Com país estagnado, em meio à maior crise sanitária, salários foram congelados, órgãos extintos e concursos suspensos. De 2019 para cá, as despesas com o funcionalismo caíram 15,43%. Número de servidores na ativa teve uma queda de 630,7 mil em dezembro de 2018 para 570,3 mil em julho deste ano
Com o arrocho sobre o setor público e o calote nos precatórios, o governo Bolsonaro derrubou os gastos reais com servidores federais ao menor nível desde 2008. No primeiro semestre deste ano, o Executivo Federal desembolsou R$ 157,477 bilhões para pagar salários, aposentadorias e sentenças judiciais do funcionalismo, em valores atualizados pela inflação, segundo dados compilados pela Agência Brasil, com base nas estatísticas do Tesouro Nacional, divulgados no domingo (14).
O montante é o mais baixo para o primeiro semestre desde 2008, quando estava em R$ 139,733 bilhões, também em valores corrigidos pela inflação. O pico das despesas com o funcionalismo no primeiro semestre foi registrado em 2019, quando as despesas atingiram R$ 186,213 bilhões. De lá para cá, os desembolsos recuaram 15,43% em termos reais (descontada a inflação).
A queda no desembolso com o funcionalismo reflete a política do governo Bolsonaro de desmontar os aparatos do Estado. Segundo números da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, que foram apresentados ao mercado financeiro, com o congelamento de salários e restrição a concursos públicos, estima-se que as despesas com servidores ativos e inativos deverá cair para 3,4% em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) ao fim de 2022 – menor nível da série histórica da Secretaria do Tesouro Nacional, iniciada em 1997. Em 2017 e 2020 essas despesas chegaram a representar 4,2% do PIB.
Com a gestão de Bolsonaro, o número de funcionários alcançou o mais baixo patamar dos últimos 13 anos. Em 1º de janeiro de 2019, havia aproximadamente 630 mil funcionários nas repartições públicas federais. Hoje, são cerca de 570 mil servidores em atividade, segundo a pasta de Economia.
Quanto menos servidores, pior é a assistência à população, principalmente em áreas como Saúde e Educação. De acordo com dados do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas do Estado (Fonacate), o número de servidores caiu 12% desde o início da década de 1990, enquanto a população cresceu 40% no período. “A economia deu-se a partir da redução da quantidade e da qualidade dos serviços levados à população”, afirma o presidente do Fórum Rudinei Marques.
Em meio à pior crise sanitária que o Brasil já viveu na sua história, em que os servidores públicos, com grande destaque para os da saúde, atuaram com força hercúlea para salvar vidas e para garantir a assistência à população, o governo Bolsonaro propôs o congelamento do salário do funcionalismo como moeda de troca para que saísse o pacote financeiro de ajuda a Estados e municípios afetados pela pandemia de Covid-19.
O congelamento do salário dos servidores, que já vinham com os salários arrochados, vigorou entre junho de 2020 e dezembro de 2021. Neste ano, o funcionalismo novamente ficou sem reajuste.
“O governo não concedeu o reajuste ao funcionalismo. Preferiu usar o dinheiro para finalidades eleitoreiras como a concessão de subsídios e benefícios, e agora amplia a margem de endividamento dos servidores. Os servidores perdem duas vezes: não tiveram recomposição salarial e terão que se endividar ainda mais para poder arcar com as despesas domésticas, que não param de crescer em decorrência do processo inflacionário”, disse Rudinei Marques, presidente do Fonacate (Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado), ao criticar a Medida Provisória (MP) 1.132, editada por Bolsonaro no início deste mês, que amplia a margem de consignação em folha de pagamento dos servidores públicos federais para 40% da remuneração mensal, sendo que 5% serão reservados para a amortização de despesas e saques por meio de cartão de crédito.
O presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco), Mauro Silva, também destaca que a falta de reposição de pessoal pode gerar problemas graves à sociedade.
“Na Receita, temos um grande problema no combate ao contrabando por meio das fronteiras. O controle aduaneiro tem sido muito enfraquecido e as pessoas vão arrumando meios [de burlar o controle]”. “Nós temos muita gente se aposentando e não há uma reposição. A ideia de que reduzir servidores é bom só existe na cabeça de quem não valoriza a boa atuação estatal”, afirmou Silva.
Outra medida que ajudou para o movimento de redução das despesas do Executivo com o funcionalismo foi o calote nos precatórios, possibilitado pela emenda constitucional que permitiu o parcelamento do pagamento dos precatórios (dívidas do governo reconhecidas em caráter definitivo pela Justiça) e transferiu para outros anos esses gastos que seriam executados em 2022.
Segundo o Tesouro Nacional, a emenda constitucional reduziu em R$ 9,82 bilhões as despesas da União com precatórios no primeiro semestre. Em valores corrigidos pela inflação, a queda chega a R$ 11,22 bilhões. Desse total, R$ 7,4 bilhões corresponderam a precatórios relativos ao funcionalismo público federal.