Na semana passada, em meio à desvalorização recorde do peso argentino frente ao dólar, o governo Macri divulgou sua carta de intenções, ou em outras palavras, os termos do arrocho anti-popular que pretende implementar para obter US$ 50 bilhões (parcelados, diga-se de passagem) em empréstimos do Fundo Monetário Internacional – FMI. Ao submeter a economia argentina aos ditames do FMI, aprofunda o processo de primarização da economia do país, além reforçar o atrelamento cada vez maior ao dólar e às manobras dos especuladores, enquanto segue encarecendo o custo de vida da população.
A carta entrega a condução da economia ao FMI, com o compromisso de, para reduzir o déficit fiscal, manter a política de juros elevados associada às importações. Para atingir estes nefastos objetivos, não só congelará a contratação de servidores públicos por dois anos, como eliminará os subsídios destinados ao gás de cozinha (mercadoria cujo preço já catapultou antes), transportes e aumentará os impostos. Em suma, a carta de Macri sintetiza as suas intenções, ao afirmar que, para atender as escabrosas exigências do FMI, “tomaremos quaisquer medidas adicionais que possam ser apropriadas”.
Aliás, essas medidas lembram os ‘ajustes’ de Temer e a sua PEC do teto de gastos, assim como os diversos cortes implementados pelo governo Dilma, enfim todo tipo de crueldade, sob argumentos similarmente esfarrapados, ou seja, de que o povo deve enfrentar dificuldades e restrições em troca de uma estabilidade econômica que só beneficia o “mercado”, quer dizer o sistema financeiro, e a baldada promessa de um crescimento que nunca vem.
Em linhas gerais, a carta de intenções indica o descompromisso total do governo com o povo argentino e a manutenção do câmbio flutuante, deixando o valor da moeda nacional em dólar oscilar ao sabor dos monopólios e da banca internacional, beneficiando a especulação com o câmbio. Enquanto o governo divulgava sua carta ao FMI, o presidente do Banco Central, Federico Sturzenegger, apresentou sua renúncia, sendo substituído por Macri pelo então ministro das Finanças, Luis Caputo. Com a dança das cadeiras, a pasta de Finanças foi entregue ao ministro da Fazenda, Nicolás Dujovne, que acumulará as duas funções.
DEPENDÊNCIA
O documento também se compromete com a manutenção de altas taxas de juros, que devem ser condicionadas às decisões do corpo técnico do FMI. Assim, a taxa nominal de juros, fixada atualmente em 40% a.a., seguirá pelos próximos meses escorchando os argentinos, assombrada pela possibilidade de novas altas, já que a desnacionalização e desindustrialização do país associada à elevação do câmbio devem elevar a inflação, e conforme a carta, elevações da inflação acima da meta devem ser discutidas com os técnicos do fundo visando novas altas de juros e novos cortes nos programas sociais e investimentos.
Além das medidas listadas acima, o governo se comprometeu com a elevação de suas reservas em US$ 25 bilhões, durante os próximos três anos, através da venda de títulos de curtíssimo prazo, o que deve pressionar ainda mais os juros do país.
Em linhas gerais, a carta de intenções motivada pela alta do dólar em relação ao peso argentino serve apenas a um fim: reafirmar e aprofundar a dependência argentina à política dos EUA e dos demais monopólios dos países centrais.
Para isso, busca limitar as possibilidades e ferramentas do Estado, que fica impedido de utilizar políticas voltadas para o desenvolvimento, garantindo, em nome de uma suposta “estabilidade de mercado”, a transferência de renda dos argentinos aos bancos e grandes empresas, seja via juros, importações de bens com maior valor agregado ou através da economia local restrita à exportação de produtos primários.
GABRIEL CRUZ