Resultado eleitoral afetou volume de compartilhamentos que geram desinformações. Sites excluem metade dos linques após alta circulação
Depois da derrota de Jair Bolsonaro (PL) na campanha de reeleição, em 30 de outubro, o volume de conteúdo bolsonarista compartilhado no Telegram colapsou. Além da queda brusca na circulação de artigos, houve apagão em massa de publicações.
A circulação de linques únicos dos sites Terra Brasil Notícias, Aliados Brasil Oficial, Pleno News e Jornal da Cidade Online teve queda brusca desde 28 de outubro, véspera do pleito do segundo turno. Inclusive, esses portais das redes bolsonaristas recebiam ou recebem recursos da Secom (Secretaria de Comunicação Social do Governo Federal), além de outros patrocínios.
Os dados foram levantados pelos pesquisadores Letícia Cesarino, da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Leonardo Nascimento e Paulo Fonseca, da UFBA (Universidade Federal da Bahia). Eles estudam ambientes de desinformação com foco no Telegram e monitoram mais de 500 grupos e canais de extrema-direita no aplicativo.
Os portais mencionados ocupam a dianteira em número de compartilhamentos nesses chats monitorados. Campeão em popularidade, o Terra Brasil Notícias viu o volume de compartilhamento diário do conteúdo do portal cair de pico de 4 mil, no período eleitoral, para 796 no começo de dezembro.
O total de compartilhamentos, que foi de 17,8 mil em julho, passou para 14,9 mil em agosto, 15,3 mil em setembro e atingiu o auge de 18,2 mil em outubro. Em novembro, teve 8,8 mil (queda de 51,6%).
OUTROS SITES
O movimento foi acompanhado de forma geral por outros sites bolsonaristas. O Aliados Brasil Oficial viu os compartilhamentos cair de 6,9 mil em outubro para 2,9 mil (queda de 57,8%) em novembro, no pós-eleição.
A queda do Pleno News foi de 5 mil em outubro para 3,1 mil (queda de 38%) no mês seguinte, e do Jornal da Cidade Online, de 17,5 mil para 6,4 mil (queda de 63,4%).
O Terra Brasil Notícias ocupou a dianteira da popularidade na extrema-direita após o Jornal da Cidade Online sofrer desmonetização pelo YouTube e outras plataformas a pedido do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em agosto de 2021.
DESINFORMAÇÃO
O portal já teve quatro vídeos derrubados pela plataforma por infringir as políticas de uso, incluindo por disseminar conteúdo enganoso sobre fraude eleitoral, segundo levantamento da Novelo Data.
Um dos vídeos derrubados se chamava “Urna eletrônica é inconstitucional”.
Desde então, sem poder lucrar com os vídeos, a frequência de compartilhamento diário dos linques do Jornal da Cidade Online despencou no Telegram. Se antes operava em patamar de 2 mil, hoje dificilmente passa de 1 mil. Na última segunda-feira (5) foi de 183, por exemplo.
O Pleno News, que chegou a bater 1,1 mil compartilhamentos diários durante o período eleitoral, teve conteúdo replicado 308 vezes na última segunda-feira (5).
Os pesquisadores contabilizaram 30.516 linques únicos publicados pelo Terra Brasil Notícias no Telegram e identificaram padrão: o site opera apagões em massa do conteúdo que publica. Cerca de 50% desses linques, 15.202, foram excluídos após circularem.
Isso acontece pelo fato dos responsáveis saberem que esses conteúdos são falsos. E o único propósito é produzir desinformação, desalento e mobilizar os bolsonaristas, em particular, os mais ardorosos.
“Se metade do conteúdo desaparece, é claramente um site devotado para a desinformação. O conteúdo é postado, causa a desinformação e depois eles vão deletando. São altamente danosos”, afirma o pesquisador Leonardo Nascimento.
MENTIRA DO MENTIROSO
Procurado, o dono do site, Junior Melo, respondeu que teve de se adequar às novas regras das plataformas digitais e “excluir todo o conteúdo que poderia ser interpretado como descumprimento dessas normas”.
Ele afirmou que agora o site tem “uma espécie de compliance interno”, que checa as notícias antes de irem ao ar.
“Essa queda [de circulação] se deu à adequação. Com isso, nossa linha editorial passou a ser vista com desconfiança por nossos leitores, que são maioria de direita, e perdemos audiência no nosso principal público”, disse.
“Isso nos garantiu segurança jurídica, mas nos trouxe perda de público, mesmo com todo esse cuidado ainda tivemos uma desmonetização por parte do Google AdSense e estamos no meio de um limbo jornalístico”, afirmou o empresário.
MAIS MENTIRAS
Questionado se antes do novo procedimento o site não checava o que publicava, ele respondeu que sim, “mas só contra notícias falsas”. Agora, verificam a veracidade de notícias também sobre “vacinas, urnas eletrônicas e eleições”.
O Terra Brasil Notícias foi responsável pela disseminação no Telegram, na véspera do primeiro turno, em 1º de outubro, do boato segundo a qual o criminoso Marcola teria declarado voto em Lula, o que não ocorreu.
Por uma razão muito simples: condenados, com trânsito em julgado, e presos, perdem os direitos políticos e não podem votar, nem tampouco ser votados.
Pesquisadores rastrearam que o primeiro linque foi publicado no Telegram às 19h10m do sábado anterior ao pleito e, a partir de então, dominou a internet durante a votação.
M. V.