“Bolsonaro demonstrou, em seus três anos e meio de governo, um completo desprezo por todos os valores do liberalismo político e pelos Compromissos públicos assumidos pelo Livres”, afirmam em manifesto os economistas do grupo Livres
Associados do grupo Livres, que reúne economistas como Pérsio Arida e Elena Landau, declararam seu voto pela vida e pela democracia através da divulgação de um manifesto defendendo o voto no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno “para preservar a institucionalidade brasileira e derrotar a extrema-direita”. “Conclamamos todos aqueles que são liberais por inteiro a realizarem a mesma ação. O risco da omissão é o agravamento do atual quadro. O preço do silêncio é a derrocada da ordem constitucional”, diz o documento. Entre os que assinam o manifesto estão Pedro Malan e Armínio Fraga.
“Bolsonaro demonstrou, em seus três anos e meio de governo, um completo desprezo por todos os valores do liberalismo político e pelos Compromissos públicos assumidos pelo Livres”, afirmam. Eles destacam o desprezo de Bolsonaro “pela vida humana, traduzido em sua resistência às medidas sanitárias”, “seus arroubos golpistas” e “as graves denúncias de corrupção que rodeiam seu governo”. E assinalam que “o voto não despreza as divergências que já expusemos e que ainda mantemos com o Partido dos Trabalhadores”.
Publicamos a seguir a íntegra do manifesto.
Nós, associados do movimento Livres, que subscrevemos o presente Manifesto, liberais por inteiro, tendo em vista os Dez Compromissos que formam o centro de nossa plataforma política, expomos os motivos que nos levam, no segundo turno das eleições presidenciais, a manifestar nossa posição coletiva, não vinculada ao movimento ou à sua direção, contrária ao projeto que se afasta, de forma rompante e inequívoca, dos fundamentos do liberalismo democrático: o apresentado pelo candidato à reeleição Jair Bolsonaro. Ao fazê-lo, colocamo-nos em favor do projeto que tem, comprovadamente, agregado variadas forças políticas que entendem como imperiosa e urgente a defesa da democracia: a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva.
Nosso voto não despreza as divergências que já expusemos e que ainda mantemos para com o Partido dos Trabalhadores e com o histórico de seus governos à frente do Poder Executivo. Ao longo dos anos, apontamos os erros graves de uma política econômica equivocada e perdulária; os desvios de recursos públicos em favor de empreiteiras e partidos; e a retórica danosa de “nós contra eles”. Entretanto, os governos petistas, mesmo diante dos momentos mais críticos, como o impeachment de 2016, não ameaçaram nem tentaram romper com a institucionalidade democrática e se submeteram ao afastamento da Presidente, respeitando as diretrizes que embasam o Estado democrático de Direito, consagrados na Constituição Federal. No primeiro mandato de Lula, os pilares macroeconômicos foram preservados e programas sociais consolidados e aprimorados, representando avanços no combate às desigualdades.
Bolsonaro demonstrou, em seus três anos e meio de governo, um completo desprezo por todos os valores do liberalismo político e pelos Compromissos públicos assumidos pelo Livres. É fundamental destacar:
- Seu desprezo pela vida humana, traduzido em sua resistência às medidas sanitárias, na monstruosa incompetência que deixou a cidade de Manaus sem estoques de oxigênio, na aposta cruel em medicamentos sem eficácia comprovada e no descaso com a aquisição de vacinas contra a COVID-19;
- Sua aversão à pluralidade de ideias e de modos de vida, manifesta em seus desejos de eliminação de opositores e de minorias, em especial os indígenas, quilombolas e pessoas LGBTI+;
- Sua aberta misoginia, quando defende que mulheres devem ganhar menos porque engravidam, quando chama a filha de “fraquejada” e quando agride uma Parlamentar ao afirmar que “não merece ser estuprada”;
- Sua repulsa à transparência na Administração Pública, pela imposição de sigilos de cem anos sobre registros de seu governo, pelas tentativas de abafar investigações policiais sobre integrantes de sua família e sobre correligionários; pela sua sabotagem de partes essenciais da governança do Estado brasileiro, como o combate aos desmatamentos e queimadas ilegais na Amazônia; pela perseguição implacável a jornalistas, principalmente mulheres, que ousam expor seu governo, e pela perseguição de servidores públicos de carreira que divergem da linha ideológica do governo ou meramente cumprem com suas funções;
- Seus arroubos golpistas, através da busca incessante por deslegitimar o processo eleitoral brasileiro; dos ataques diários ao Tribunal Superior Eleitoral, ao Supremo Tribunal Federal e a seus integrantes; das ameaças constantes do uso de “suas forças armadas”; e
- As dezenas de graves denúncias de corrupção que rodeiam o governo, que englobam peculato através do desvio de salários de servidores de gabinetes parlamentares e a compra de apoio no Congresso por intermédio do orçamento secreto, bem como tráfico de influência e o pagamento de propinas no Ministério da Educação.
O grupo que ora governa nosso país nada mais é que a concretização do projeto mais antiliberal já executado por um Presidente da República desde o advento da Constituição da República de 1988. Um projeto de corrosão institucional e democrática para acabar com os freios e contrapesos que impedem, aos trancos e barrancos, o avanço completo de Bolsonaro sobre a Constituição.
Além disso, o resultado das eleições para o Legislativo Federal – em que o movimento político de extrema-direita, liderado por Bolsonaro, fez expressivos ganhos – representa o fim de um anteparo importantíssimo contra abusos de poder do Chefe do Executivo, a partir de 2023, e poderá propiciar, num segundo mandato, uma deterioração da separação entre os Poderes e um risco concreto de deformação da ordem democrática, contra o qual a sociedade civil não terá recursos. As bravatas de ruptura da ordem constitucional, em caso de reeleição do atual Presidente – com um Congresso aliado e a possibilidade de indicar mais dois Ministros ao STF, ou até mesmo de expandir a composição da Corte, fabricando uma maioria artificial naquele Tribunal, com vistas a subordinar o Poder Judiciário aos desígnios do Executivo – poderão deixar o plano da retórica e virar medidas concretas.
Deixamos claro: não há simetria possível entre as duas candidaturas postas neste segundo turno. Bolsonaro tripudia do luto e da perda de inúmeras famílias, de quase setecentos mil brasileiros perdidos para a COVID-19. Lula, por maiores que tenham sido seus equívocos, não se cala diante da fome e da doença que atinge o país, sobretudo os mais frágeis entre nós. Bolsonaro se levanta contra a Constituição em arroubos golpistas e autoritários. Lula governou sob normalidade institucional, se curvando à Constituição e às instituições democráticas mesmo quando as decisões vieram em seu desfavor.
Diante da responsabilidade histórica que o momento exige, unimos nossas vozes à dos Conselheiros Acadêmicos Pérsio Arida e Elena Landau – e de tantos outros liberais que assim já o fizeram -, manifestando voto em Luiz Inácio Lula da Silva para preservar a institucionalidade brasileira e derrotar a extrema-direita. Conclamamos todos aqueles que são liberais por inteiro a realizarem a mesma ação. O risco da omissão é o agravamento do atual quadro. O preço do silêncio é a derrocada da ordem constitucional.