Em visita ao Brasil pela primeira vez para a pré-estreia do seu filme Anna Karenina – A história de Vronsky, que entrou em cartaz em diversas capitais do país essa semana, o diretor Karen Shakhnazarov, que também dirige o estúdio Mosfilm, disse estar muito satisfeito de poder mostrar ao público brasileiro um filme russo novo, o que não tem sido comum nos últimos tempos.
“É muito importante para nós podermos mostrar nosso trabalho recente para um novo expectador, assim como para o público brasileiro. De maneira geral, é enriquecedor poder ter acesso a filmes que tragam um novo ponto de vista do fazer cinema, além do que normalmente chega ao país, com produções, em sua maioria, norte-americanas”.
O diretor, que veio a São Paulo a convite do CPC-UMES Filmes, falou do quanto tem sido importante a parceria com a entidade estudantil que, segundo ele, “só tem demonstrado que com decisão e determinação, podemos fazer muitas coisas acontecerem”.
“É muito gratificante ver o entusiasmo dessa juventude. Tiveram uma idéia, nos procuraram no Mosfilm e, sem burocracias, de forma rápida, estamos realizando projetos”.
CPC-UMES FILMES
A parceria a que o cineasta se refere começou há cerca de cinco anos, quando o CPC-UMES Filmes iniciou uma negociação com o estúdio russo para a distribuição no Brasil de DVDs de filmes produzidos por eles, inicialmente filmes da série Cinema Soviético. A partir daí foram mostras de cinema soviético e russo, que, completando em 2017 a sua quarta edição, já fazem parte do calendário de cinema da cidade de São Paulo e outras capitais do país. A entidade estudantil já trabalha com o licenciamento e a comercialização de mais DVDs, inclusive filmes que acabaram de ser lançados na Rússia; além da intermediação e participação da entidade com novos canais de parceria, como TVs e salas de exibição, para ampliar o acesso do público à rica cinematografia russa.
“Temos muitos exemplos na história do quanto uma idéia e a determinação de levá-la adiante fizeram a diferença. Gostamos dessas atividades internacionais, que têm tudo a ver com a indústria cinematográfica. O cinema é, por si só, uma arte com vocação internacional, de co-produções”, disse o cineasta.
Shakhnazarov, que está à frente do Mosfilm desde 1998, falou na quarta-feira (6) para uma platéia de convidados que reuniu no Cinearte Petrobras, na Av. Paulista, diretores de cinema, roteiristas, alunos de artes visuais e amantes de cinema para ouvi-lo contar um pouco de sua trajetória à frente do estúdio de cinema, considerado o maior e mais antigo da Europa.
“Quando o Mosfilm foi criado, a partir da visão certeira do Estado Soviético sobre a importância para um país do fortalecimento da sua arte e da sua cultura, éramos um estúdio que impunha respeito na Europa e na Ásia. Mas, a partir da queda da União Soviética o Mosfilm ficou praticamente destruído. Tivemos que recomeçar do zero”.
Ressaltando o papel da cultura para o pleno desenvolvimento de uma nação, o diretor diz que é como na guerra, “se não alimentamos nosso próprio exército, é como se alimentássemos o exército do inimigo. Na arte e na cultura é assim. Se não alimentamos a nossa própria cultura, o povo perde a sua alma”.
“Quando fui nomeado, pensei como um diretor de cinema: o que precisamos para fazer um filme?”
MOSFILM
Entendendo que, especialmente na indústria cinematográfica, a qualidade e o conteúdo da arte são tão importantes como a qualidade técnica, o conhecimento tecnológico, a qualificação e o aprimoramento de profissionais, Shakhnazarov conta que foi à luta para, pouco a pouco, equipar o estúdio com o que há de mais moderno no mercado cinematográfico.
“Só podíamos contar com o acervo de filmes que tínhamos e alguma ajuda do governo. Investíamos tudo que arrecadávamos com as primeiras produções, na compra de equipamentos. Depois de 20 anos nos equipando e modernizando, podemos dizer que hoje estamos em pé de igualdade, ou até melhores do que os mais importantes estúdios de cinema do mundo”.
O cineasta diz que mesmo sendo uma estatal, o Mosfilm não depende financeiramente do governo e que também não há controle do Estado sobre o que é produzido no estúdio. “Fazemos filmes sobre qualquer tema, nunca percebi ou sofri qualquer tipo de pressão sobre o conteúdo do que produzimos, tanto enquanto diretor de cinema como na condição de diretor do Mosfilm”.
Ele conta que o governo tem um programa de apoio ao jovem cineasta e que com isso 80% dos jovens que saem da universidade com formação em audiovisual passam por capacitação no Mosfilm em cursos e estágios gratuitos. “É muito importante para a renovação de talentos. E é uma troca, a maioria dos que se capacitam conosco retornam para trabalhar no estúdio”.
Criado em 1923, o Mosfilm tem um acervo de mais de 2.500 filmes, e ocupa uma área de 34 hectares em Moscou. Com 15 pavilhões de cinema, o maior com 2 mil metros quadrados, estúdios de montagem, de engenharia de áudio, museu e complexo de cenário cinematográfico grandioso, o local também abriga um estúdio de música que comporta uma orquestra grande e coro de cem pessoas onde são feitas gravações e trilhas sonoras, como as músicas de Anna Karenina – A história de Vronsky, que foram gravadas por orquestra ao vivo.
Simpático e descontraído, Karen Shakhnazarov falou que estar no Brasil era “realizar um sonho de criança” e ainda brincou: “já que o meu país não tem mesmo nenhuma chance na Copa do Mundo, vou torcer pelo Brasil”.
ANA LÚCIA