Ministro da Justiça, em audiência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, afirmou ainda, que é “tentativa vil de criminalizar” os moradores do Complexo da Maré ao dizer que ele se reuniu com o “crime organizado” no local
O ministro da Justiça, Flávio Dino, afirmou que “é mentira” que a proliferação de armas diminui a criminalidade no Brasil.
“Isso é um desrespeito com as polícias do país. Quem diminuiu a criminalidade foi a ação das polícias”, sublinhou.
Dino participou de uma audiência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (28).
O ministro da Justiça reforçou a posição do governo Lula sobre o desarmamento da população e a reversão de decisões de Jair Bolsonaro que facilitavam e aumentavam o acesso à armas de fogo.
Dino explicou que “quando começou o ‘liberô geral’ das armas no país? 2019. Quando a criminalidade começa a cair no Brasil? Em 2018. Na Amazônia, que mais se armou, a criminalidade não diminuiu. Não há correlação entre armamentismo e redução de CVLI [Crimes Violentos Letais Intencionais]”, afirmou.
Segundo Dino, o armamento da população, como realizado por Bolsonaro através de decretos presidenciais, era “uma política errada, sem base científica e declarada ilegal e inconstitucional pelo Supremo [Tribunal Federal, STF]”.
O ministro contou que parte dos que têm o certificado CAC (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador) está “vendendo armas para o PCC e para o CV. Vamos fechar as portas para o cometimento de crimes”.
Uma das medidas é a necessidade de recadastramento das armas, o que também foi criticado por parlamentares bolsonaristas. “Já temos mais armas recadastradas do que tínhamos de armas cadastradas. Diziam que o recadastramento era para confiscar armas. Na verdade, estamos contribuindo para que pessoas que estavam na ilegalidade venham para a luz da lei”, contou Dino.
8 DE JANEIRO
Outro ponto que foi levantado pela oposição ao governo Lula para convocar Dino seria um suposto relatório da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) que teria avisado o Ministério da Justiça sobre o risco de um ataque nas manifestações do dia 8 de janeiro. Os bolsonaristas tentam acusar Dino de ter prevaricado ao não agir preventivamente.
“Inventaram que eu recebi um mítico informe da Abin, que é tão secreto que ninguém nunca leu, nem eu mesmo. Por uma razão objetiva: eu jamais o recebi”, contou.
“Inventaram que eu recebi um mítico informe da Abin, que é tão secreto que ninguém nunca leu, nem eu mesmo. Por uma razão objetiva: eu jamais o recebi”
O ministro relatou que dialogou com governadores, como Ibaneis Rocha, do Distrito Federal, Tarcísio Freitas, de São Paulo, e Cláudio Castro, do Rio de Janeiro, antes mesmo das manifestações que culminaram no atentado terrorista, para que houvesse um alinhamento no combate a possíveis crimes.
Isso porque somente a Polícia Militar, que é subordinada aos governadores dos Estados, pode realizar policiamento ostensivo e de garantia da ordem pública.
“Eu disse ‘olha, tem uns cards de gente que diz que vai quebrar, destruir e tacar fogo, terroristas…’. Os três governadores disseram a mesma coisa: nós vamos cumprir a Constituição e a Polícia Militar vai fazer sua parte”.
“No Rio de Janeiro [a PM] fez [sua parte], em São Paulo fez. No caso de Brasília, é público e notório que disseram para ele [Ibaneis Rocha] uma coisa e aconteceu outra”, acrescentou.
“A PMDF, infelizmente, não cumpriu o que estava escrito no planejamento operacional da Secretaria de Segurança Pública do DF, que é o órgão constitucional competente para prover a garantia da ordem pública”, disse.
Depois que a PMDF descumpriu o planejamento, deixando os terroristas invadirem o Palácio do Planalto, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional, Dino sugeriu ao presidente Lula que houvesse uma intervenção na área de Segurança Pública do Distrito Federal.
“A partir do momento que o presidente da República decidiu fazer a intervenção federal, a Força Nacional passou a atuar em parceria com a Polícia Militar e as demais forças de segurança e conseguimos restabelecer a ordem em Brasília”, afirmou.
“Onde está a tão proclamada omissão? Eu não posso descumprir a Constituição, e não farei”, completou, afirmando que o policiamento ostensivo era função e obrigação da Polícia Militar e do governo do Distrito Federal.
O deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), que participou da audiência, afirmou que o que ocorreu no dia 8 de janeiro “foi uma tentativa de golpe estimulada por Jair Bolsonaro. Felizmente, a democracia brasileira se afirmou e os três Poderes se uniram. Os criminosos responderão pelo o que foi feito, aquilo é assunto de polícia”.
Elias Vaz (PSB-GO) chamou o atentado de “menino que demorou a nascer”, citando o caso em que Bolsonaro convocou um desfile militar para o dia da votação sobre a volta para o voto impresso, em 2021.
ESDRÚXULO
O ministro declarou que a mentira criada por bolsonaristas de que sua reunião no Complexo da Maré, no Rio de Janeiro, foi para negociar com o crime organizado é uma “tentativa vil de criminalizar” a população inocente que vive na região e o chamou para uma conversa sobre o país.
“Uma reunião pública realizada a 15 metros da Avenida Brasil e previamente comunicada às Policias Civil e Militar do Rio de Janeiro, à Polícia Federal… Era uma reunião com o Comando Vermelho? É esdrúxulo imaginar que eu fui me reunir com o Comando Vermelho e avisei à Polícia”, rebateu Flávio Dino em audiência da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, na terça-feira (18).
“Todos os parlamentares do Rio de Janeiro já foram para o Complexo da Maré. Quando chega a campanha eleitoral, todo mundo entra nas favelas e periferias e ninguém pergunta se ali há crime organizado ou não”.
Agora, quando um ministro do governo Lula vai para o local se reunir com lideranças e estudiosos, os bolsonaristas tratam “como se fossem todos criminosos – e não são! Isso é um preconceito contra as pessoas mais pobres e quem mora em bairro popular”, criticou.
“Ora, eu publiquei a foto da reunião com as pessoas que ali estavam. Criminalizar os mais pobres é estimular a violência contra eles, é estimular chacina, morte e tiroteio apenas pelo fato das pessoas serem mais pobres”, apontou o ex-governador do Maranhão.
O caso ocorreu no dia 15 de março, quando o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro, acusou Dino e Lula de “envolvimento com o crime organizado carioca” por conta da audiência do ministro da Justiça com pessoas que moram no Complexo da Maré.
Dino anunciou que vai processar Eduardo por racismo, uma vez que o deputado discriminou os moradores da Maré, e por crimes contra a honra.
O ministro da Justiça contou que depois do caso recebeu mais convites para audiências em favelas e comunidades e que “espera receber outros tantos. A todos os convites similares que receber, irei. Não é favor, é dever e eu não sou traidor do meu compromisso com a sociedade”.
Respondendo a uma fala do deputado bolsonarista Alfredo Gaspar (União-AL), que repetiu a mentira de que Dino foi à favela sem escolta policial, o ex-governador respondeu:
“Eu não sei de onde tiraram o desvario de que eu não tinha escolta policial. É empírico: você abre o vídeo e vê policiais. A Polícia Militar do Rio de Janeiro, as demais polícias e o Corpo de Bombeiro fizeram aquilo que a lei manda. É mentira que não havia escolta policial”.
“Eu não tenho medo de ir em comunidade, bairro e periferia. Eu sou político há 17 anos e nunca tive nenhum problema com o povo pobre”, completou.
TERRA PLANA
Durante a audiência, André Fernandes (PL-CE), apoiador do ex-presidente Bolsonaro, acusou Flávio Dino de mentir ao ter dito que não responde a nenhum processo. “No JusBrasil diz que você responde a 277 processos”, falou o bolsonarista.
“Um deputado da CCJ dizer que pesquisou no JusBrasil? Eu sou professor de Direito e vou contar para os meus alunos como anedota, como piada. No JusBrasil, quando você coloca o nome, não aparece quem responde a processo, mas quem pediu direito de resposta na Justiça, quem foi requerido, de quem registrou candidatura, de quem prestou contas à Justiça Eleitoral, de quem foi testemunha…”, explicou o ex-juiz Flávio Dino.
“A essas alturas, deputado, dizer com base no JusBrasil que eu respondo a 277 processos se insere no mesmo continente mental de quem acha que a Terra é plana. E é claro que o senhor sabe que a Terra é redonda”, disse.