Embora o ex-presidente e aliados tentem dizer o contrário, a trama para se apropriar de pacote de joias milionário dado pelo regime da Arábia Saudita ao governo brasileiro fica devidamente provada
Está dada a informação que faltava para desvendar mais uma patranha do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A Receita Federal do Brasil informou, neste sábado (4), por meio de nota, que não houve pedido de incorporação ao patrimônio da União do conjunto de joias trazidas irregularmente pelo governo de Bolsonaro de presente da Arábia Saudita em 2021. Eles queriam mesmo se apropriar dos bens.
Os bens foram apreendidos pelo órgão no aeroporto de Guarulhos (SP), em outubro de 2021.
Segundo a Receita, o ato exige “pedido de autoridade competente, com justificativa da necessidade e adequação da medida, como, por exemplo, a destinação de joias de valor cultural e histórico relevante a ser destinadas a museu”, o que não ocorreu no caso das joias.
“Não cabe incorporação de bem por interesse pessoal de quem quer que seja, apenas em caso de efetivo interesse público”, está escrito na nota da Receita Federal do Brasil.
MENTIROSO CONTUMAZ
Nos Estados Unidos, Bolsonaro afirmou que a Presidência da República havia notificado a alfândega que colar, anel, relógio e par de brincos de diamantes — avaliados em 3 milhões de euros (R$ 16,5 milhões) — iriam para o acervo e depois seriam entregues para Michelle, a ex-primeira-dama.
“Eu estava no Brasil quando esse presente foi ofertado lá nos Emirados Árabes para o ministro das Minas e Energia. O assessor dele trouxe, em um avião de carreira, e ficou na alfândega. Eu não fiquei sabendo. Dois, três dias depois, a Presidência notificou a alfândega que era para ir para o acervo. Até aí tudo bem, nada demais. Poderia, no meu entender, a alfândega ter entregue. Iria para o acervo, e seria entregue à primeira-dama. O que diz a legislação? Ela poderia usar, não poderia desfazer”, disse Bolsonaro em tentativa de se livrar desse emaranhado nebuloso.
A Receita explicou ainda que é possível a regularização da situação de agente público que deixe de declarar o bem como pertencente ao Estado brasileiro, desde que apresente comprovação da propriedade pública, e regularização da situação aduaneira.
Contudo, o órgão esclareceu, ainda por meio de nota, que isso não ocorreu no caso das joias, “mesmo após orientações e esclarecimentos prestados pela Receita Federal a órgãos do governo”.
Leia a íntegra da nota da Receita Federal do Brasil:
Nota de Esclarecimento
“Acerca das notícias veiculadas inicialmente no jornal O Estado de São Paulo sobre a apreensão de joias no Aeroporto Internacional de Guarulhos, no dia 26/10/2021, a Receita Federal esclarece o seguinte, preservando dados protegidos por sigilo:
- Todo cidadão brasileiro sujeita-se às mesmas leis e normas aduaneiras, independentemente de ocupar cargo ou função pública.
- Os agentes da Receita Federal atuantes na aduana são servidores de Estado, com prerrogativas e garantias constitucionais que lhes garante isenção e autonomia no exercício de suas atribuições legais.
- Todo viajante que traga ao país bens pertencentes a terceiros deve declará-los na chegada, independentemente de valor.
- No caso de bens pertencentes ao próprio portador, devem ser declarados aqueles em valor acima de US$ 1 mil, limite atualmente vigente.
- Caso não haja declaração de bem, é exigido 50% do valor a título de tributo, acrescido de multa de 50%, reduzida pela metade no caso de pagamento em 30 dias.
- Na hipótese de agente público que deixe de declarar o bem como pertencente ao Estado Brasileiro, é possível a regularização da situação, mediante comprovação da propriedade pública, e regularização da situação aduaneira. Isso não aconteceu no caso em análise, mesmo após orientações e esclarecimentos prestados pela Receita Federal a órgãos do governo.
- Não havendo essa regularização, o bem é tratado como pertencente ao portador e, não havendo pagamento do tributo e multa, é aplicada a pena de perdimento, cabendo recursos cujo prazo, no caso, encerrou-se em julho de 2022.
- Após o perdimento, é possível, em tese, o bem ser levado a leilão, sendo que 40% do recurso arrecadado é destinado à seguridade social e o resto ao tesouro. É possível também, em tese, a doação, incorporação ao patrimônio público ou destruição.
- A incorporação ao patrimônio da União exige pedido de autoridade competente, com justificativa da necessidade e adequação da medida, como por exemplo a destinação de joias de valor cultural e histórico relevante a ser destinadas a museu. Isso não aconteceu neste caso. Não cabe incorporação de bem por interesse pessoal de quem quer que seja, apenas em caso de efetivo interesse público.
- Os fatos foram informados ao Ministério Público Federal, sendo que a Receita Federal colocou-se à disposição para prosseguir nas investigações, sem prejuízo da colaboração com a Polícia Federal, já anunciada pelo Ministro da Justiça.
- Finalmente, a Receita Federal saúda os agentes da aduana que cumpriram seus deveres legais com altivez, cortesia, profissionalismo e impessoalidade, honrando a instituição a que pertencem.”