Realizada no centro da milenar Rota da Seda em Samarcanda, a cúpula da Organização de Cooperação de Xangai (CSO), que reúne China, Rússia, Índia, Paquistão, Uzbequistão, Cazaquistão, Quirguistão e Tajiquistão, marca a integração plena do Irã e início da inclusão dos “parceiros de diálogo” Arábia Saudita, Egito e Emirados. Com 40% da população do mundo, a CSO congrega mais de 30% do PIB global.
“Diante das tremendas mudanças de nosso tempo em escala global, sem precedentes na história, estamos prontos, juntamente com nossos colegas russos, para ser um exemplo de potência mundial responsável e desempenhar um papel de liderança no mundo para injetar estabilidade e energia positiva no caminho do desenvolvimento sustentável”, afirmou na cúpula o presidente da China, Xi Jinping. Tais mudanças – ele acrescentou – “são irreversíveis” e, portanto, “o papel crescente de novos centros de poder está se tornando cada vez mais evidente”.
Analogamente, o presidente russo, Vladimir Putin, reiterou que “o conjunto de política externa de Moscou e Pequim desempenha um papel fundamental para garantir a estabilidade global e regional. Juntos, defendemos a formação de uma ordem mundial justa, democrática e multipolar”.
Por sua vez, o presidente anfitrião, Shavkat Mirziyoyev, do Uzbequistão, apontou a necessidade de um plano de longo prazo para o desenvolvimento da SCO. Foi alcançado um acordo para que Maldivas, Bahrein, Kuwait e Mianmar se tornem novos parceiros de diálogo. O presidente turco Recep Erdogan foi uma figura de destaque em Samarcanda. No próximo ano, a presidência rotativa da SCO caberá à Índia.
Por muitos séculos, Samarcanda foi o centro da Rota da Seda, o que acabou contribuindo para sua rica história e cultura diversificada. “A própria Samarcanda é tão antiga quanto Roma, tem 2.700 anos”, disse Dinara Akhmetova, diretora de relações públicas do centro histórico.
POSIÇÃO EQUILIBRADA
Na cúpula, os presidentes Xi e Putin se reuniram em pessoa pela primeira vez desde o início da operação militar especial russa de defesa das repúblicas do Donbass e desnazificação da Ucrânia, com o presidente russo agradecendo a “posição equilibrada de nossos amigos chineses em relação à crise ucraniana. Entendemos suas dúvidas e preocupações a esse respeito”.
O presidente russo assinalou que “as tentativas de criar um mundo unipolar tomaram recentemente uma forma absolutamente horrível e são completamente inaceitáveis”.
Putin também se reuniu com o primeiro-ministro indiano Narendra Modi, a quem explicou que se esteve perto de um acordo em março, mas Kiev recuou e não quer negociar, mas que a Rússia almeja concluir sua operação o mais rápido possível.
A Índia também tem mantido uma posição equilibrada, se recusando a se submeter às sanções proclamadas por Washington e Bruxelas e apoiando negociações.
No comunicado conjunto, os países membros e os parceiros reiteraram que a SCO não é dirigida contra outros países, tem como objetivo o desenvolvimento com segurança e ajuda mútua, com base na não-interferência nos assuntos internos dos Estados membros.
CONTRA AS SANÇÕES
A declaração final de Samarcanda adverte que “medidas econômicas unilaterais contrárias aos princípios e regras gerais da OMC e medidas contra os sistemas financeiros dos Estados membros da SCO impactam na segurança e estabilidade das cadeias de suprimentos e estão agravando a crise alimentar mundial”. A SCO assegurou, ainda, sua disposição em colaborar com outros países para garantir a segurança alimentar nos níveis regional e global.
O documento exortou os principais países produtores e exportadores de alimentos a que reduzam o número de barreiras tarifárias e não tarifárias para aliviar a escassez e evitar a volatilidade excessiva dos preços.
Os países da SCO pediram também a criação de um mercado de energia transparente e eficiente, que evite a instabilidade excessiva nos preços mundiais dos títulos do setor de energia. Ressaltaram a necessidade de respeitar e garantir o direito de todos os Estados à segurança energética e o direito de seus povos aos serviços no setor energético e destacaram que a segurança energética é a base do desenvolvimento econômico, estabilidade social, segurança nacional e bem-estar de todos os países do mundo.
“Nós defendemos o fortalecimento da coordenação da política energética e a formação conjunta de um sistema global justo de gestão de recursos energéticos, incluindo a prestação de assistência aos Estados necessitados e em desenvolvimento, para tornar a energia acessível a todos”, sublinha o comunicado.
Os líderes da SCO também se manifestaram pelo fortalecimento da interação entre países fornecedores, países de trânsito e países consumidores, para garantir a segurança e estabilidade dos canais internacionais de transporte de recursos energéticos e alcançar a operação ininterrupta da cadeia, produção e vendas em geral.
A declaração também apoia a restauração do plano nuclear a seis partes com o Irã – aliás, rasgado pelo governo Trump, atitude em que agora Biden reincide – cujas negociações estão em impasse, devido à intransigência de Washington. De acordo com o texto, os países da OCS pedem a todas as partes do acordo que “cumpram rigorosamente suas obrigações para a implementação plena e efetiva do documento”.
Além disso, a SCO defende o fortalecimento do regime de não proliferação nuclear e a promoção da cooperação no uso pacífico da energia atômica.
Os países membros da SCO enfatizaram em sua declaração conjunta que planejam expandir a cooperação no campo das tecnologias verdes, para o desenvolvimento sustentável e redução das emissões de gases com efeito estufa.
A SCO também pediu o fortalecimento da Organização Mundial do Comércio (OMC): “Os Estados membros clamam por um aumento da eficiência da OMC, que é a plataforma chave para abordar a agenda de comércio internacional e adotar regras do sistema multilateral de comércio”.
Os países membros também enfatizam a necessidade de realizar uma reforma inclusiva da OMC.
CONTRA A CORRIDA ARMAMENTISTA
Os países membros da SCO também defenderam manter o espaço sideral uma zona livre de armas e enfatizaram a necessidade de assinar um documento juridicamente vinculativo que forneça garantias confiáveis para evitar uma corrida armamentista.
Ainda de acordo com o comunicado, os Estados membros “se opõem categoricamente à militarização da esfera da informação e comunicação” e propõem “a criação de uma convenção internacional no âmbito da ONU para combater o uso de tecnologias de informação e comunicação para fins criminosos”.
O comunicado também inclui uma questão de particular importância para o próprio Uzbequistão, a necessidade de abrir espaço para o Afeganistão na SCO; também pede um “governo inclusivo” em Kabul.