“São recursos que vão para o sistema financeiro e deixam de ir para o comércio, indústria ou serviços”, afirma o assessor econômico da Fecomercio-SP, Altamiro Carvalho
No primeiro semestre deste ano, as famílias brasileiras pagaram R$ 284,1 bilhões de juros, um aumento de 18% em relação ao mesmo período de 2020, segundo estudo feito pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
“São recursos que vão para o sistema financeiro e deixam de ir para o comércio, indústria ou serviços”, destacou o assessor econômico da Fecomercio-SP, Altamiro Carvalho, ao afirmar em reportagem do Valor Econômico que o pagamento de juros hoje, em média, representa 12,6% da renda das famílias. Em 2020, a proporção para o mesmo período era de 10,50% e, para todo ano, foi de 11,62%.
“Em média, no semestre, a taxa de juros cobrada pelos emprestadores se situou em torno de 18,8%, o que dá aproximadamente 40% ao ano”. “A cobrança de juros é extremamente elevada e faz com que uma boa parte do orçamento doméstico seja comprometida pelo pagamento de juros”, disse Carvalho.
O aumento dos juros pagos pelas famílias é um reflexo da escalada da taxa de juros da economia (Selic) pelo Banco Central (BC), com aval do governo Bolsonaro, que elevou a Selic de 2% ao ano, em março de 2021, para aos atuais 13,75% ao ano. Com isso, os brasileiros passaram a pagar maior taxa de juros real do mundo, segundo o ranking mundial de juros reais (descontado a inflação) da MoneYou e Infinity Asset Management, no qual o Brasil lidera.
Os gastos das famílias com os juros representam hoje um dos maiores itens de despesa das famílias brasileiras, superando educação, serviços de saúde e vestuário, e está abaixo apenas dos custos com aluguel e alimentação, aponta o estudo da Fecomercio-SP. Em meio à inflação, principalmente do alto custo da alimentação, que se somou à queda da renda e ao alto nível de desemprego que cercam o país nos últimos anos, os brasileiros estão se endividando mais com o cartão de crédito, cheque especial e até empréstimos.
No encerramento do primeiro semestre deste ano, o percentual do endividamento das famílias no país atingiu os 78%, o maior patamar da série histórica para o período desde 2010, de acordo com a FecomercioSP.
“Para se ter uma ideia”, diz a entidade, “em junho de 2020, o nível de endividamento das famílias era de 67%, passando para 71% em junho de 2021. Isso significa que, há poucos meses, mais de 13,1 milhões de lares residentes nas capitais brasileiras estavam endividados, 1,16 milhão (9,7%) a mais em comparação a junho de 2021. O número de famílias com dívidas em atraso (inadimplentes) também cresceu”. “Pouco mais de 4,9 milhões tinham alguma conta em atraso no fim do sexto mês do ano, quase 600 mil a mais do que no ano passado. A combinação de queda na renda e aumento no endividamento resultou numa inadimplência maior”, observou a entidade.
Altamiro Carvalho também aponta que os juros altos praticados pelas instituições financeiras e a inflação mais alta contribuíram para que a taxa de inadimplência entre as pessoas físicas aumentasse para 5,24% – retornando ao nível de 2020, quando foi registrado o patamar recorde de 5,3%. Segundo a Fecomercio-SP, o valor dos empréstimos atrasados há mais de 90 dias apresentou alta de R$ 45,1 bilhões em relação ao primeiro semestre de 2021, somando R$ 85,3 bilhões no primeiro semestre de 2022. Em 2021, eram R$ 58,8 bilhões em atraso.
Do lado das empresas, o montante pago de juros passou de R$ 91,5 bilhões no primeiro semestre de 2020 para R$ 103,1 bilhões no mesmo período desse ano. A inadimplência entre pessoas jurídicas, em termos de valores com atrasos superiores a 90 dias, atingiu R$ 22,1 bilhões em junho de 2022, o que representa 8,2% a mais que em 2021.