimestre haviam sido remetidos pelo Ministério da Saúde. A data limite programada para a entrega total dos lotes era 20 de março.
Para o MPF, “o principal motivo dos atrasos na entrega dos medicamentos pelo Ministério da Saúde parece implicar economia aos cofres públicos, mas sob uma logística perversa. Isso porque pacientes que deixam de tomar medicamentos nas datas corretas não podem compensar com a ingestão em maior escala em período subseqüente”.
Em dezembro de 2017, o Hospital do Rim, na capital, relatou casos de disfunção aguda após transplantes devido à falta destes medicamentos. Segundo a instituição, oito de 65 biópsias realizadas no fim do ano – ou seja, 12,3% das biópsias – indicaram prejuízos à função renal associados à carência das substâncias.
“O paciente transplantado não pode ficar nenhum dia sem receber a medicação que evita a rejeição. Se não tomar o medicamento, dentro de três a quatro semanas, no máximo, ele perde o órgão. Para o doente renal, isso significa que ele voltará para a hemodiálise. Para o transplantado de coração, fígado e pulmão pode significar a morte”, destacou José Medina Pestana, diretor do Hospital do Rim.
O documento do Ministério Público aponta ainda que esse problema está prejudicando o tratamento de cerca de 50 mil pacientes no país, que realiza 7 mil transplantes de órgãos sólidos por ano. O relatório aponta também que a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo solicitou ao governo 224.160 cápsulas de micofenolato de sódio e só recebeu 49.080, ou seja, 22% do total, obrigando as farmácias a entregarem os remédios de forma fracionada.
Pestana também destaca que a entrega fracionada provoca um aumento nas despesas do paciente do SUS, que muitas vezes mora fora de São Paulo e precisa vir até a cidade buscar os remédios. “É um transtorno. Além da preocupação em não conseguir o remédio, o paciente ainda precisa faltar ao trabalho e arrumar uma forma de vir até São Paulo”, lembra.
Pacientes relatam que tem criado grupos nas redes sociais, onde “emprestam” parte das medicações uns para os outros para evitar que alguém fique sem tomar.
O MPF quer que o Ministério da Saúde envie, imediatamente, 224,3 mil comprimidos de Tacrolimo (1 mg). A quantidade, que corresponde ao necessário para o tratamento de 442 pacientes recém-transplantados, já foi aprovada, mas ainda não foi entregue.
Também em caráter liminar, a procuradoria pede que o Ministério seja obrigado a enviar o total dos lotes aprovados dos medicamentos, a partir do próximo trimestre, realizando entregas em remessas únicas de acordo com prazos já definidos em normas do próprio Ministério. O MPF requer ainda que sejam liberados estoques de segurança, que cubram pelo menos 30 dias de tratamento.